Memórias de um caçador

Memórias de um caçador Ivan Turguêniev




Resenhas - Memórias De Um Caçador


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Bookster Pedro Pacifico 01/03/2020

Memórias de um caçador, Ivan Turguêniev – Nota 8,5/10
Turguêniev é autor de um dos meus livros favoritos: Pais e filhos (a edição está esgotada aqui no Brasil, torcendo para alguma nova editora republicá-lo). O autor é conhecido por ter produzido uma obra mais acessível, voltada para o leitor ocidental. Quando alguém me pergunta por qual livro da literatura russa começar, recomendo alguma de suas obras.

Como esperado, “Memórias de um caçador” foi uma grande leitura. Os 25 contos têm em comum o cenário do campo russo da década de XIX. Ao longo da leitura, o autor vai apresentando diversos aspectos sociais e culturais dos moradores do campo (mujiques), principalmente o contraste entre a vida dos servos e dos proprietários de terras. Turguêniev inova ao apresentar o lado humano do mujique, uma classe social marginalizada. Por meio dos contos, o leitor tem contato com a vida íntima desses camponeses, adentrando em suas casas e testemunhando intrigas familiares e amorosas. Considerando o tom crítico em seu texto, que revela as difíceis condições de vida dos mujiques, o autor foi preso um mês depois de sua publicação, em 1852. Inclusive, “Memórias de um caçador” teve um papel importante para abolição da servidão na Rússia.

A narrativa de Turguêniev é bem descritiva e com uma forte carga poética, o que pode deixar algumas passagens um pouco arrastadas. No entanto, essa descrição excessiva do ambiente, dos costumes e tradições da época foi intencional, com o objetivo de transportar o leitor para aquele cenário. De acordo com os especialistas em literatura russa, há um certo tom autobiográfico nos contos que compõem a obra: Turguêniev nasceu em uma família rica e passou parte da infância em uma grande propriedade no campo.
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Destaque para os contos: “O médico do distrito”, “Meu vizinho Radílov” E “Kassian de Krassívaia Mietch”.

“Arkadi Pávlitch, empregando suas próprias palavras, é severo, porém justo, zela pelo bem de seus súditos e os pune para seu próprio bem.”

site: https://www.instagram.com/book.ster
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Edna 24/01/2021

Encontros marcantes
?MEMÓRIAS DE UM CAÇADOR?
         ?IVAN TURGUÊNIEV?

"De que o senhor vai viver aqui, Piotr Petróvitch?
_De fome eu não morro, Deus me livre! Não terei dinheiro, terei amigos." ? 312


Quando li  Primeiro Amor e Rúdin foi conhecimento mas Pais e filhos e Diário de um homem supérfluo foram surpreendentes, e agora com esses 25 contos detalhados minuciosamente fazendo com que eu sentisse com uma narrativa poética  dentro daquele  cenário natural e tanto a vida selvagem como o som que emana deles e a vida dos servos na íntegra, muitas vezes com supertições,  foi uma experiência nova e muito mais abrangente e as memórias são de seus encontros e experiências nada sobre matanças.

Um mergulho pela Rússia, aquela bruta, do campo russo do século XIX,  a vida e os costumes e culturas dos homem simples, dos mujiques tão despojados de ambicão,  as histórias cômicas e outras mais profundas de gente simples de alma grande,  em meio ao nada, as histórias de maldade entre proprietários,  gerentes e mujiques e a vida sofrida dos servos principalmente as mulheres e crianças que são tratadas como posses, muito marginalizados sem perpectivas de mudanças.

Na época da publição em 1852 o autor foi preso e a obra teve um grande  impacto na abolição da da servidão na Rússia.

Contos mais marcantes:


"O médico do distrito" e a paciente Aleksandra (que historia impactante ? pag.51

O prado de Biéjin ? As superticões ? 124

Kassian de Krassívaia ? O humano que se importava com a Natureza, sofria pelos animais ? 148

O Gerente  ? vilãomuito mau que maltratavam os mujiques ? 171

"Biriuk"  o Guarda e Ulita a garota que ficava sizinha no Isbá e ainda cuidava de um bebê abandonado ?  205

O Encontro ? Como é triste presenciar uma humilhação, que pessoa sórdida aquela a quem Akulina se derramava inteira.


