spoiler visualizarRafa569 19/11/2022
#54: Bom dia, Camaradas - Ondjaki
Essa foi meu segundo contato com a literatura angolana. A primeira foi com Mayombe, de Pepetela, uma leitura obrigatória para a Fuvest. Nas duas há o cenário de revolução e guerrilha na Angola, com a diferença de que em Mayombe acompanhamos os guerrilheiros do MPLA na selva, e aqui tudo é descrito a partir da visão de uma criança.
Toda a história é narrada por Ondalu, e seu nome é dito somente uma vez no livro todo. A narração é feita de forma leve, afinal são as percepções de uma criança, mas através dessa lente conseguimos ver no cotidiano a presença da violência, de armas um clima de apreensão, em meio à convivência com os colegas da escola e os professores cubanos. Há episódios realmente cômicos, como a confusão da passagem do Caixão Vazio, que entendi ser uma gangue armada que assola as escolas por onde passa. Era para ser uma visita surpresa do inspetor à escola, mas os alunos e professores apavorados fogem em um tumulto desesperado. Essa história é contada por um dos alunos em meio a muitas risadas.
Esse livro me despertou o interesse em conhecer melhor a História de Angola e a guerra civil, pós independência de Portugal, e até mesmo reler Mayombe.
Ah, no final do livro temos a morte do camarada Antonio, o cozinheiro da casa onde o garoto mora, fechando um ciclo de despedidas que ele diz não gostar e sentir o cheiro de longe quando uma se aproxima. Deixo aqui o último parágrafo do livro, que encerra de com uma mensagem muito linda de esperança:
"Ao ver tanta água, lembrei-me das redações que fazíamos sobre a chuva, o solo, a importância da água. Uma camarada professora que tinha a mania que era poeta dizia que a água é que traz todo aquele cheiro que a terra cheira depois de chover, a água é que faz crescer novas coisas na terra, embora também alimente as raízes dela, a água faz "eclodir um novo ciclo", enfim, ela queria dizer que a água faz o chão dar folhas novas.
Então pensei: "Epá... E se chovesse aqui em Angola toda...?" Depois sorri. Sorri só"