Queria Estar Lendo 03/01/2017
Resenha: Belgravia
Talvez você já tenha ouvido falar de Julian Fellowes em outro contexto que não seja o meio literário, visto que ele é o criador da aclamada série britânica de tv Downton Abbey. Aqui, em seu livro, Belgravia, Fellowes aproveita tudo o que utilizou para fazer de sua série televisiva um sucesso e tenta repetir a fórmula criando um cenário de nobreza, segredos e intrigas.
A trama tem início no mês de junho de 1815, às vésperas da Batalha de Waterloo que transformaria a vida de muitos jovens devido a seu desfecho sangrento. Como meio de prestar uma homenagem ao Duque de Wellington, que comandaria as tropas britânicas contra Napoleão, a Duquesa de Richmond oferece um baile em Bruxelas, convidando boa parte do exército e os nobres que estavam na cidade na ocasião para participar dos festejos.
O que James Trenchard, fornecedor de mantimentos para o exército, não imaginava é que sua própria família seria convidada para o glamouroso baile. James, trabalhador e homem de negócios esforçado, sempre sonhou com o dia em que sua família ascenderia socialmente e coloca todos os seus sonhos nas costas de sua filha, a bela Sophia, que compartilha dos mesmos desejos do pai. Embora a família Trenchard tenha prosperado por seus próprios esforços, a mania de grandeza de James o faz sempre seguir adiante, aspirando um casamento vantajoso para sua filha que possa colocá-los dentro do círculo restrito da nobreza. Anne, esposa de James, apesar de ter sido educada com esmero por sua família, é mais realista no que se refere a entrar para um círculo social do qual não fazem parte, e não compartilha de tais sonhos. Anne se orgulha dos esforços do marido no trabalho, mas está plenamente satisfeita com a posição que a família ocupa atualmente.
Antes do baile terminar, no entanto, chega a notícia de que Napoleão invadiu o país e todos precisam correr. É nesse contexto em que a jovem Sophia Trenchard precisa se despedir do galante Lord Edmund Bellasis, herdeiro de uma das famílias britânicas mais proeminentes da época. No entanto, a jovem pensa ter descoberto uma trama infame por parte de Edmund para seduzi-la, e toda a história que acompanharemos a seguir parte desse momento. A trama salta 25 anos no tempo e agora, em 1840, começamos a descobrir os desdobramentos do segredo que Sophia descobriu e como isso impactará na vida de todos os envolvidos, da família Trenchard até a família Bellasis.
Não posso negar que Julian Fellowes trabalhou com esmero em Belgravia. Toda aquela atmosfera idílica que me fez fã de Downton Abbey está presente aqui - e talvez por isso eu tenha sentido durante toda a leitura que tudo não passava de uma repetição daquilo que eu já havia visto na série de televisão. Apesar de, obviamente, os personagens serem outros e os contextos também, não conseguia deixar de lado a sensação de que toda a história era um grande clichê. Talvez seja culpa da quantidade de dramas históricos que acompanhei durante a vida - tanto em formato de livro quanto de seriados ou filmes - mas consegui prever absolutamente todos os passos da trama como se eu mesma a tivesse criado.
Os personagens são carismáticos e é possível se importar com a maior parte deles, mas a trama e o mistério envolvendo o que Sophia descobriu em 1815 é bem simples e fácil de descobrir. Tanto que me incomodou muito o fato dos envolvidos na história terem demorado um quarto de século para começar a pensar sobre o incidente em Bruxelas. De qualquer forma, mesmo com a trama óbvia, consegui me divertir por alguns momentos enquanto lia: a mãe de Edmund Bellasis, Lady Caroline Brockenhurst, é uma personagem fantástica - ainda que evoque a personagem de Maggie Smith em Downton Abbey, a Condessa viúva Violet Crawley - e a energia e determinação dela são implacáveis. É possível dizer o mesmo de Anne Trenchard - que, no caso, representa a Condessa Cora Crawley - que apesar de ser mais gentil e amável do que Lady Caroline, é tão forte e decidida quanto a outra.
O fato é que muito da trama de Belgravia se desenrola por conta das personagens femininas: o segredo que Sophia descobriu, as ações de Anne e Lady Caroline quando entendem o que aconteceu 25 anos depois e o amor que Lady Maria Grey sente pelo comerciante de algodão Charles Pope. As mulheres não se deixam conduzir pelos costumes da época e pegam as rédeas das próprias vidas - e isso é digno de nota para o autor. Belgravia pode ser uma boa porta de entrada para quem não conhece muito do gênero drama histórico e pode encantar alguns leitores com suas descrições detalhadas e elegantes, mas deixará a desejar para os aficionados do gênero. Vendido como um livro com uma rede intricada de fofocas e intrigas, Belgravia não terá muitos mistérios para um leitor atento mas vale pela imersão nas mansões de Belgrave Square.