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Flavia.Borges 02/08/2020

Escrita e sensibilidade impecável.
Uma imersão à Russia de 1850, povoada por camponeses, mujiques, e proprietários de terra severos. A beleza da natureza, descrita em seus pormenores, compõe o pano de fundo das injustiças da servidão. Exibe a Rússia e os mujiques de sua época de maneira muito sensível. Recomendo!
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Diego Rodrigues 29/05/2021

Uma poética crítica social
Peça fundamental na abolição da servidão russa, a coletânea de contos "Memórias de um Caçador" foi publicada pela primeira vez 1852, em meio a um conturbado período político no qual a Rússia de Nicolau I, em contraposição à revolução francesa de 1848, assumia o papel de guardiã da contrarrevolução. Para driblar a censura, que começava a mostrar suas garras, Turguêniev teve que recorrer a um amigo censor moscovita para que sua obra fosse finalmente publicada. Apenas um mês depois a estratagema foi descoberta e Turguêniev condenado a prisão domiciliar. Mas o "estrago" já havia sido feito. "Memórias de um Caçador" já havia circulado o suficiente para incendiar o meio literário russo, denunciando os abusos cometidos pelos senhores de terras e desbravando o caminho para a humanização do camponês russo. Apesar de ter sido, posteriormente, tirada de circulação, a obra rapidamente ganhou o ocidente com traduções para diversas línguas, dentre elas o francês, o inglês e o alemão, o que fez de Turguêniev o primeiro dos grandes escritores russos a irromper na Europa. Na Rússia, o livro só voltou a circular livremente em 1859, sob o reinado de Alexandre II.

Tendo em vista o seu importante papel social, supõe-se que "Memórias de um Caçador" seja uma obra densa e de forte cunho político, certo? Errado! O que temos aqui são 25 contos dos mais gostosos de se ler, nos quais vamos acompanhar os causos de um nobre caçador da região de Oriol em suas andanças pelos bosques russos (causos esses inspirados em acontecimentos autobiográficos). Com uma escrita poética e altamente imersiva, Turguêniev consegue nos transportar com maestria para os campos russos. Os elementos da natureza se fazem presentes com uma vivacidade e um colorido intensos, de saltar das páginas. O mujique, retratado pela primeira vez de forma humanizada na literatura russa, ganha vida e voz. Os costumes e as crenças populares da região dão o acabamento e ajudam a compor esse belo quadro do povo russo pintado pelo autor. Diferente de seus contemporâneos (e nas horas vagas, críticos) Tolstói e Dostoiévski, Turguêniev tece suas críticas de modo muito mais sutil. Sem abrir mão da estética, seus contos são verdadeiros gritos de "basta!" contra as injustiças impostas aos camponeses russos.

Essa foi, de longe, uma das melhores experiências que já tive com contos e com a literatura russa em geral. Com uma escrita simples, bonita e envolvente, "Memórias de um Caçador" é uma bela porta de entrada para quem pretende começar a ler os russos. As descrições da natureza são de botar um sorriso no rosto do leitor para em seguida escancarar a dura realidade enfrentada pelo mujique russo e nos mergulhar em um estado de melancolia. Esse contraste, ao mesmo tempo em que é genial, é fundamental para que não esqueçamos que não estamos diante de simples histórias de caça. Bem mais que isso, pode-se até dizer que "Memórias de um Caçador" é uma crítica social disfarçada de poesia.

site: https://discolivro.blogspot.com/
kaloskagathos 30/05/2021minha estante
Ótima resenha Didi, deu até vontade de ler! A temática é muito parecida com a do Pais e Filhos, os mujiques, etc.


Diego Rodrigues 30/05/2021minha estante
Só a nata dos contos russos, meu amigo. Leitura altamente recomendada! Agora vou atrás dos outros do autor, inclusive Pais e Filhos...




Luigi.Schinzari 08/06/2020

Sobre "Memórias de um Caçador"
Falar bem de "Memórias de um Caçador" (1852), livro que reúne contos de temática campesina, abordando temas semelhantes sobre a flora e a fauna russa, narrados com matizes autobiográficos pelo tal "caçador", persona do próprio autor, Ivan Turguêniev, é uma tarefa fácil.

