emmanuel_arankar 01/11/2023"O Feijão e o Sonho" de Orígenes Lessa
"O Feijão e o Sonho", de autoria de Orígenes Lessa, é uma obra que mergulha nas complexidades da vida de José Campos Lara, um poeta apaixonado por sua arte, e de sua esposa, Maria Rosa. A trama, publicada em 1938, explora as tensões entre a busca do sonho artístico e as demandas do mundo prático, simbolizadas pelo "feijão", que representa a necessidade de sustento material.
José Campos Lara, também conhecido como Juca, é o arquétipo do artista que se dedica inteiramente à sua paixão criativa. Ele é um poeta cuja vida gira em torno da literatura, e sua mente está constantemente imersa na busca da expressão artística. No entanto, essa dedicação à sua arte o torna negligente em relação às necessidades mais práticas de sua família.
Maria Rosa, por outro lado, é uma mulher realista e prática, preocupada com a subsistência da família. Ela é o contraponto a Juca, vendo a literatura como um desperdício de tempo e esforço, especialmente porque não proporciona renda suficiente para sustentar a família. O conflito entre Juca e Maria Rosa é um elemento central da narrativa, destacando a tensão entre a paixão artística e a realidade financeira.
Orígenes Lessa escreve de forma despojada e acessível, o que permite que os leitores se identifiquem facilmente com os personagens e suas situações. O uso de humor é uma característica marcante do livro, tornando a leitura envolvente e agradável. O autor utiliza o humor para abordar questões profundas, como a luta pela sobrevivência dos artistas, de uma maneira que cativa o leitor.
Uma característica interessante da narrativa é a mudança de estilo de escrita de acordo com o protagonista do capítulo. Quando o foco está em Maria Rosa, a escrita se torna mais direta e pragmática, refletindo sua visão realista da vida. Nos capítulos centrados em Juca, a narrativa se torna mais filosófica, cheia de metáforas e reflexões sobre o valor da arte e a busca do sonho.
Um dos pontos cruciais do livro é a maneira como ele aborda as questões da vida do artista no Brasil da época. Juca é um exemplo do estereótipo do artista que luta para ser compreendido e valorizado em uma sociedade que muitas vezes desvaloriza as aspirações artísticas. O livro levanta questões importantes sobre o papel do artista na sociedade e as dificuldades enfrentadas por aqueles que escolhem seguir seu sonho artístico.
Além disso, a obra oferece uma reflexão profunda sobre o conflito entre o "feijão" e o "sonho". O "feijão" representa a necessidade de sustento material, enquanto o "sonho" simboliza a busca de significado e realização pessoal. Esse dilema está presente na vida de muitos, não apenas de artistas, e o livro convida os leitores a considerar como equilibrar esses dois aspectos da existência.
"O Feijão e o Sonho" é uma obra que vai além do entretenimento; é um convite à reflexão sobre questões universais relacionadas ao papel da arte na sociedade, às escolhas pessoais e às tensões entre os aspectos práticos e espirituais da vida. O livro continua relevante, independentemente da época em que é lido, e oferece uma visão perspicaz sobre a experiência humana.
O autor também explora as implicações do egoísmo artístico, que, no caso de Juca, o torna negligente em relação à esposa e aos filhos. Sua paixão pela poesia o cega para as necessidades práticas de sua família, e isso cria conflitos significativos ao longo da narrativa. Essa exploração da interação entre a paixão artística e as responsabilidades familiares acrescenta uma camada adicional de complexidade à história.
O livro não apenas apresenta os dilemas enfrentados pelo artista, mas também os dilemas de sua esposa, que deve equilibrar o apoio ao marido com a necessidade de garantir o bem-estar de sua família. Maria Rosa é uma personagem multifacetada que ilustra as tensões enfrentadas pelas esposas de artistas em meio às demandas artísticas de seus parceiros.
A narrativa é enriquecida por detalhes que exploram a vida do protagonista, desde sua infância até sua jornada como poeta. Esses detalhes oferecem ao leitor uma compreensão mais profunda do personagem e de seu desenvolvimento ao longo da história. Além disso, o livro apresenta personagens secundários que desempenham papéis significativos na vida de Juca, contribuindo para a riqueza da trama.
A conclusão da história é marcada por um momento de reconciliação entre Juca e Maria Rosa, quando eles sonham com o futuro de seu filho caçula, que também se tornará poeta. Esse final é carregado de simbolismo, pois sugere que o amor pela arte é uma herança que pode ser transmitida de geração em geração, apesar das dificuldades enfrentadas pelos artistas ao longo de suas vidas.
Em última análise, "O Feijão e o Sonho" é uma obra literária rica em significado e profundidade, que convida os leitores a refletir sobre as complexidades da vida, da arte e do equilíbrio entre o "feijão" e o "sonho". Orígenes Lessa tece uma narrativa envolvente, repleta de humor e insights, que ressoa com aqueles que já enfrentaram o conflito entre a necessidade de sustento e a paixão pelo sonho. A obra permanece uma contribuição valiosa à literatura brasileira e à compreensão da condição humana, continuando a inspirar leitores a explorar as profundezas da existência e da busca pelo significado.