Fabricya 23/03/2022
Vírgula, é Clarice
Por uma identificação de desespero, vi-me em Clarice, clara tanto quanto nunca antes tinha visto-me. Se é que antes tinha visto-me, lembro-me apenas de vislumbrar borrões de mim.
Deparei-me com um texto de Clarice no primeiro ano do ensino médio. Li, achei curioso, pensei que ela fosse doida, mas amei. Afinal, o cego mascava um chiclete. Nunca mais busquei nada, nem encontrei por acidente o que não buscava.
Dei-me de cara com ela de novo, assombrando-me a sanidade, anos e anos depois. Aprendi que eu não precisa ficar sempre esperando que ela me buscasse, aprendi o caminho das pedras, Clarice mora além delas.
Primeiro foi a hora angustiante da estrela, depois a barata de G.H., depois vários outros depois; até chegar em vírgula, aqui. Eis que eu tinha em mãos aquilo, aquele pedaço de uma existência estranha e confusa, tanto quanto estranha e confusa era a minha própria existência.
Eu li a vida dela, até onde ela se deixou mostrar, até onde ela não soube estar sendo vista. Foi sim, foi uma vida que valeu a pena, que hoje vale a pena, e vírgula, sempre valerá.