A obra, tendo esse caráter episódico inerente ao modelo conto, prova ser, primeiramente, um estudo de descrição do autor. Turguêniev, nome cativo dentre os grandes da literatura russa junto a nomes como Tolstói, Dostoiévski e Gógol, não à toa é conhecido por ter como sua característica mais distinta as pinceladas poéticas dento de sua prosa. Em "Memórias", um Turguêniev novato descreve com tanta sensibilidade a floresta ao seu redor, as cores que o cercam espalhadas por tílias, abetos, o som dos chiados da animalidade que aparecem aqui e acolá durante toda a obra, principalmente seus cães e cavalos, e, principalmente, a profundidade dos, até então relegados dentro da prosa russa, servos. E este é o fato mais cativante e força motriz de sua relevância histórica, além da cultural (conquistada facilmente por suas qualidades vastas).

Os contos de Turguêniev que viriam a formar a coletânea foram primeiramente publicados de forma separada e entretempos, ganhando notoriedade mas apenas no tocante a literatura. O frisson real surgiu ao serem reunidos os contos em um único livro; e então tudo explodiu: a voz dada aos servos, o aprofundamento inédito visto em suas falas, ricas em uma prosa simples mas cheia de sinceridade e transbordando de críticas sutis ao servilismo, em seus pensamentos e suas visões de mundo , suas relações etc., reverberou por todo o país, chegando até mesmo aos ouvidos da nobreza e do tsar Nicolau I (um dos mais tirânicos que o país teve). Todo seu conteúdo serviu como abre-alas dentro das classes russas mais elevadas socialmente (pois muito mais correu por esse rio até chegar a sua foz) para o que viria a se tornar a libertação dos servos em 1861, já sob o governo do mais liberal Alexandre II.

Com esta obra, Turguêniev conseguiu realizar uma façanha nunca antes arranhada pelos literatos russos: ser vastamente lido pelo resto da Europa, em traduções para o francês (língua do país que o autor amava profundamente e viveu boa parte de sua vida, falecendo em solo francês em 1884), alemão, inglês e por aí vai. Não é de se admirar que essa obra entrou para o cânone universal . Se não te convenci ainda a ler, talvez Tolstói convença: "li as Memórias de um caçador de Turguêniev, e como é difícil escrever depois dele", afirmou o ainda jovem autor de "Guerra e Paz".
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Reginaldo Pereira 08/10/2023

Tchertopkhánov merecia uma obra inteira só pra si!!
Meu primeiro contato com este autor russo, e apesar de ter gostado bastante do estilo da escrita - leve, fácil e prazeirosa - a história em si não me cativou tanto assim.

Porém, acredito que tenha sido mais uma questão de expectativa, pois quando me deparei com esta obra pela primeira vez (entre os passeios pelas livrarias), não me toquei que se tratava de algo mais parecido a contos do que uma de fato uma história contínua. E isso acabou me frustrando um pouco.

Apesar dos contos terem uma linha contínua entre si (o mesmo caçador/narrador descrevendo as suas aventuras/memórias), acaba não existindo aquele fascínio, aquela expectativa sobre o que vem pela frente, o que ainda irá acontecer! E quando estamos com uma obra russa nas mãos, a ausência desta continuidade acaba não empolgando tanto.

Mas enfim, se trata de uma bela obra, que talvez deva ser lida em um momento mais tranquilo, mais calmo, e sem expectativas! Apenas para desfrutar de uma linda escrita e da paz que este tipo de leitura nos traz!

E finalmente, acho que vale a menção de que, pessoalmente, durante boa parte da leitura, a tinha avaliado como 3,5 estrelas? No entanto, os dois capítulos (mais próximos do fim do livro) que falam de Tchertopkhánov, fizeram a avaliação subir para 4 estrelas. Estes 2 capítulos são simplesmente maravilhosos!!! Valeram o livro!!
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Lucas 25/04/2021

Turguêniev e sua incomparável delicadeza narrativa
A literatura russa desperta no imaginário, seja do leitor ainda não iniciado na literatura da Rússia ou até mesmo naquele que já teve algum contato com ela, um emaranhado de sensações que, pessoalmente falando, nenhum outro tipo de literatura ou segmento literário é capaz de criar. É, na verdade, uma percepção multifacetada, onde alguns elementos como crueza narrativa, psicologia "literária", exames de consciência, grandiosidades materiais ou humanas, religiosidade exacerbada, entre outros, sobrepõem-se.

