Mariana - @escreve.mariana 29/02/2020Sci-fi que discute questões éticas e morais, sem deixar de lado o humor [IG: @epifaniasliterarias_] "No meu aniversário de 75 anos fiz duas coisas: visitei o túmulo da minha esposa, depois entrei para o exército. Visitar o túmulo de Kathy foi a menos dramática das duas".
Em uma era em que a humanidade já é capaz de realizar viagens interestelares, nos deparamos com a escassez de planetas habitáveis disponíveis e diversos alienígenas lutando por eles. Para se alistar nas Forças Coloniais de Defesa (FCD), defender a Terra e conquistar novos territórios, é necessário ter mais que 75 anos.
Assim tem início a trajetória de John Perry, um idoso que decide ingressar no exército. A partir da interação com outros recrutas, são expostos vários motivos que levam as pessoas a se alistarem, seja porque não estão prontas pra morrer; não querem envelhecer; ou a vida na Terra se tornou desinteressante após certa idade. Em sequência, entra uma das questões mais bem trabalhadas pelo autor, que é o etarismo, ou seja, a discriminação que consiste em tratar pessoas idosas como menos humanas. Isso porque são levantadas as razões para as FCD escolherem idosos para o alistamento, sendo a principal delas o fato de estarem no final de suas vidas e não terem nada a perder indo para uma guerra cujos propósitos, até então, são desconhecidos.
Outro ponto relevante é a maneira como os oficiais do exército justificam a guerra por colonização, como se fosse a única forma de sobrevivência da humanidade. No entanto, quando um dos soldados questiona se a diplomacia não seria uma melhor alternativa, lhe respondem que primeiramente é necessário ter poder para ser capaz de alterar o estado das coisas, o que explicita o condicionamento ao qual essas tropas são submetidas.
"Meu fuzil, sem mim, é inútil. Sem meu fuzil, eu sou inútil. Devo disparar meu fuzil com precisão. Devo atirar com mais firmeza que meu inimigo que está tentando me matar. Devo atirar antes que ele atire em mim. E vou".
Em relação às tecnologias de transporte e estratégias de defesa e batalha utilizadas pela União Colonial, estas são uma forma de demonstração de poder, uma vez que são escolhidas as mais caras, mais tecnologicamente complexas e mais politicamente intimidadoras. Porém, ao se depararem com uma raça alienígena que, ao mesmo tempo em que é adepta ao fanatismo religioso, possui uma tecnologia e um poder bélico anos-luz mais desenvolvidos, os seres humanos têm mais uma prova de que cada estratégia de batalha deve ser pensada de forma única.
Além disso, John Scalzi trouxe a discussão de que idade e experiência de vida não são sinônimos de sabedoria, como pode ser observado a partir das falas do recruta Leon Deak, as quais são permeadas por conceitos racistas, bem como este interpreta os escritos religiosos conforme lhe convém, de modo a justificar seu ponto de vista – o que é imediatamente contraposto pelos demais integrantes da conversa. Entretanto, embora o autor tenha realizado essa crítica de forma contundente, não me agradaram algumas passagens gordofóbicas da história, as quais poderiam ter sido evitadas.
Utilizando uma narrativa de tom sarcástico e descontraído, o autor decidiu inserir as informações e os elementos de ficção científica de forma sutil e natural, no decorrer da história, sem deixa-la maçante, de modo a prender o interesse do leitor nas diversas questões éticas, políticas e humanas, que possibilitam reflexões extremamente pertinentes, sendo a principal delas: o que nos torna humanos?