Adriana Scarpin 12/09/2018ânus humano ( . ) ônus santo"acompanha o corpo este túnel obscuro,
dúbio/ lúbrico, sujo/ úmido, ao
longo da coluna – quando ereto, sua
verticalidade se sujeita à força da gravidade
e quando não, há tão somente – silenciosa
– a peristalse; na boca é seu início, e
por aí se precipitam alimento (líquido/
sólido) e sexo (um pórtico, em colunata,
comporta os dentes, todos pelo lado
de dentro), tem no ânus o mais íntimo
destino (e é sabido que também mastiga o
intestino); do uso chulo se evocam as
mais transgressoras e ráficas imagens
da bíblia sagrada retraduzida, d’algum
idioma babilônico, ou na língua solta de
sodoma & gomorra: o sopro divino fosse
tão somente gás metano proveniente de
um orifício no cio, o meteorismo pelo anel
do delírio, ânus sanctus tal cloaca larga
sob ancas fartas, o buraco sacro abaixo do
qual descansaria o peso do saco escrotal
do diabo, comendo-lhe o rabo, e contra o
qual mergulhasse ainda o incisivo tridente
luciferino ou qualquer outro objeto
longo e pontiagudo/ e o laborioso barro primordial
(o chão onde pisaram eva, adão, o éden, a terra)
fossem tão somente a poeira
das estrelas, compacta à fôrma dos planetas,
e de todas as outras esferas outrora nascidas
da mesma labareda – se misturam yin e yang no big
bang – como um eterno jacto de merda, tendo jorrado
o mundo fosse, enfim, o fiat lux no
fim do túnel, lá, onde nenhum sol (na bunda,
afinal) devesse (ao menos tradicionalmente) iluminar,
mas duma luz estranha e curva que só
einstein pudesse flagrar em cálculos, no
decúbito ventral de infinitesimais centímetros cúbicos,
não interna, mas avessa, de fora pra dentro,
ou inversa, à fórceps & ósculos lambuzando a vaselina/ fezes
& almíscar fossem a tinta do livro mais antigo;
o maior poro essa lacuna obrigatória (zona erógena),
pelos puritanos se suporia inóspita,
muito embora em ambos os sexos a fisiologia
admita a massagem no períneo, mas só nos homens,
se extraia da próstata, pelo nervo pudendo,
e com algum ímpeto, um outro estímulo que começado pelo esfíncter,
reclame da lama anal esse binômio ambíguo, um
doloroso alívio, entre a punição e o prêmio."