Bia 29/08/2016Resenha publicada no blog Lua Literária
Eu não me sinto confortável para falar sobre a morte. Tenho medo de perder. Não deveria ter, já que atuo na área da saúde.
A morte como um processo natural é assunto inconveniente para a maioria das pessoas. Agora, a morte como escolha individual é um tabu para a sociedade.
Fico pensando nos motivos que levam uma pessoa a decidir tirar sua própria vida. Já li muitos livros de ficção que abordam o tema e conseguiram me ajudar a identificar os sinais, pois é fato que a decisão de se matar não é tomada da noite para o dia.
No período em que lecionava numa escola do interior de Goiás, fiquei chocada quando, ao chegar, soube que um dos alunos havia se matado. No dia anterior, ele foi normalmente à escola, brincou, riu, falou bobeiras como sempre fazia. Ele era gay e há poucos dias passou a se maquiar. Causou impacto na comunidade escolar. Talvez se maquiar tenha sido um sinal.
Nos dias de hoje, tenho três clientes que já tentaram suicídio. E por isso me interesso tanto pelo tema, pois ao atendê-los tenho receio de não fazer uma abordagem adequada.
Li O dia em que decidi morrer buscando justamente mais luz para essa abordagem. Afinal, o conto foi escrito por uma psicóloga. Quando a Fran, autora do conto, divulgou no face, colocou um adendo dizendo que uma das coisas que ela esperava conseguir com a leitura de seu livro, era justamente provocar a discussão sobre o assunto entre os leitores.
"Acho que a morte sempre desperta certa curiosidade mórbida entre as pessoas." - posição 180
Li em poucas horas, o conto é curto, mas como tenho problema em lidar com a perda e o título me remetia a ideia da certeza da morte; foi um turbilhão de emoções em cada linha.
O conto traz como personagem um homem que optou pelo suicídio. Não esperem um grande motivo, a Fran nos deu um exemplo bem diferente da maioria das ficções literárias e cinematográficas: nosso personagem não está passando por falta de dinheiro, nem sofreu uma traição, abuso, preconceito, perda de ente querido, etc etc. Ele simplesmente não enxergava um motivo para viver. A rotina maçante, a falta de amor próprio, contribuíram para a decisão.
É uma obra fictícia, já ressalto que seu desenvolvimento foi magnífico. A Fran arquitetou um conto incrível, surpreendente e que foi capaz de provocar reflexões em mim enquanto leitora. Digo mais: auxiliou até mesmo na minha conduta enquanto profissional da saúde. Foi muito mais que uma simples leitura, tomei como experiência.
Sei que ficarão se perguntando: “ler um conto que traz suicídio como tema não é deprimente?”. Respondo: este não é. É fato que temos aspectos tristes, mas a mensagem contida no conto é bela. A autora nos presenteou com personagens fortes e cativantes, que ser tornarão inesquecíveis para quem ler.
Parabenizo à Fran e deixo minha recomendação de leitura para todos. Em tempos onde o suicídio mata mais jovens que o próprio HIV, é preciso discutir o tema, mostrar o que precisamos fazer para evitar e ajudar quem decide tomar esse caminho.
O dia 10 de setembro é tido como o mundial de prevenção ao suicídio. Precisamos de mais ações, e este conto é um material perfeito para base de debates, discussões e reflexões.
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