Utópico

Utópico André Mafra




Resenhas - Utópico


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Amanda 28/06/2017

"Ele era uma maçã perfeita, em meio a um mundo injusto e distorcido. Um verdadeiro utópico.”
Daniel é um excelente médico que está evoluindo na carreira rapidamente, já que vai se tornar um dos mais novos médicos a chefiar o setor da clínica cirúrgica. Com certa regularidade, ele atende uma pequena menina chamada Ísis, que comparece às consultas acompanhada de sua avó. A vida de Daniel muda drasticamente quando a mãe de Ísis surge no consultório para buscá-la pela primeira vez. Essa mulher é justamente Loana, uma ex-namorada que fez parte da adolescência do médico e que terminou com ele para namorar Ariel. Além de ter que lidar com a lembrança, ele tem que se conformar com o fato de que ela está ainda mais bonita que antes.

Porém, não é só isso que o abala; Loana o faz recordar do seu pior tormento. Afinal, Daniel é o responsável pelo assassinato de Ariel, que, graças a ele, nem teve a chance de conhecer a sua filha Ísis. Até hoje Ariel é dado como desaparecido pela polícia, porém, nem por isso o médico consegue viver em paz, já que tem pesadelos constantemente e sofre alucinações, ouvindo e vendo Ariel com bastante frequência. E, é claro, o fato de a Loana ressurgir em sua vida acaba intensificando ainda mais seus delírios. Enfim, a vida vai seguindo seu curso e não demora para Loana, Ísis e Daniel se tornarem uma família, passando a morar juntos. Mas não era o suficiente; Daniel queria mais! Desejava (morte!) a liberdade, queria fazer a diferença no mundo.

Quando finalmente passa a trabalhar como chefe de cirurgia, ele vê que colocar em prática a sua ideologia de consertar as coisas não é assim tão simples. Enquanto seus pacientes estão na eterna lista de espera para receber órgãos, muitas pessoas estão por aí, praticando barbaridades contra inocentes e se safando de seus atos. Daniel tenta resolver esse impasse publicando um artigo apoiando a doação involuntária de órgãos, mas essa ideia logo se mostra frustrada. Além disso, Ariel fica perturbando seus pensamentos, sua vida e seu sono, incentivando-o a "limpar a sujeira" da cidade. Assim, ele toma medidas drásticas para salvar seus pacientes: assassinando criminosos de rua e, dessa maneira, retirando seus órgãos.

Como suas vítimas não fazem falta a ninguém, Daniel não corre muitos riscos de ser pego. Porém, é dessa forma que ele acaba atraindo a atenção de Leonel, chefe da máfia, já que aniquilou vários capangas seus. Leonel não quer se vingar; muito pelo contrário. Ele pretende contratar os serviços de Daniel para realizar o tráfico de órgãos para seus clientes ricos e que passam longe de serem pessoas do bem, mas não impedirá Daniel de continuar a recolher os órgãos que restarem para seus pacientes do hospital. O médico, é claro, não tem outra escolha, já que Leonel o ameaçou e é um mafioso muito importante e protegido pelos policiais e políticos corruptos.

Nesse segundo trabalho, ele tem um assistente chamado Maycon e o ensina a fazer a extração de órgãos. Conforme o tempo passa, Daniel percebe que tem muitas coisas em comum com Maycon e eles compartilham uma ótima amizade. Conversando com ele e absorvendo sua triste história, Daniel vai percebendo, aos poucos, que eliminar os bandidos da rua não iria provocar a mudança no mundo que tanto deseja e vai abrindo os olhos para onde realmente está localizada a verdadeira corrupção. Só que um outro chefe de máfia acaba entrando na jogada e colocando em risco o trabalho, a família e a vida de Daniel. Tendo dois mafiosos que estão em guerra um com o outro e necessitando do médico para lucrar com os negócios no mercado negro, Daniel se vê de mãos fortemente atadas. E agora, como colocar em prática a sua utopia?

"- Você acabou de ouvir a minha história – começou Maycon, olhando-o nos olhos. – Percebeu que eu fui compelido a entrar pra essa merda de criminalidade? E se você tivesse me matado no momento em que eu estava sendo forçado a acompanhar os assaltantes? A maioria deles fazem o que fazem porque não tem escolha, Daniel.
- Eu duvido muito... Acho que todos têm escolhas.
- Sim, claro – debochou Maycon. – Ou isso ou o caixão. O que você escolheria?”

A primeira frase que surgiu em minha mente quando finalizei essa leitura foi: caramba, que livro mais real! Sério, milhares de autores podem escrever thrillers da forma que quiserem, no entanto, para mim, o que realmente vai me atingir não são os monstros, lobisomens ou vampiros, dessas figuras sobrenaturais que já estamos acostumados a ouvir e ler, e sim a maldade humana, principalmente se ela está disfarçada de um senso distorcido de justiça. E nisso, ao dar forma a Daniel, o autor André Mafra faz muito bem. Sua escrita é fluída e possui propriedade, me senti presa da sua narrativa do início ao fim. Obviamente, o fato de Utópico ser uma obra nacional que se passa no Brasil ajudou a torná-la muito mais verdadeira. Cada um dos personagens, o tráfico de órgãos, a máfia e tudo que engloba essa história são tão fáceis de visualizar que, confesso, me senti um pouco aliviada por não morar em Curitiba.