Ivan Turguêniev (1818-1883), contemporâneo da chamada Era de Ouro da literatura russa, era um caso à parte: vindo de uma família rica da aristocracia rural de Oriol, cidade do sudoeste da Rússia, ele passou boa parte da vida no Ocidente, especialmente em Berlim e Paris. Tal condição "estrangeira" fez com que ele tivesse vários conflitos dogmáticos com seus conterrâneos, especialmente com Fiódor Dostoiévski (1821-1881), com quem travou algumas desavenças públicas em termos de percepção da literatura russa.

Não cabe a nós, meros mortais não acadêmicos (pelo menos este que escreve) residentes num país separado de forma tão significativa em termos geográficos e cronológicos, avaliarmos estas contendas sob um ponto de vista histórico/literário, que nos façam tomar partido de um ou outro entendimento (esta desavença entre Turguêniev e Dostoiévski é muito abordada em vários ensaios e tópicos espalhados pela web, sendo mais complexa do que se pode imaginar). O que a leitura de uma obra de Turguêniev traz é um apego menor a religiosidade e redenção (especialmente em relação ao autor de Crime e Castigo), compensando essa prática com uma habilidade ímpar na descrição da natureza e da vastidão da Rússia.

Se Turguêniev carregou essa "pecha" eterna de excelente descritor da natureza, muito se deve a Memórias de um Caçador, seu primeiro grande trabalho literário, lançado em 1852. Até então um autor de peças de teatro, novelas e poesias, Turguêniev lançou uma coletânea de 22 contos (que em 1874 teve a inclusão de mais três) que, narrados em primeira pessoa por um membro da nobreza rural apaixonado pela caça (e que possuem traços autobiográficos, já que Turguêniev herdou a propriedade da mãe e fazia incursões pelas terras maternas, antes de se estabelecer em Paris), traduzem em belíssimas descrições não só elementos da biologia e geografia do sudoeste russo, mas principalmente todo um sistema econômico e social, sustentado pelo regime de servidão, onde os chamados mujiques ficavam sob os desígnios dos proprietários das terras onde viviam. Não era um regime de escravidão deliberada, diga-se, mas os mujiques tinham sérias restrições básicas de liberdade e ascensão social.

Mas Memórias de um Caçador está longe de representar um "grito" pelos mujiques oprimidos; a crítica social presente em praticamente todos os contos é apenas sutil. Turguêniev faz essa crítica com uma abordagem poética, que é permeada pelas recorrentes descrições da natureza. Talvez este método tenha tornado a questão do servilismo mais humana do que social e deve ter contribuído para que o Czar Alexandre II (1818-1881) tenha extinguido a servidão, que iniciou-se em 1649, nove anos depois do lançamento da obra (fontes obscuras dão a entender que o próprio czar tenha ficado tocado pela escrita de Turguêniev e isso foi decisivo para este processo de desmantelamento de uma estrutura secular que existia na Rússia daqueles tempos).

A abordagem humana citada é o elemento fundamental, a força motriz da maioria dos contos. Esta abordagem permitiu ao russo daqueles tempos enxergar os mujiques não como quase animais, desprovidos de sentimentalismo ou inteligência, mas sim como seres humanos com grandiosas capacidades de ensinar até o mais letrado dos cidadãos. Esta é a toada que, por exemplo, ajuda a construir a quase mística Lukéria, protagonista do conto Relíquia Viva; ou o mujique Kassian, que ama os animais e condena a caça em Kassian de Krassívaia Mietch; ou a protagonista de Tatiana Boríssovna e seu Sobrinho, onde Turguêniev prova que não são apenas os mujiques que possuíam uma carga humanista superior (e aproveita para fazer aqui uma incrível crítica entre as formas de educação de crianças e adolescentes no campo e na "metrópole", com validade perene). Há inúmeros outros exemplos de representação dessa abordagem.

