Coruja 28/08/2018Kundera já está no meu radar faz algum tempo. Tenho uma amiga que vive me indicando a leitura de A Insustentável Leveza do Ser, e ele tá lá na lista de futuras aquisições, mas não entrava nas prioridades. Não conhecia nada do autor, nunca tinha pesquisado nada sobre ele e os títulos com os quais cruzava me davam a impressão de estar diante de uma prateleira de autoajuda. Não sei explicar o porquê desse preconceito, mas fato é que fiquei enrolando levar a sério a indicação (desculpa, Vivi!).
Aí vi umas referências a Kundera no epílogo de Censores em Ação, e isso pescou meu interesse. Decidi dar uma olhada no que o autor escrevera de não-ficção; achei A Arte do Romance e Os Testamentos Traídos e coloquei ambos na lista, esperando uma oportunidade ou promoção para comprar. Finalmente, achei o primeiro título com um excelente preço, e na edição capa dura ainda por cima! Não tinha como adiar mais: pouco depois dele ter chegado, já comecei a ler.
O livro é dividido em sete partes, entre ensaios, entrevistas e discursos, e até mesmo um pequeno dicionário de citações. Kundera começa fazendo uma defesa do romance como gênero e aventura, frente às experiências modernas com a forma da escrita e estudo psicológico, trazendo Dom Quixote como expoente; questiona a eterna necessidade de esmiuçar a biografia do escritor para explicar a obra; faz uma das melhores análises de Kafka que já tive o prazer de ler; fala de tradução, do processo de escrita dele mesmo (e dei risadas com a história da busca inconsciente do número sete em seus livros); a importância de ritmo, compasso numa comparação entre literatura e música, e apresenta ainda outros tantos títulos que eu não conhecia mas sobre os quais fiquei curiosa.
Talvez o mais interessante seja a verdadeira aula da história do romance que Kundera apresenta nessas páginas, um panorama que vale a reflexão. Discordo em alguns pontos dele, especialmente na forma como ele desconta a questão do contexto biográfico do autor como ferramenta de interpretação, mas há muito aqui por ser aproveitado. Em seus melhores momentos, a A Arte do Romance me lembrou muito os livros sobre literatura de Eco, com suas análises detalhadas e seu autêntico entusiasmo pelas obras que comenta. Curioso é que, embora Eco fosse um professor de semiótica e Kundera seja o romancista de profissão, ainda acho que numa comparação entre os dois, Eco sai ganhando pelo humor com que injeta sua crítica.
Ao final, gostei o suficiente do livro para decidir que quero ler mais do Kundera. Vejamos qual será o próximo da lista.
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