Carla.Parreira 30/03/2024
Nas sombras do estado islâmico: confissões de uma arrependida (Sophie Kasiki, Pauline Guéna). A história real gira em torno da personagem principal, Sophie Kasiki, uma mulher nascida em 1981, em Kinshasa, no Congo. Desde a infância, Sophie nutria uma grande admiração por sua mãe, e sua morte deixou um vazio em sua vida, fazendo-a carregar uma dor profunda em seu coração. No entanto, gradualmente, ela começou a reconstruir sua vida, principalmente com o apoio de sua irmã. Após se estabelecer na França, Sophie decidiu seguir os passos de sua mãe e se dedicar aos estudos, formando-se como educadora social. Seu primeiro emprego foi em um centro social, onde ela sentia a necessidade de ajudar os outros, assim como sua mãe havia feito. Foi nesse período que ela conheceu Julien, seu marido, com quem teve um filho chamado Hugo. Apesar de aparentemente ter uma vida estável, Sophie enfrentava uma fase de questionamentos pessoais e sentia que algo estava faltando para dar sentido à sua existência. O desânimo e o vazio tomaram conta dela, especialmente porque ela já havia lutado contra a depressão anteriormente. A melancolia e a tristeza voltaram com força nesse momento. Foi nesse contexto de incertezas e busca por significado que Sophie acabou sendo influenciada a fazer uma viagem, que a levou até o Estado Islâmico, levando consigo seu filho. Ao meu ver, ela partiu com a esperança de contribuir de alguma forma para um mundo melhor. Além disso, buscava realizar-se pessoalmente, mesmo sem saber exatamente o que encontraria. Decidiu arriscar, sentindo que não tinha nada a perder diante da vida monótona que levava na França. Seu desejo era fazer sua parte, semear o bem, ajudar as pessoas. No entanto, ela sentia que não conseguia fazer isso em seu trabalho anterior, onde não encontrava estímulo, ânimo ou esperança de que sua vida fizesse diferença no mundo. Era necessário mudar essa situação, fazer algo tanto por si mesma quanto pelos outros. Melhores trechos: "...Dificilmente se percebe a depressão em uma criança. Faltavam-me as palavras certas para me expressar, e minha irmã não dispunha do conhecimento necessário para me compreender. Concentrava-se nos sinais externos, preocupando-se quando eu não comia, me mandando para a cama no horário, não tarde demais, e deixando a luz do meu quarto acesa a noite inteira, pois eu tinha medo... A depressão revirava minhas percepções. Minha sensação era a de viver em uma bolha, protegida, me afastando do mundo sem que ninguém percebesse. Guardo esse segredo, cada vez mais precioso: agora me comunico diariamente com meninos que fugiram para um país em guerra... Um belo sol de inverno brilhava em Raca, com todas aquelas mulheres de preto, aqueles combatentes na expectativa de batalhas e aqueles sírios confinados. O que eu fazia ali?... Para os muçulmanos, a menstruação é impura. A mulher menstruada não pode rezar, nem tocar no Corão, nem ter relações sexuais. Os três rapazes ficaram visivelmente sem graça. Conversaram rapidamente entre si... Oum Adam indicou um quarto no primeiro andar, onde Hugo e eu ficaríamos alojados. Eram uns dez metros quadrados, com banheiro e chuveiro incorporados, como uma cela. A limpeza era precária, pedi uma vassoura. Mesmo achando que poderia fugir no dia seguinte, não me imaginava dormindo com meu filho em um lugar tão sujo. A francesa trouxe para mim um cobertor lavado, uma esponja, produtos de limpeza e comecei a trabalhar. Fiquei mais calma esfregando. A tarefa mecânica e familiar me ajudava a pensar em outras coisas. Era como se estivesse em casa fazendo faxina. Poderia estar em qualquer lugar... As pessoas passavam à minha volta. O evento prosseguia. Olhava o público: eram, principalmente, famílias brancas, francesinhos como eu, dos quais não era difícil adivinhar o drama. Fosse uma irmã, um irmão, um filho, todos ali tinham alguém que inexplicavelmente enlouquecera e partira, querendo espalhar morte e destruição por conta de uma organização terrorista. Em todos aqueles rostos preocupados e atentos, eu via a mesma coisa: a não compreensão... Como falar de livre-arbítrio quando se tratava de alguém que sofrera uma lavagem cerebral por técnicas de propaganda eficazes e várias vezes comprovadas?... Meu coração será para sempre grato aos que nos ajudaram na Síria, na Turquia e na França a recuperar a liberdade. Gostaria igualmente de agradecer a minha família e a muitos dos nossos conhecidos, que formaram em torno de nós um escudo humano indestrutível que me salvou, estando meu estado psicológico no ponto mais baixo. Agradeço àqueles que sabem que a depressão não é uma escolha, um modo de vida ou uma fraqueza moral: é uma doença terrível..."