Formação do Império Americano

Formação do Império Americano Moniz Bandeira




Resenhas - Formação do Império Americano


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João Moreno 19/01/2022

A democracia do Império

O livro não é só sobre a história dos Estados Unidos. É sobre os fatores e os processos que permitiram ao país estadunidense alçar-se à condição de império, já ao final da Segunda Guerra Mundial. Moniz Bandeira, o autor, historiador e cientista político, escreveu 'Formação do Império Americano' no calor do Governo Bush, da Guerra ao Terror e da invasão e destruição do Iraque. Tentar "compreender explicar o processo de perversão da democracia" norte-americana (p. 31) foi um de seus objetivos.

Para tanto, precisou voltar lá atrás, na formação histórica do país, que, com o sentimento de "predestinação", guiados por Deus, sempre impôs seus interesses aos demais: primeiros aos povos originários, na expansão rumo ao Oeste, depois junto à América Latina, com a Doutrina Monroe, e, já durante o entreguerras, ao restante do mundo, com seu modelo político e econômico via instituições multilaterais e militarismo, muito militarismo.

“A tendência para o messianismo nacional, que marcou a formação e impregnou a cultura do povo americano, renovou, entretanto, uma tradição judaica resgatada pelo fundamentalismo bíblico dos puritanos que emigraram para a América, imaginada como a terra prometida. O povo americano, do mesmo modo que os israelitas, passou a considerar-se o mediador, o vínculo entre Deus e os homens na Terra. (…) O sentimento de grandeza e de superioridade conformou desde os primórdios parte da identidade dos Estados Unidos." (p. 28).

Por falar em militarismo e como ele foi fundamental ao desenvolvimento da economia estadunidense, com 'Formação do Império Americano' nos familiarizamos com o termo "Complexo Industrial-Militar" (o qual se originou no final do século XIX com o entrelaçamento de empresas privadas financiadas pelo Estado a fim de expandir a frota naval norte-americana) e como ele vai designar o motor da sua economia. Com o avançar das décadas, esse Complexo ganha força e autonomia, financiando eleições, ditando a noção de democracia, impondo as doutrinas de guerra, definindo a atuação da política externa.

Quanto à política externa, a obra de Moniz Bandeira é muito clara: a formação histórica e a forma como enxerga a si como nação determinaram o papel do país mundo à fora. Para a América Latina, a Doutrina Monroe faz dos latinos um contratempo aos interesses americanos estadunidense na região. Para os consolidar, inúmeras ações coloniais no século XIX e início do século XX foram protagonizadas. A partir da Segunda Guerra Mundial, entra a CIA, as ações encobertas, o terrorismo de Estado, o financiamento de milícias, a subversão do processo democrático quando os escolhidos são contrários aos interesses estadunidenses. O ciclo de ditaduras militares do final dos anos 1950 aos anos 1970 é resultado dessa política, baseadas em muito anticomunismo, responsável pela repressão interna (red scares e macarthismo) e externa.

Com o fim da Guerra Fria, a justificativa "luta contra o comunismo internacional" perde força e o Complexo Industrial-Militar precisaria de novas razões para os seus gastos e sua existência. É aí que 'A Formação do Império Americano' nos "ilumina" quanto aos conflitos contra o narcotráfico e as disputas em torno do Oriente Médio, "problemas" (sic) criados e geridos pelas potências ocidentais desde antes da Primeira Guerra. Obviamente, como aprendemos na obra, nunca se tratou da busca de regimes democráticos, mas sim da imposição de governos favoráveis aos interesses norte-americanos e a utilização racional dos recursos naturais desses países (para a racionalidade norte-americana, obviamente).

Já ao final do livro, o autor dá ênfase à virada da extrema-direita dentro do governo Bush, eleito "mediante um golpe judicial", que contou com o apoio da elite financeira. O governo Bush esteva unido pelos interesses do Complexo Industrial-Militar, dos neocons, dos fundamentalistas evangélicos, das indústrias petrolíferas, da extrema-direita israelenses (Likud), "negocistas e traficantes de influência", membros do Carlyle Group. Estes tinham a intenção de redesenhar o papel dos EUA no mundo. Foi assim que criaram a mentira das armas de destruição em massa no Iraque, motivo para se invadir o país, com interesse também na privatização do petróleo iraquiano. "(...) o Iraque era vital para o fluxo do petróleo do Oriente Médio, porque se assentava sobre a segunda reserva mundial (em volume), da qual os Estados Unidos necessitavam por motivos de segurança econômica, e não podiam permitir que Saddam Hussein a explorasse por motivos de segurança militar (...) (posição 9689).

Apesar de quase vinte anos, 'Formação do Império Americano' já pontuava as contradições do país. É possível falar em declínio? Se for, "(...) a queda do Império Americano será tão vertiginosa e dramática quanto a sua ascensão" (p. 23). Se o professor de Economia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Nildo Ouriques estiver correto - que estudar a história dos Estados Unidos é importante para entender a realidade do capitalismo mundial e do capitalismo brasileiro periférico -, a obra de Moniz Bandeira me parece fundamental. Como latino-americano, após o seu texto, ter um posicionamento anti-imperialista parece-me o único caminho possível.

“Esse desprezo dos Estados Unidos pela soberania dos outros povos, o unilateralismo de sua política internacional, o militarismo, a prepotência e a arrogância, a pretensão de reformar o mundo à sua imagem e semelhança, o pretexto de promover a democracia como rationale para a deflagração ou para a participação em guerras não afloraram como consequência dos atentados de 11 de setembro de 2001. Não surgiram repentinamente. São tendências que remontam não a mais de meio século, como alegou Robert Kagan, associado sênior da Carnegie Endowment for International Peace e um dos ideólogos da extrema-direita americana, mas aos primórdios da fundação dos Estados Unidos.” (p. 31).

site: https://literatureseweb.wordpress.com/2022/01/19/eua-e-imperialismo-parte-1-resumo-de-formacao-do-imperio-americano-de-moniz-bandeira/
Matheus Klein 19/01/2022minha estante
excelente!


mpettrus 30/01/2022minha estante
Caramba, que resenha perfeita. Já coloquei na minha lista 2022 para ler convencido pela sua resenha. Obrigado ??


João Moreno 01/02/2022minha estante
Obrigado pela leitura, Mitchell. Espero acompanhar a sua leitura também. Grande abraço :)




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