Tayene 14/08/2018Surpreendente e reflexivo: o melhor enredo lido até agora
"O que são os homens comparados à rochas e montanha?", uma máxima dita pela personagem Mary Bennedit, em Orgulho e Preconceito, de Jane Austen, sobre a qual Thomas Hardy tinha algumas palavrinhas e considerações a tomar em O Retorno do Nativo.
Mary Bennedit, a menos romântica das irmãs, a que menos tinha pretensões de realizar um casamento por amor, mas aquela que analisa tudo de forma realista e prática, embora nada tenha a ver com o escritor Thomas Hardy, muito traduz a essência do tema tratado por ele em seu sexto livro, O Retorno do Nativo, publicado em 1878, no qual ele traça com maestria a relação entre homem e espaço (Egdon Heath).
Em uma belíssima edição da Martin Claret, digna de colecionador, O "Retorno do Nativo" narra o envolvimento de cinco personagens: Eustácia Vye, uma jovem ambiciosa, cujas esperanças de viver um grande amor não superam seu objetivo de sair do pequeno vilarejo em que vive com seu avô; Thomasin Yeobright, cuja nobreza de caráter serão o norte de suas decisões ao longo dos reveses impostos pelo destino; Clym Yeobright, que para desespero de sua mãe, sonha encontrar sua vocação vivendo uma vida simples e digna; Damon Wildeve, cujo caráter duvidoso demonstra a aptidão que tem para tomar sempre a decisão que o fará se dar bem; e Venn, sempre disposto a fazer a coisa certa em sacrifício de seus próprios interesses. A vida desses personagens se enredam numa trama repleta de intrigas, confusões e fatos que se desenrolam na pequena e misteriosa Egdon Heath, um lugar cujos ares de personagem compete com Clym pelo título de protagonista.
Com uma linguagem direta e elegante, Hardy descreve cenas e paisagens como se fossem belas pinturas idílicas moldadas em um quadro, ao mesmo tempo em que ele desnuda o caráter de seus personagens, sempre traçando um paralelo com a relação deles com aquele lugar ermo, campestre, característico de seus romances - lugar este, sempre amado por uns e fonte de depressão para outros. Pode-se dizer que todos esses elementos em conjunto convergem para uma narrativa pessimista ou simplesmente realista.
Embora seu romance possa ser considerado naturalista, afinal Thomas Hardy é considerado precursor do movimento modernista na Inglaterra, é possível verificar elementos românticos e realistas na sua obra. Suas descricões de cenário são adornadas por símbolos e metáforas que remetem a literatura grega clássica e ao folclore feérico celta britânico. A mitologia abordada no livro tem a função de inserir o leitor no universo campestre do século XIX, onde seus moradores são camponeses com pouca instrução, habitantes de um lugar isolado cercado pela natureza, cujas mentes são alimentadas por lendas e superstições que justifiquem fatos que a simplicidade não pode explicar.
Em que pese as belíssimas descrições e a notável complexidade da construção dos personagens, é o enredo fascinante que conquista o leitor. Através da narrativa de acontecimentos aparentemente corriqueiros, a trama criada por Thomas Hardy envolve o leitor de tal maneira que é difícil largar o livro até se saber exatamente qual será o destino de cada personagem. O autor não decepciona ao garantir um final surpreendente e boas reflexões, dignas de todo bom clássico.