Ari 03/03/2024
Uma mãe não é nada além de uma filha que brinca
Não concordo com a impressão de que esse livro é apenas pra quem já vivenciou a maternidade, pelo contrário: clama ser visto. Nem toda obra precisa nos despertar uma identificação pessoal, às vezes o ponto alto da leitura é o exercício da empatia, é justamente se colocar no lugar de ouvinte e deixar que a personagem fale.
A Leda é a mulher que existe por trás da maternidade, que nunca é vista fora da sua obrigação social de ser mãe. O livro passa pela revelação gradativa de todos os seus pecados e todos os seus anseios, permeados por toda culpa e autoindulgência próprias de qualquer ser humano, porque mãe é gente. Mãe foi filha e foi mulher antes da maternidade. Leda se abre de coração e alma, não pra ser perdoada, mas pra ser vista e, assim, enxergar-se e fazer as pazes consigo mesma.
Ao leitor não cabe ser carrasco, cabe ver e ouvir. Cabe identificar o próprio retrato da realidade materna. Mães adoentadas criam filhas que também serão mães adoentadas, e o ciclo nunca vai se quebrar até que finalmente se enxergue a mulher por trás da mãe, as necessidades de alguém a quem foi privado o direito de ser.