danilo_barbosa 28/02/2024Em minha longa jornada com a literatura, primeiramente como leitor e depois como escritor, sempre me surpreendi com a capacidade de certos mestres da arte de contar histórias, sejam os clássicos ou contemporâneos, tem de abordar os gêneros mais diversos, às vezes na mesma obra, sem perder a fluidez que nos conduz através de uma jornada. Tenho, entre estes nomes, vários que eu admiro e sou um verdadeiro aficionado, mas nenhum deles tem lugar nesse meu coração fervoroso e delator como Stephen King.
O americano alto e de jeito tranquilo consegue enveredar na minha mente, trazendo do drama ao horror, da fantasia ao assombro como poucos. Por isso eu o degusto aos poucos, sempre encantado com as possibilidades que suas obras me trazem.
Achados e Perdidos, o segundo livro da trilogia Bill Hodges, era um dos poucos livros que tive certa reserva ao ler. Depois de toda a tensão do primeiro volume, com aquele final abrupto e cheios de possibilidades vindouras entre o policial aposentado e o assassino serial, ansiava por ver mais, por novas resoluções, na esperança de que tudo não terminasse daquela forma. E ao saber, por um outro amigo leitor, que era outra trama que seríamos jogados, fiquei meio ressabiado, assumo… receio esse que durou pouco, assim que vislumbrei a primeira página.
Este livro, para mim, foi mergulhar em um verdadeiro vórtice sombrio em homenagem aos escritores e o poder do livro de deixar as pessoas imersas, obcecadas em suas histórias. Tendo como fato inicial o assassinato de um célebre e conceituado escritor nos anos 60 por um leitor que deseja ter para si suas obras escritas durante anos e que não foram publicadas – e nunca seriam – somos conduzidos por décadas, acompanhando esses escritos, as pessoas que se conectam a eles e o que alguém seria capaz de fazer para ter o que deseja. Inclusive matar, repetidas vezes.
O time que amamos está presente, é claro. Bill, Holly e Jerome marcam presença mais marcante só na segunda metade do livro, para darem a resolução da história. Apesar disso, a trama não perde sua força ou charme diante das compulsões humanas. Mais ainda, o segundo livro, que em trilogias pode ser muitas vezes o mais problemático, aqui transita no imaginário de quem o lê, saindo do convencional e clássico thriller, marca registrada do primeiro livro – Mr. Mercedes – e servindo em pequenas pistas que algo sobrenatural e cruel nos levará para o último livro, como se fosse um pequeno fôlego antes de mergulharmos no abismo.
Tenso do início ao fim, Achados e Perdidos consegue fazer de um quebra-cabeça que pode ser inusitado um jogo de gato e rato, uma homenagem monumental – e muitas vezes distorcida – ao poder dos livros e, mais ainda, o poder que as palavras tem sobre as pessoas.