Bruna 27/05/2016 Já fazia um bom tempo que eu não li um romance policial. E mais tempo ainda que não lia um tão bom! Esta terra selvagem, de Isabel Moustakas, foi um dos últimos lançamentos da Companhia das Letras, e consegue narrar uma instigante e perturbadora trama de investimento e suspense em apenas 120 páginas!
Um caso chocou a cidade de São Paulo. Após testemunhar o brutal ataque, seguido do assassinato de seus pais, Marta passou uma semana em cativeiro, sofrendo os mais brutais e horríveis abusos físicos e psicológicos. Sete meses após a sua libertação, ela enfim consente em falar com um jornalista, e escolhe João. Após relatar todos os acontecimentos, com uma dificuldade obvia de reviver tudo aquilo, a jovem se mata. Assim, do nada. Diante de um João em choque e sem reação.
Após a morte de Marta, sua avó entrega seu diário a João, e este inicia uma investigação própria sobre os acontecimentos. As mortes de Marta e seus pais, parecem estar nitidamente ligadas a uma onda de crimes de ódio que assolam São Paulo, uma vez que seu pai era um imigrante boliviano. Descendentes indígenas, tanto brasileiros quanto latino-americanos, nordestinos, homossexuais, judeus. Essas são as vítimas desse grupo com claras tenências neonazistas, que são caracterizados por usar cabelo muito curto, coturnos com cardaços verde e amarelo, blusas brancas, além de alguns ostentarem uma suástica nas cores da bandeira do Brasil. Porém, por mais que as vítimas sobreviventes consigam relatar essas descrições, a polícia não parece estar nem perto de encontrar os criminosos.
“ - (…) a hora estava chegando, ele repetiu isso, ficou repetindo, a hora está chegando, a chora está chegando e a gente cai queimar tudo que é índio boliviano e paraíba e crioulo e viado, não vai sobrar um, e depois disse que era eu era, tipo, o aviso, sabe?
- Aviso?
- É. O aviso de que a hora está chegando.”
Pág. 19
O livro é narrado em primeira pessoa, por João, que faz mais do que nos conduzir por sua investigação e descobertas. O mais sensacional foi ver como tudo isso passa a afetá-lo profundamente. Afinal, é impossível mergulhar nessa podridão toda e sair ileso. Isabel conseguiu criar uma história verossímil e coerente. Toda a trama tem um foco único na investigação e, com isso, ela conseguiu desenvolver uma história dinâmica e envolvente, com início, meio e fim em apenas 120 páginas, sem deixar a sensação de correria ou falta de informação.
A diagramação é simples, mas muito bem feita, com papel amarelado e letras grandes, o que torna a leitura ainda mais rápida e dinâmica. E a capa é bem interessante, pois retrata um centro urbano dentro dos contornos de um corpo ensanguentado.
Esta terra selvagem foi um livro muito intenso, em alguns momentos chocante. A narração dos acontecimentos foi forte e dolorosa, porém, a autora não usa de descrição exagerada dos crimes e atos violentos. O que torna o livro tão intenso é o fato de ter retratado algo real demais, do tipo de coisas que vemos todos os dias nos jornais. Vivemos em uma época de ódio gratuito e intolerância. Não é incomum vermos notícia de ofensas verbais ou agressões físicas geradas por algum tipo de preconceito. E um grande centro urbano como São Paulo é marcado por uma intensa diversidade cultural, racial e religiosa. Imaginem o estrago que um grupo organizado para o crime racial não poderia fazer em um lugar assim?
“Estes caras estão agindo há um bom tempo, em diversas frentes, de forma organizada. É coisa grande. Não vão parar. E a polícia não tem dado conta, ao que parece.”
Pág. 60
Recomendo demais a leitura, principalmente para os fãs de um bom romance policial, bem construído e desenvolvido.
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