Há também tipos que não se encaixam nem no perfil de nobre, proprietário de terras ou de "almas" (os servos), nem no de mujique propriamente dito. O maior símbolo desta tipologia de personagens é Panteliei Ieremêitch Tchertopkhánov, o "fidalgo de quatro costados", protagonista de dois contos quase no final da obra. Nele, temos traços da "loucura dostoiésvskiana", marcada por bondade, apego a um ideal, paixão exacerbada e a razão sendo engolida pela emoção. O último destes contos (O Fim de Tchertopkhánov), que corresponde ao maior dos contos da obra, aqui representada pela sempre primorosa edição da Editora 34 (e da não menos destacável tradução de Irineu Franco Perpetuo), condensa em pouco mais de 40 páginas quase tudo aquilo que a literatura russa tem de melhor: tragédias, fixação em um ideal ou objeto, bondade, bom humor pontual, etc. (só faltou mesmo a abordagem religiosa, mas este não era um costume de Turguêniev conforme já comentado). É, por isso e na minha opinião, o melhor dos contos, dividindo o posto com o já citado Relíquia Viva.

De forma complementar, Turguêniev aborda de forma superficial também sobre temas universais, como a forma simplória com que o mujique e o russo em geral encaram a morte (no conto Morte) e a natureza russa, presente em maior ou menor grau em praticamente todos os contos, mas que é protagonista no conto final das memórias chamado A Floresta e a Estepe (nem um pouco inesperado ele encerrar a obra com um conto com essa dinâmica, o que não tira o brilhantismo do conto). A caça, que é sugerida no título e que corresponde ao "alvo" de todas as paradas, trajetos e descrições do narrador, não é abordada de forma contundente; há até mais momentos em que a caça de animais silvestres é condenada ou discutida do que propriamente defendida. Na verdade, a caça é apenas um pretexto para que se desnude o interior da Rússia de uma forma que somente o "estrangeiro" ou "ocidental" Turguêniev é capaz de fazer.

Um livro de contos é um livro de passagens, de descrições, que na maioria das vezes não tem relação entre si. Mas Memórias de um Caçador é um elemento a parte neste segmento literário, já que seus contos possuem um grau de amarração implícito que muito contribui para que as histórias ali narradas sejam avaliadas em conjunto, como um painel preciso da Rússia czarista antes do fim da servidão e que garantiu a Ivan Turguêniev um lugar só seu dentro da rica e concorrida literatura russa.
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Gabriel 13/09/2022

Encontrei Turguêniev em 4 situações diferentes; e ele me entregou 4 experiências diferentes, porém igualmente magníficas. A primeira vez foi com 2 contos presentes numa coletânea da Editora 34 intitulada "Clássicos do Conto Russo", ali a paixão começou; depois li "Primeiro Amor" com uma amiga (adorei); cheguei ao seu cânone há quase 2 anos? "Pais e Filhos" me arrebatou, passei horas debaixo das cobertas após terminar ele, mastigando aquilo que acabara de ler (abrindo parênteses para dizer que devo a resenha desses últimos dois? uma hora elas aparecem por aqui).  Mas com esse livro, seu primeiro publicado, firmou-se como um dos meus escritores favoritos. "Memórias de um caçador" vem, para mim, como a obra prima de Turguêniev (acima até de "Pais e Filhos", na minha humilde opinião). 


Começarei? pelo começo. Esse magnânimo livro foi publicado em sua totalidade no ano de 1952, após passar pelas mãos de um censor do czar um pouco desleixado e conhecido de Turguêniev. O censor não percebeu, entretanto, que havia liberado uma bomba-relógio social ser publicada. A obra de Turguêniev, com uma maestria até então nunca vista, denunciava a situação em que os mujiques russos se encontravam; e, pioneiramente, dava voz e vez aos servos russos. Porém, essa crítica vinha embrulhada em narrativas de tirar o fôlego ? a beleza das descrições da natureza que o autor aqui faz é algo único na literatura universal, de uma poesia e intimidade que só Ivan conseguiu retratar. Ao ler essa obra, você é transportado (sem qualquer exagero da minha parte) para as estepes russas; a algum bar numa pacata cidade; a algum diálogo com o bufão da província; às florestas frondosas de Oriol, sentindo o vento gélido e o sol da primavera na pele. "Memórias de um caçador" é o mais fiel e profundo retrato da Rússia que já tive o prazer de destrinchar, social e esteticamente. Turguêniev conseguiu alcançar algo que todos os escritores sempre almejaram: mesclar a poesia à boa história; a crítica ao entretenimento; a beleza à denúncia; a estética literária ao profundo pensar.


