Luciano Luíz 02/12/2020
A DOUTRINA DO CHOQUE - A ASCENSÃO DO CAPITALISMO DE DESASTRE da jornalista NAOMI KLEIN é uma boa viagem por períodos e lugares onde desastres naturais e atos de guerra serviram de estopim para ações econômicas brutais. Ou de uma forma mais resumida: governos aproveitando-se de tsunamis, furacões e o que mais a natureza proporciona para em seguida botar em prática ações como a privatização de serviços essenciais. Tudo em nome do lucro. Ou após guerras trazer empresas privadas para que estas possam transformar ruínas (ou parte delas) em lucro que não fica no país devastado pela guerra, mas sim, levar o dinheiro para fora. Enfim, há muitas maneiras de proporcionar o choque. Um delas é apoiar ditaduras e forçar explosões econômicas com a lenda de que é possível fazer todo mundo ter uma vida melhor através de um evento catastrófico.
É um livro grande, denso, com muitas repetições, principalmente até a metade onde cansa ler tanto sobre A Escola de Chicago (ou Os Garotos de Chicago), responsáveis por atos que prometiam milagres econômicos.
Outra coisa que tem em grande conteúdo, é sobre tortura física e psicológica. Não apenas relacionada a regimes ditatoriais, mas como um meio de obter e ocultar informações em lugares de guerra e até desastres naturais.
Apesar dos esforços em privatizar, há umas coisas curiosas como o 11 de Setembro onde o privado não se saiu tão bem em meio ao caos e as unidades públicas (bombeiros, polícia, etc.) se revelaram como um serviço que não estava tão deteriorado como sugeria uns e outros.
A leitura às vezes vai bem e outras anda a passos lerdos. Tem muita coisa ali que dá a impressão de ser mera ficção. Há também absurdos reais que ficam prensados na mente. Toda a doutrina para se alavancar economias, a imersão de grandes empresas, tanto para auxiliar em recentes democracias quanto em ditaduras mostra que em verdade pouco importa o sistema e governo quando alguém de fora quer lucrar fazendo ou se aproveitando de tragédias.
FMI, Banco Mundial, Estados Unidos, enfim a tríade (e outros mais) sempre fazendo o possível para ter alguma relação e poder sugar o máximo possível. É a guerra do dinheiro, coisa que existe desde que alguém decidiu que era preciso algo mais além do escambo (troca de mercadorias por outras).
Entre os lugares que a doutrina mais se deu bem, foi na América do Sul, apoiando regimes militares e claro, dando um jeito na extinta União Soviética.
É de se pensar em como é ter seu litoral destruído por um tsunami e em seguida o governo lhe deslocar para outra área alegando que ali é perigoso, mas em seguida começa a negociar o lugar e então belos hotéis de altíssimo custo são erguidos e os morados tem de ficar em outra área distante como se jamais tivessem existido e turistas com grande poder econômico se deliciam com as lindas águas transparentes onde antes havia pescadores e esta era sua única fonte de renda... é uma maneira de se livrar de pessoas que antes não podiam ser removidas à força...
Aliás, uma coisa comum é a questão da corrupção, como a invasão do Iraque e Afeganistão. Boa parte dos bilhões e dólares investidos, seja na forma da guerra física ou possíveis auxílios e investimentos para a população simplesmente desapareceu. Afinal, em meio a todo o caos e um montante assustador de dinheiro fica aparentemente fácil de desviar entre políticos e militares.
A obra é composta por 22 capítulos que demonstram o quanto foi preciso pesquisar. Boa parte do conteúdo é de viagens da própria Naomi. Apesar de todo o aspecto negativo, há também algumas fases positivas, mas estas são realmente raras. Há também toda aquela disputa de esquerda e direita. Sem contar que as páginas finais viajam um tanto demais achando que na América do Sul a situação (lá por 2006) dava sinais de que tudo se encaminhava para uma bela era de positividade.
Fora isso é uma obra que vale o investimento. Mescla história, tragédia, economia. Funciona tão bem que mais parece um romance distópico.
L. L. Santos
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