Diego 12/07/2020Uma análise minuciosa de um homicídio que mudou o movimento estudantilÉ um livro jornalístico escrito com uma pegada de romance, entremeando diálogos e um narrador quase onisciente.
Narra com detalhes uma série de episódios ocorrido ao longo de 70 dias no momento de maior repressão do regime militar.
Mais do que uma situação específica, o livro ajuda a perceber em detalhes a mudança de mentalidade que estava se processando na mentalidade da época.
A história central do texto é a inflexão causada no movimento estudantil pela morte do estudante da geologia Alexandre Vannucchi Leme, vulgo Minhoca, militante da ALN que foi preso irregularmente e morto após tortura intensa.
O foco narrativo está no grupo de estudantes que militavam no movimento estudantil. A história se inicia com os estudantes preocupados com o sumiço do Minhoca, ao pouco a história vai sendo apresentada. Os personagens são na maioria estudantes da geologia, militantes do movimento estudandil, que naquela época precisava ser realizado na clandestinidade devido à proibição de reuniões impostas pelo AI-5.
Alguns deles eram militantes da ALN, um grupo de extrema esquerda que tinha em seu histórico atos de guerrilha e outros eram da AP (Ação Popular), grupo católico de esquerda originado de uma cisão da JUC.
A morte do Minhoca foi disfarçada como um atropelamento, porém, os estudantes se organizaram e conversaram com o recém nomeado cardeal, Dom Paulo Evaristo Arns, conseguindo assim organizarem o primeiro grande movimento de massa desde 1968. Após este episódio as prisões e torturas se multiplicaram, pois os militares queriam prender os responsáveis pela organização da missa. Boa parte dos estudantes apresentados nos primeiros capítulos foram presos e passaram por intenso suplício, delatando outros colegas.
Este episódio minou de vez a já combalida ALN, além disso desestruturou também a AP.
Pela mesma época houve um festival em São Paulo no qual Gilberto Gil e Chico Buarque iriam cantar "Cale-se", apesar da censura ter proibido a música. Ao vivo, durante transmissão por rádio e TV, eles tentaram cantar a música enquanto os microfones eram cortados.
A partir deste episódio o livro passa a apresentar um outro conjunto de estudantes que realizavam atividades de teatro na universidade e que viam na arte uma forma para criticar o regime.
Havia ali um embate entre duas visões distintas, uma de que a função da arte era educar e portanto devia ser engajada e didática e tal olhar se chocava com a visão tropicalista, de que o tempo desta arte que se pretendia didática já havia passado, o momento era o da contracultura, era questionar os costumes, etc. Por conta disso Gilberto Gil e Caetano Veloso haviam sido vaiado por estudantes na PUC algum tempo antes.
Contudo, os episódios de morte e prisão dos estudantes e a censura à Gil e Chico conduziram a uma grande reflexão. Primeiramente os grupos estudantis até então fragmentados passaram a se reunir e conseguiram organizar uma missa que teve um grande significado simbólico e assim passaram a ver imaginar outras possibilidades de contestar o regime militar.
Então um grupo de estudantes procurou Gilberto Gil e o convidou para fazer um show na USP em solidariedade aos estudantes presos e naquele evento estiveram mais de mil pessoas, muitas das quais se tornaram grandes lideranças do movimento estudantil nos anos que se sucederam e que mais tarde, durante a reabertura, ingressaram na vida política.