Com contos que relatavam a hipocrisia do clero e da nobreza russa, Turguêniev lançou a Rússia ao mundo: foi o primeiro escritor russo a ser amplamente traduzido e fomentado nos círculos europeus. E em sua casa não foi diferente? um mês após o lançamento de seu livro, chega a sentença: prisão domiciliar. O livro causou um furor tão grande nos círculos intelectuais que não poderia ser de outra maneira. Tido como um marco fundamental na luta pela emancipação dos mujiques de 1861, "Memórias de um caçador" é comparado, pelo escritor Henry James, à obra "Cabana do Pai Tomás", por sua importância e eloquência. Também é Henry James que, na ocasião do recebimento do título, na Universidade de Oxford, de doutor honoris causa de Turguêniev, em 1879, o chama de "O paladino da liberdade", assim como "the novelist's novelist"... e James não poderia estar mais certo. Turguêniev escreveu de uma maneira viciante e apaixonante para quem o lê. 


Aqui, o mujique, o simples camponês, ganha uma imagem totalmente diferente daquela difundida pelos altos círculos vigentes na época. Vemos um povo com sentimentos, sabedoria fundamental ao país, espírito nobre e humano (afinal, todos somos falhos), e, acima de tudo, digno. As altas e autoritárias tarifas e punições impostas aos servos são frequentemente criticadas por Turguêniev, que não poupa ninguém. Minhas palavras não são suficientes para expressar a inexpressível grandeza desta obra, então tomo as palavras de alguns grandes como minhas. Em carta, Joseph Conrad definiu "Memórias" como "paisagens maravilhosas povoadas por figuras inesquecíveis"; Tolstói, em seu diário, disse: "li as Memórias de um caçador de Turguêniev, e como é difícil escrever depois dele".


Também recomendo ler este livro com um bloquinho de anotações do lado, pois elas serão inúmeras. Turguêniev cita escritores, pintores, poetas, músicos e personalidades aos montes, mas de uma maneira simples e natural; depois da leitura, você irá querer pesquisar sobre cada um deles.


 Das 25 narrativas aqui presentes, 17 viraram favoritas da vida. Mas peço permissão para cometer o crime de me ater a aprofundar apenas uma delas (que não foi minha favorita, mas dá muito pano para manga). O conto em questão se chama "Hamlet do Distrito de Schigrí". Na momento que bati os olhos nesse título, outros tantos vieram à minha mente: "Lady Macbeth do Distrito de Mitzensk", de Leskov (livro que li junto de "Primeiro amor"), "O Rei Lear da estepe", também de Turguêniev? mas, dentre todos esses, o mais latejante foi um texto anexado às edições brasileiras de "Pais e Filhos", intitulado "Hamlet e Dom Quixote". Após finalizar este livro, reli o texto (transcrito de uma palestra) de Turguêniev. Como eu já esperava, o conto e a palestra conversavam em diversas camadas. A principal é de que Turguêniev enxerga Hamlet como alguém egoísta, perscrutador, cético, que despreza a todos, e é, em si próprio, desprezível. Além disso, Hamlet autoflagela-se, sofre por suas próprias mãos:

              "Hamlet infringe feridas a si mesmo, se tortura; em suas mãos, há uma espada: a espada de dois gumes da análise. [...] ludibria a si mesmo, se compraz em injuriar-se e, por fim, assassina seu padrasto por acaso". (Hamlet e Dom Quixote, 1860)


Hamlet, segundo o russo, também seria presunçoso, uma pessoa que despreza a massa. Viajou o mundo, mas não conhece sua terra.

             "Os Hamlet são rigorosamente inúteis para a massa; não lhe trazem nada, não podem guiá-la a parte alguma, porque eles mesmos não vão a parte alguma. E como guiar quando nem se sabe se existe um solo embaixo dos pés" (Idem)


Esse trecho da palestra vai de acordo com algo que o próprio Hamlet do conto diz para si mesmo:

             "Pois é, pois é! Para que você foi se arrastar pelo exterior? Por que não ficou em casa e não estudou a vida que estava a seu redor? Você teria descoberto suas necessidades, seu futuro, e aquilo que chamam de vocação também teria ficado mais clara?" (Memórias de um caçador, pág 343)


Quem não sabe de onde vem, não sabe onde vai.



Este que vos escreve poderia ficar horas, dias, anos falando sobre Turguêniev e seus infinitos meandros, mas me limitarei a este já simbólico texto que escrevi. Só tenho a agradecer pela oportunidade de ler este livro que, ao mesmo tempo, é lindo e afiado; crítico e eterno; um retrato e uma mudança. Encerro minha resenha como Turguêniev encerra sua obra: "adeus, leitor; desejo-lhe prosperidade constante".



