Maria - Blog Pétalas de Liberdade 18/03/2016Elsie Quando eu abri um pacote que chegou na minha casa, e vi que dentro tinha um exemplar do livro "Holy Cow", um marcador, um ímã e uma carta escrita por uma vaca muito engraçadinha, tudo o que eu conseguia fazer era sorrir e mostrar para todo mundo o meu livro novo de vaquinha. Sou dessas. E quando li o livro, também ri bastante, mas, surpreendentemente, foi uma leitura que também trouxe reflexões.
"Holy Cow" é narrado por uma vaca, a Elsie, que tinha uma vida tranquila numa fazenda dos Estados Unidos. Sua vida se resumia a acordar, ser ordenhada, comer e passar o resto do dia no pasto com seus amigos animais (mais especificamente com as outras vacas). Era uma vida feliz. Até que, um dia, Elsie espiou pela janela da casa dos fazendeiros e viu na televisão (ou o Deus Caixa, como ela chamava) uma reportagem sobre o que era feito com as vacas que não eram leiteiras: elas eram mortas e cortadas aos pedaços para serem vendidas. Para nós, isso não é nenhuma novidade, mas para a Elsie, foi algo extremamente chocante. E Elsie não queria esse destino para ela, nem para as filhas que um dia ela talvez tivesse. Então, Elsie decidiu fugir para a Índia, onde a vaca é considerado um animal sagrado. Mas tente manter algo em segredo dentro de uma fazenda! Logo outros animais ficaram sabendo do plano de Elsie.
O porco Jerry queria fugir também, o destino dos bovinos era igual ao destino dos suínos. Ele queria ir para Israel, já que, entre os judeus, o porco é considerado um animal intocável. E tinha também Tom, o peru, que estava cansado de fazer regime para não parecer apetitoso o bastante para se tornar um prato no Dia de Ação de Graças. Tom queria ir para a Turquia, e como eles precisariam de um smartphone para viabilizar a fuga (pesquisar rotas, comprar passagens de avião pela internet...) e nem Elsie nem Jerry conseguiam usar um (touch screen e cascos não se dão muito bem) mas Tom conseguia, ele foi aceito no grupo.
O trio teve que treinar para conseguir andar em duas patas (se bem que o Tom já andava) e se disfarçar de humanos, enquanto esperavam o dia da fuga. Partir não seria fácil, assim como também não seria fácil enfrentar os obstáculos que surgiriam no caminho. Será que os três conseguiriam viver em segurança em outro país? O fato é que Elsie decidiu contar a sua história no livro, embora o seu maior desejo era uma adaptação cinematográfica, um filme, sobre sua aventuras (tanto que escreveu alguns diálogos em forma de roteiro e usou várias dicas passadas por sua editora, vai que algum roteirista lê o livro, né?!).
"Peraí, só um instante enquanto penso na minha mãe. Os sentimentos vão e vêm, a menos que você não se permita sentir. Porque aí eles ficam, e doem, e crescem até adquirir um formato de pera, uma coisa estranha. Por isso é que quando nós, vacas, somos invadidas por um sentimento, nós sentimos até que o sentimento passe. E aí muuuu-damos de assunto. Bum. Por essa você não esperava, né?" (página 13)
Eu li "Holy Cow" em um final de semana. O livro tem capítulos curtinhos e uma leitura bem fluida. Acho que nunca li um livro onde o narrador fosse um animal (já li alguns onde um humano havia sido transformado em animal), ainda mais uma vaca. Durante toda a leitura eu senti que era realmente a vaca Elsie que estava contando a história, em nenhum momento me parecia ser uma pessoa, e parabenizo o autor por ter conseguido manter o tom da narração durante toda a obra. Como disse anteriormente, a Elsie queria ter um filme de sua história, e para isso ela contava com os concelhos de sua editora para tornar o texto melhor (conselhos que ela nem sempre seguia), e era muito engraçado ver uma vaca usando frases que eu já vi em livros narrados por humanos, a situação era divertidamente inusitada. Confesso que do meio para o final do livro, o trama deu uma esfriada, mas os capítulos finais voltaram a valer a pena.
Como disse no começo, além de fazer rir, a obra também faz com que pensemos sobre a forma como tratamos os animais, como e o quanto os consumimos. Fica claro que não é errado comer carne, mas a questão é: como o animal (do qual aquela carne veio) foi tratado? E se ela veio de um ser vivo, é certo desperdiçar? É certo desperdiçar a vida?
"Vocês, humanos, bebem o nosso leite e comem os ovos das galinhas e das patas. Isso já não é suficiente? Não é suficiente darmos a vocês as nossas crianças e o que seria destinado a nossas crianças? E se não é, quando será? Tudo o que vocês, humanos, fazem é pegar, pegar, pegar da Terra e de suas criaturas magníficas, e o que dão em troca? Nada. Sei que os humanos consideram um insulto grave ser chamados de animais. Bem, eu nunca daria a um humano a honra de ser chamado de animal porque os animais podem até matar para viver mas não vivem para matar. Os humanos vão precisar reconquistar o direito de ser chamados de animais." (página 58)
Sobre a parte visual: a edição está uma gracinha! A capa é bem lindinha, tem tudo a ver com a obra, o título está em alto relevo e no interior da capa tem manchas pretas, como se fosse uma vaca malhada. As páginas são brancas, as margens são grandes, o espaçamento e a fonte são de bom tamanho. Tem algumas ilustrações e cada capítulo tem um título, alguns são letras de músicas.
É um livro bem divertido (nem consigo calcular quantas risadas eu dei, queria ter colocado algumas citações engraçadas na resenha, tem muitas, mas acabei não marcando nenhuma), uma fábula que pode agradar tanto os leitores mais novinhos quanto os já adultos. Tem várias referências a livros, filmes... coisa culturais, talvez eu não tenha detectado todas por não ser muito ligada no que rola fora do Brasil (exceto quando o assunto é literário), e eu não ia ficar pedindo que me explicassem o que uma vaca estava falando. E se alguém se lembrr do clássico "A revolução dos bichos", a Elsie deixa bem claro que sua história é totalmente diferente da de George Orwell. Fica a dica para quem, independente da idade, procura um livro diferente e divertido.
"A ignorância é uma benção, mas o mundo tem mais a oferecer que isso, e é errado não aproveitar o que ele oferece. Não se pode ser bezerra para sempre." (página 16)
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