Leo Villa-Forte 01/10/2009
A arte de produzir a boa bagunça
Peguei o livro de Lourenço Mutarelli prevendo uma experiência nova. Lourenço e seus backgrounds: quadrinista, roteirista, ator, não escritor-escritor. O livro e suas impressões: desenhos, gráficos, palavras, letras coloridas e misturadas, textos , frases curtas, pontuação onipresente.
Chico Buarque gostou. Algo tem.
"Será que é bom?", minhas mão transmitiam caladas enquanto se demoravam no pegar daquele livro. Bom ou não, sabia que tinha que testar. Se não gostasse, pelo menos saberia não gostar daquilo direito. E nesse caso, o livro em si é bem bonito, cairia bem na estante. E nesse caso, de eu não gostar, pelo menos teria contato com um modo incomum de escrever e de editar: textos com intervenções, rabiscos de canetas reproduzidos no papel, as páginas do livro feito páginas de caderno, o livro do personagem surgindo no livro do autor. Tudo isso já valeria a pena, caso eu não gostasse.
Não foi o caso.
"A arte de produzir efeito sem causa" é um quebra-cabeça dos bons.Quem tem a cabeça quebrada é Júnior (a do leitor, depois de algum tempo, o livro só ajuda a consertar). É dele a cabeça que Lourenço abre numa cirurgia delicada e e em nenhum momento rebuscada (como nos fazem acreditar os bons médicos). O leitor é levado a escorregar numa espiral de encontros e desencontros pensamentais, porém, não por isso sentimos um peso excessivo na carga de interioridade do personagem. Grande dialoguista que é, o jogo de Lourenço é com o modo como as palavras se relacionam com o mundo concreto que as dá suporte (ou é o contrário?). A crise de Júnior não é com ele mesmo, é com o que vem de fora, é com o que chega até ele, com o que lhe contam, com o que bate à sua porta. É com o efeito que o mundo pode provocar.
Júnior sofre uma bagunça das brabas, enquanto o leitor sofre uma das melhores.