spoiler visualizarLet 30/09/2016
Sonata em Vandalismo
A história de Sonata em Punk Rock é bem simples: a protagonista, Tim, ama música e se descobre num mundo totalmente diferente daquele em que estava acostumada. A menina, que é gente como a gente, vai parar na Academia mais elitista do Brasil, e isso, meus caros, é um baque para ela. Já o protagonista, Kim, é um garoto rico, adotado e com um transtorno psicológico, que não acha nada na vida estimulante. Só música clássica, algo intrínseco na sua personalidade. Os dois são opostos, e juntos vão descobrir novas coisas.
A premissa me animou de cara. Como ex bailarina, música clássica foi algo que cresci ouvindo e aprendi a amar desde sempre, embora não seja nenhuma especialista. Fora isso, minha mãe é fascinada por rock desde pequena, então estou acostumada com esse mundo desde que nasci. A junção dos dois para mim sempre foi óbvia. Então meu maior problema, durante todo o livro, foi ver como Tim é preconceituosa. A menina - que passa o livro inteiro disseminando suas certezas - é para lá de mesquinha em relação a música clássica. Eu sei que parte disso era para seu desenvolvimento, mas o problema é que não parece crível.
Não me parece real alguém amar tanto música, ser aceita na melhor Academia do Brasil, e ser tão ignorante a isso. Como se música clássica ferisse seu estilo "punk rock". (Aliás, palavra que foi tão usada errada, que me fez contorcer de raiva).
Muitas vezes o que Tim diz ser uma atitude punk rock é o mais puro vandalismo. Jogar comida nos outros? Quebrar coisas? Não estamos mais nos anos 70, gente! E deixa tão caricato a vida de cantores, que é bem triste.
Fora isso, Tim é chata. E não seria um problema, se a narrativa soubesse lidar com sua chatice. Mas mesmo em terceira pessoa, a história pesa. As narrações intermináveis de coisas que já sabemos (ela acordou, foi para aula, ensaiou), e a falta de emoção. Existe, sim, o narrador me contando o que os personagens sentiram, mas nada daquilo parece real.
Outra coisa que soa muito forçada foi a *pausa para conscientização*. A amiga dela, Sarah, em um diálogo, te explica porque racismo é errado, e está por isso mesmo. Depois tem a outra amiga, onde temos a *pausa para sexualidade*. Fora o constante uso de pausas feministas. E não me leve a mal, eu sou feminista desde meus dezesseis anos. Eu luto por isso com unhas e dentes, mas nem eu sou tão irreal quanto Tim. Alguns diálogos são puramente educativos, como se estivesse lendo um livro didático. Eu adoro que os livros hoje em dia lidem com feminismo, e mostrem para as meninas como o mundo deveria tratar as mulheres, mas faça isso de uma forma mais natural, ou vai acabar pesando a história. Por exemplo, Kim, que é super babaca, elitista, e nojento, manda um discurso feminista enquanto soca outro cara idiota.
Num acesso de raiva daqueles, eu conheço poucas pessoas que se lembrariam de pensar daquele jeito, mas tudo bem. Feminismo demais não é problema, só a forma irreal como ele é tratado.
E eu acreditaria no feminismo da Tim, sim. O problema é que ela é totalmente condescendente com outras pessoas (mulheres) que não sabem tanto quanto ela. Do tipo de chamar duas estranhas de machista, só porque ouviu por cima uma conversa. Isso não é sororidade.
Chegando na pior parte do livro, temos Kim. Meu deus do céu, como ele é insuportável. Só não fiquei mais estressada, porque conheço muito bem Kim. Ele é Jun Pyo, de Boys Over Flowers, ou o carinha bonito de You're Beautiful. Ele é um protagonista de kdrama. E nem dá para dizer que ele tem um pouco de tsundere na sua criação, porque aquilo não tem sentimentos. Nem pedir desculpas ele faz. O garoto, ao final do livro, não consegue nem se importar em saber o nome dos amigos da menina que ele tá apaixonado. Ele é mimado, babaca, mesquinho, completamente irritante e sem senso comum.
Mas nada me irritou mais que a exploração rasa de seu problema psicológico: é tdah? Tem mais? Porque eu sofro de ansiedade, depressão, toc e mais algumas coisas, e pude reconhecer uns sintomas nele. Mas nada fica explícito.
Outra coisa: se for retratar como é estar num tratamento com remédios tarja preta, por favor, jamais escreva que seu personagem tomou duas garrafas inteiras de uísque. É completamente irreal o fato dele estar vivo, ou de pé! Principalmente alguém que bebia todas as noites para dormir, aquilo podia causar um mal danado.
Nem os problemas que ele tinha com a mãe eu acreditei muito, porque mais uma vez, aquilo não era um livro, e sim um kdrama.
O romance também não faz muito sentido, já que eles se odeiam por mais da metade do livro. Ou aparentam se odiar, até agora não entendo como Tim se apaixonou por um cara tão horrível. Sério, era desesperador.
Todos os personagens pareciam ter quinze anos, e agiam como tal. Foi tão difícil lembrar que aquilo se passava numa faculdade, porque nem na minha adolescência eu via comportamentos assim, tão infantis.
No fim, a escritora fez um bom trabalho apresentando a Academia, suas aulas, e como aquela escola funcionava. Mas deixou muito a desejar em profundidade nos seus personagens: o pai da Tim? A mãe do Kim? A professora de piano? Sua melhor amiga? Da onde surgiu aquela Bianca?!
Não é um livro horroroso, e também não o odeio. Mas para sua proposta, foi bastante decepcionante.
2,5.
PS: Isso não é uma resenha de verdade, apenas minha opinião.