djalmanasc 19/02/2023
A freira?
Era noite e chovia muito quando o padre Giordano recebia uma velha cigana em sua casa de acolhimento a crianças abandonadas. Iolanda estava lá para o pedir pra ficar com seu irmão Lester, uma criança esquisita e acanhada, a qual não era mais bem-vinda em sua tribo e sofria ameaças de morte (sem motivo exposto ainda), por isso precisava de um lugar pra ficar.
Foi um diálogo denso, os olhos infantis carregavam muitas coisas, mas nenhuma delas eram coisas boas, muito menos santas. Giordano tinha tantos questionamentos? a começar pela diferença religiosa, mas após uma oferta de um saco de ouro pela estadia do abandonado, que podia ajudar a manter o lugar humilde, resolveu acolhê-lo. E não houve paz no orfanato desde esse dia. Afinal, há paz na casa de Deus quando o diabo está dentro dela?
Lester, além de estranho, amava pintar, e era bom nisso, sempre passava horas e horas se dedicando aos quadros. Em alguns dias, chegou um policial para avisar que a caravana que sua irmã estava na noite que o deixou, sofreu em um acidente bizarro e todo o grupo com mais de 40 pessoas morreram. Entre os corpos, um quadro pintado por Lester, de um retrato fiel e realista da cena fatal.
O livro se divide em 4 partes que se conectam. Primeiro conhecemos a infância de Lester, ele se torna uma lenda fascinante na vida de um pintor fracassado, Nôa. Que busca entender tudo que aconteceu anos atrás naquele orfanato. Logo após, entramos na vida de Marcos, um técnico de informática tão desgraçado quanto o protagonista anterior e sua relação com as trevas é ainda mais particular. Por fim, Lucrécia, outra lascada, uma garçonete que ouviu coisas que não deveria.
-
Veio aí a primeira decepção literária no terror pra mim? e essa bateu forte. Ultra Carnem, de Cesar Bravo, era o livro que eu estava mais ansioso pra ler desde que li meu primeiro livro de terror, que foi VHS, do mesmo autor. Foi ele que me fez me apaixonar pelo gênero e queria demais saber o que mais tinha nessa mente agoniante do escritor brasileiro. Em VHS, uma coleção de contos bem curtos, eu descobri que amava o estilo de horror religioso, então essa outra leitura seria um prato cheio, além de ser bem mais extenso e centralizado no mesmo assunto.
Os contos estão conectados e a história é maravilhosa. Bravo é um gênio. Mas é cansativa e ansiosa a forma que é escrita? Sinto como se ele segurasse sempre um plot estrondoso pra todo final de história ou capítulo, e esquece que precisa manter o leitor entretido no decorrer, sabe? É sempre um "calma que vai ficar bom" e fica bom, óbvio, eu sei disso porque ele fez isso em todos os 18 contos que já havia lido dele, só que esses eram curtos, não dá tempo ficar com tédio. Acho que ele até sabe disso, pois coloca um monte de coisas absurdas no meio, na intenção de assustar e só consigo pensar "ela disse isso?" (tulla's voice). É apelativo e não funcionou pra mim. A divisão excessiva de capítulos me incomoda também (mas entendo se o objetivo for parecer uma biblia)
Tenho a sensação que o final das 3 primeiras partes são "preciso acabar logo porque as folhas estão acabando". Mas a parte final (4) é uma surpresa boa, eu gostei. Amei a mistura das idéias de inferno cristão com o mitológico. Ela é mais enxuta e Bravo não tinha a intenção de destruir a vida da protagonista dessa vez.
Tentei ser o mais gentil possível porque o escritor é um querido e foi importante na minha trajetória literária. Me perdoa, Cesinha ?