"O ar iluminado, o caminho mais visível, o céu mais claro, as nuvens mais brancas, os campos mais verdes. Nas isbás, as lascas ardem com fogo vermelho, atrás de seus portões ouvem-se vozes sonolentas. Enquanto isso, a aurora arde; tiras douradas já se estendem pelo céu, nuvens de vapor se elevam nas ribanceiras; as cotovia cantam sonoramente, sopra o vento matutino, e o rubro sol emerge."


 :)
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tati_loverock 16/07/2018

Memórias De Um Caçador é mais uma preciosidade da literatura russa. Foi uma leitura muito prazerosa e esclarecedora. Já li muitos livros russos, mas nunca vi em nenhum dos livros que li até agora uma representação tão clara da vida cotidiana do povo russo. Aqui é mostrados os pontos de vista desde a burguesia até os servos. E é muito interessante as descrições dos lugares, das atividades e dos sentimentos de todos eles. Estou simplesmente encantada com esse livro.
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JanaAna90 24/01/2024

No livro são vários contos , Onde vemos o olhar do escritor sobre a vida os costumes, as tradições, as características, o modo de agir e pensar do povo russo.
O livro é uma crítica aos proprietários de terra, as autoridades, ao clero e fala abertamente dos oprimidos, que são os camponeses. Por conter fatos verdadeiros e acusadores da tirania dos ricos o livro foi bastante criticado e proibido na Rússia.
Através da leitura também podemos conhecer um pouco das paisagens e dos mais variados locais da Rússia.
Os relatos contidos no livro sobre a servidão foi importante e ?decisivo para a abolição da servidão?, daí podemos perceber o quanto Memórias de um Caçador descreve e fala sobre o povo russo.
Percebi também, todo amor e todo carinho que o escritor tinha de sua terra natal ao descrever as paisagens, toda a fauna e flora, o povo simples, seus costumes, crenças. Quanta paixão e amor exala da escrita.
Porque não dizer: amei os contos, e a forma como Turguêniev conta é muito cativante e linda.
Não me canso de dizer que amo ler literatura russa.
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Henrique Fendrich 05/01/2019

Talvez, de início, esse livro pareça difícil a alguns, pelo destaque que Turguêniev dá à descrição de ambientes e à caracterização de personagens. Mas sugiro que persistam na leitura e, caso comecem a se cansar, pulem para os contos "O médico do distrito", "Relíquia viva" (no qual certamente vocês irão chorar), "O fim de Tchertopkhánov" e "Um barulho!". Passem ainda por "Hamlet do distrito de Schigrí" e depois retomem a leitura dos demais contos normalmente.

É um livro muito interessante, por valorizar o camponês russo de uma forma até então inédita na literatura, e pelas sutis críticas sobre o sistema de servidão a que ele estava sujeito.
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Ezequiel.Cesar 15/06/2021

Obra prima da literatura russa.
Em "Memórias de um caçador " Ivan Turguêniev relata de forma sensível e respeitosa a vida rural russa do século XIX.
Um livro adorável, tornou-se um dos meus favoritos da vida.
Recomendo a todos, como leitura inicial, que queiram conhecer o autor.
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Mauricio.Carvalho 03/03/2022

Entre o romantismo na natureza e o realismo dos homens
Contos extremamente bem escritos sobre a vida russa nas províncias no século XIX. Um retrato sobretudo da vida dos servos e de sua relação com seus senhores.
O texto parece oscilar entre o romantismo quando descreve as lindas paisagens russas que nos encantam com o belo estilo do autor e o realismo quando descreve os seres humanos, seus atos, suas índoles e suas relações que muitas vezes nos horrorizam.
Apesar do belo estilo e da denuncia social mais ou menos velada que valeu ao autor a fama de defensor dos servos, não espere dos contos grandes narrativas em que o enredo em si nos mantém grudados ao livro.
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Caroliny 22/03/2022

a flor da estepe
Esse livro é tão impressionante! Relato precioso da antiga Rússia camponesa, os mujiques, o áspero regime da servidão, a tradição da caça e o folclore. Recomendo muito por isso e pelas descrições da natureza, que são de tirar o fôlego!
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