O livro é dividido em três seções, mas falei mais apenas da primeira para não estragar a experiência de leitura dos leitores e não correr o risco de soltar spoilers. A primeira parte do livro se chama Consequências de uma vida interrompida. A segunda, denominada O passado de Daniel Reis, irá voltar no tempo e mostrar quando ele era apenas um adolescente normal preocupado em passar no vestibular de medicina e também apontar todos os fatores que levaram ele a se tornar a pessoa que é nos tempos atuais. E, por fim, a terceira se chama A última chance, que também é incrível já que é bem movimentada e tem muitas cenas de ação interessantes, além de umas reviravoltas um tanto quanto inusitadas.

Daniel provocou inúmeras sensações conflitantes em mim e quanto mais eu o conhecia, mais complicado ficou julgá-lo. Em minha percepção, não há dúvidas de que ele é um psicopata, já que além da grande vontade de fazer a diferença na vida da sociedade, ele também tem essa necessidade de matar – materializada, na maioria das vezes, pela figura imaginária de Ariel - que nunca o deixa em paz. Mas ao conhecer seu passado triste, presenciar seu sofrimento por perder a mãe tão novo, seu pai trabalhando o dia todo para sustentar seus estudos e acompanhando seus princípios e valores sendo cada vez mais modificados conforme os problemas surgem, é difícil não sentir empatia por ele também. Eu entendo um pouco de sua linha de raciocínio, mas, é claro, não justifica nada do que ele faz.

“Este era seu segredo: ter a certeza de que algum dia, com sua influência e sucesso alcançados, teria muita coisa para consertar. Sua fé consistia em reformar o que fosse possível no mundo. Sabia que não era grande entendedor das sutilezas da política, nem das filosóficas utópicas de outrora, nem visões complexas de reformas sociais e políticas. Mas confiava em seu senso de justiça. Sabia que poderia aprender o resto e adaptar a seus princípios.”

Os personagens secundários são extremamente importantes, de modo que contribuem para traçar os caminhos que Daniel irá percorrer, tanto para o bem quanto para o mal. O personagem que mais gostei dessa história toda, com certeza, foi o Maycon. É impossível não se simpatizar com sua história, o luto por ter perdido os pais quando criança e, por consequência, o fato de ter sido forçado a entrar na vida do crime. Mesmo tendo presenciado inúmeras brutalidades por conta da rotina que leva, não deixou que isso lhe tirasse a humanidade, bondade e empatia. Definitivamente, sem Maycon, Daniel teria tomado uma rota complemente diferente nessa história.

Outro personagem que gostei muito também é o Luís, um policial que, diferente da maioria dos outros policiais, que entraram lá apenas pelo dinheiro, leva seu trabalho muito a sério e atribui importância a cada caso que cai em suas mãos. E foi isso que ele fez com o tráfico de órgãos e a guerra entre máfias. Até de Ariel, que todo mundo já havia deixado para lá, Luís não esqueceu. Ele é uma pessoa admirável, persistente e se assemelha a Daniel apenas no desejo de fazer as coisas certas. Loana, namorada de Daniel, é outra personagem que, por sorte ou azar, mudou completamente a sua vida. Ela fez com que eu nutrisse carisma por ela também, por conta de todo o sofrimento que passou de sua família, o que acabou lhe causando sérias sequelas.

A diagramação está linda, como sempre, quando se trata da editora Arwen, que cuida muito bem da parte visual de suas publicações. A única ressalva que tenho a fazer é do excesso de erros de ortografia que acabaram deixando passar, mas fora isso, o livro é maravilhoso. Como a história e a escrita são ótimas, não acabei me incomodando tanto com essas falhas.

Acredito que Utópico é um excelente nome para esse livro, perfeitamente adequado. Afinal, o anti-herói dessa história se prende tanto a seus ideais de um mundo perfeito que fica preso nessa fantasia, nesse mundo distorcido que criou em sua mente, que não enxerga a verdade e outras possibilidades.

Leitores, se eu fosse vocês, estaria colocando Utópico na lista de desejados agora mesmo. Garanto que não se decepcionarão com essa história brilhante. Obviamente, já estou aguardando pelas próximas publicações do autor André Mafra, uma vez que com essa obra de estreia, ele provou que possui um grande talento para a escrita.


site: http://lovereadmybooks.blogspot.com.br/2017/06/resenha-utopico.html
Andre.Mafra 24/08/2017minha estante
Que resenha mais linda!
Amanda, muito obrigado pelas palavras, confesso que fiquei arrepiado lendo.
Fico feliz que tenha gostado e tenha certeza de que as próximas obras não te deixarão na mão.

Forte abraço.




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