Luiz Gustavo 13/08/2020Entre os vários livros que já li que abordam a ditadura civil-militar brasileira, "Rio-Paris-Rio" se tornou um dos meus favoritos. O que mais me encantou foi o estilo de escrita da autora, que transita com leveza sobre muitos temas espinhosos, a maioria envolvendo os diversos horrores da ditadura: exílio, perseguição, tortura, silenciamento, o medo, entre outros. A narrativa acompanha Maria e Arthur, dois jovens brasileiros que se conhecem em Paris no final da década de 1960. Nenhum deles é um exilado ou um perseguido político, mas é impossível que ignorem o que se passa no Brasil enquanto vivem na França, pois as famílias de ambos estão, de formas distintas, envolvidas com o regime civil-militar. Também não é possível ignorar a revolução que acontece no país onde vivem: os protestos de Maio de 68, em que jovens, principalmente, clamavam por uma renovação de valores e de costumes. O contraste é muito interessante: de um lado, a preocupação com a suspensão de direitos básicos no Brasil; de outro, a luta da juventude europeia pela liberação sexual e ampliação de direitos civis, o que também levou os trabalhadores do país a protestarem por melhores condições de trabalho. Luciana Hidalgo apresenta diversas reflexões sobre esse contraste, sobre as motivações das lutas nos dois países e sobre as próprias organizações políticas, além de meditar sobre a condição de ser estrangeiro no “velho mundo” europeu. Há muita profundidade nos personagens e em toda a construção narrativa, apesar da simplicidade aparente – e isso não é algo fácil de se fazer. Há tantos elementos interessantes e tantas passagens que gostaria de comentar, mas acho que o essencial aqui é recomendar, vigorosamente, a leitura deste romance, pois ele apresenta um olhar muito distinto dos acontecimentos da época, e é difícil não ser envolvido pelo estilo de escrita da autora e pelo casal de protagonistas da narrativa.