letscia 06/02/2024
20 (2024) fogo, por favor, não me queime.
"Estou furiosa. Perdi meu Nome, mas não quero perder mais nada. Com essas palavras, Mati e eu fomos felizes. Com essas palavras, ela falava e me fazia falar."
Foi interessante acompanhar uma história na perspectiva de uma boneca. Este livro foi mais curto e mais assustador do que eu estava esperando, porém quem leu "A Filha Perdida" terá uma boa experiência com o livro.
É bem escrito e a história é angustiante na medida certa, mas não se compara aos outros livros da autora. A relação entre a boneca e a menina era totalmente maternal, é interessante ver a forma como uma criança transfere suas experiências para a boneca. Celina tem a inocência de uma criança: ao ver o fogo, ela não percebe a sua potência de destruição.
Em um dia só ela enfrenta o abandono, o abuso, o medo, a perda de suas palavras¹ (o que ela tinha de mais importante), e aos poucos ela afunda... "A água passa pela minha boca e vai para a barriga, e começo a me afogar. Vou para baixo, descendo, descendo, descendo. Chego no fundo."
Quando lhe tiram sua identidade (representada pelo seu nome) isso acontece: "o Nome não é suficiente, e então me sacode com força. ? Só Celina? ? pergunta. ? Mais nada?" Tirar o que ela era ainda não era o suficiente.
Quando ela recorre à ajuda do mar, do trovão, da tempestade, das ondas, ela descobre que está sozinha. "Nem mesmo a Onda reconheço mais. Existem muitas delas, correm uma atrás da outra e competem para ver quem é a mais alta."
Não é um livro infantil, mas é um livro sobre infância (percebem a diferença?).
Notas:
¹ Senti que a "perda das palavras" era uma metáfora da invisibilidade que uma criança enfrenta no mundo dos adultos, quando ela não é capaz de se expressar.