Afetos

Afetos Fernando Rocha




Resenhas - AFETOS


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Penalux 14/11/2017

Prosa da movimentação, as crônicas de Fernando Rocha são um passeio gostoso pelos arredores de uma cidade, composta de pequenos corredores estreitos ligando-a a natureza, e nesta dualidade visual Fernando Rocha encontra fonte para suas escritas.
A escrita de Fernando é tão fluida, tão precisa que leva o leitor no mesmo ritmo acelerado das coisas que se movimentam, como carros, locomotivas e pessoas, mas esta passagem, é feita com uma lírica tão sutil que esta transmutação de lugares em outros, é feita quase imperceptivelmente, abrandadas por seus pensamentos que são como luva condutoras pelo caminho de suas ideias.
O autor privilegia a paisagem que é descrita por ele de maneira a se casar com seu interior, fundindo duas paisagens, misturando-as como se uma fosse o alicerce da outra, algumas vezes é mesmo difícil distinguir o que há de subjetivo e o que há de exterior, de factível, porém, é esta difusão, que permite a mágica de sua prosa de contornos poéticos, em, “ O sol rei-ilusório não esconde o frio, mas enfeita a parte-todo que nos envolve agora, na pequena cidade, espaço geográfico estranho, sob meus pés, que deslizam com auxílio das rodas de um ônibus. Elas me fazem sentir outra forma de ser no estar”.
“Afetos” o livro de contos-prosas de Fernando Rocha é uma oportunidade de passagem entre os limites do interno e externo, e também, uma possibilidade de compreensão do quanto estas duas realidades, exterioridade e interioridade se relacionam, se instigam e se completam.
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Krishnamurti 12/11/2016

AFETOS (Um livro de Fernando Rocha)
AFETOS (Um livro de Fernando Rocha)

Por Krishnamurti Góes dos Anjos

Causa-nos satisfação redobrada encontrarmos jovens ficcionistas a perquirir a condição humana como suprema expressão da alma na seara fecunda de suas criações. Como arte que é, a literatura evidencia a idéia dominante de uma época, pois expressa inequivocamente o pensamento humano que ascende ou decai.
O escritor Fernando Rocha lançou muito recentemente pela editora Penalux, seu livro “Afetos”, reunião de 39 pequenos contos (alguns fogem desta característica de gênero porque a literatura contemporânea é também a de libertação de formas), que por sua vez, se agrupam em 5 partes distintas. Motivo de curiosidade adicional o agrupamento de textos em capítulos. Por quê? Não é aleatório tal procedimento, e como não é expediente gratuito, citemos como Rocha os agrupa: 1º Os dentes de Cronos, 2º Coisas de criança, 3º Províncias Flutuantes, 4º Espasmos e contrações e finalmente, um único texto que se chama “Afeto sem o filtro da linguagem” no 5º capítulo que tem o título de Anunciação.
Os textos são de uma visada extremamente original. Embora expressem o tormento d´alma das personagens e aquele palpitar de tempestades e visões que assolam nosso mundo, o estilo do autor é simples porque, quem tem alguma coisa de substancial a dizer, o diz da forma mais simples. Entretanto, voltemos aos capítulos.
Se fizermos um apanhado geral desses capítulos, podemos perceber uma tendência marcante. Em “Os dentes de Cronos (do grego Chronos – personificação do tempo eterno e imortal, e governante dos destinos dos deuses imortais), temos três textos dignos de registro. Cito apenas trechos. Talvez façam um sentido mais amplo quanto à cosmovisão do autor que nos interessa mais analisar. No texto “A abertura do olhar” um personagem afirma: “... talvez, a esperança adormecida tenha aberto os olhos para comunicar a sua não-morte”. Em “Pé de pássaros”, surge um desejo expresso – após um olhar sobre um simples passarinho de rua. “Seu corpo ainda inteiro próximo àquela árvore, tornou-se uma espécie de semente, passam carros, crianças e seus pais rumo à escola, há gente esperando o ônibus, mas todos o ignoram”. E finalmente o texto “Ordinário especial”, no qual o personagem narrador afirma no primeiro parágrafo: “Nunca dancei porque nunca me senti dentro de um corpo, que, como o gesto da mão ao escrever, pudesse criar uma expressão, ponte da interioridade para o fora”.
O capítulo “Coisas de criança” traz-nos situações nas quais, crianças descobrem a brutalidade do mundo, e um, em particular, lembra a circularidade infância-velhice-infância. Este se chama sugestivamente: “As duas pontas”.
Já o capítulo “Províncias flutuantes” reúne 13 textos. Nesses, personagens variados afirmam ou pensam: “Eu já não consigo mais viver dentro de mim”. “Parece trazer em si o vazio de antes de tudo, o caos da criação, o suspiro final do torturado, ou melhor, talvez o desejo de torturar a existência com esta dor tão grande”. Ou ainda: “Me ofende ver tantos olhos encobertos pela tela de um telefone celular, tantas vezes falando por meio de aparelhos e se calando diante de um semelhante, a minha pele fina, de agora, tão sensível, não suporta, parece não proteger o meu interior exposto, vulnerável... Se existe uma coisa que se tornou muito eficaz, neste tempo em que estou no mundo, é a propaganda, cada vez mais fazendo com que todos se achem únicos, mesmo que este conceito seja utilizado para bilhões mundo afora”.
Temos aí o caos deste campo de “províncias flutuantes” em que a humanidade vai se transformando. Nossa sociedade técnico-científica (e toda sua parafernália eletrônica produzida para fruição meramente hedonista e utilitarista) nos lançou no beco sem saída em que estamos. Acreditamos numa “lei” onipotente (a ciência) que nos atravessou como um furacão destruidor de toda fé, e tem imposto com uma máscara de ceticismo um semblante sem alma numa aviltante alienação à matéria. Nossa sapiência de seres “eletrônicos” é a ignorância das coisas do espírito. Este sim a única alegria, a única centelha de vida. Vejamos mais um trecho:
“Como faz falta uma noite de sono bem dormido! Não sei se é este carrossel de idéias que não me dá descanso ou se é o excesso de letargia. O que é ser daltônico quando tudo o que se vê é escuridão”. – Trecho do conto “Dentro da noite escura”.
Um personagem aturdido e angustiado olha para tantas coisas que afloram de sua consciência mais profunda, sem conseguir encontrar-lhes a origem. Não consegue deixar de lado a psique exterior da vida prática que é a razão (porque já está num nível terrível de confusão e desesperança), e inquirir, perscrutar a profundidade de si mesmo. Ali onde nascem, irresistivelmente, todas as maiores afirmações de nossa personalidade. O que se vê ao longo do livro, são personagens aflitas, conflituosas, confusas, doentias, altamente centradas em si mesmas, sem ao menos suspeitarem ou inquirirem seriamente se afinal existe uma lei maior, imperceptível, mas potente que furacões, vulcões e terremotos, que atua inexorável, a tudo movimentando e a tudo animando (?). Não, as cogitações não chegam a tanto.
Todavia, há efeitos dessa ausência, já uma intuição se impõe a nos gritar que incerta está a reconstrução de nosso destino. Damos-nos conta de que a zona de nebulosidade em que se aninham a dúvida e o mistério está se tornando irrespirável. Cada vez mais. Que esforço a vida está a exigir de nós neste momento de superação pelo qual passamos! A superação no caminho da evolução. Sim, porque a evolução humana não é uma quimera (nem muito menos a invenção de computadores pensantes), impulsiona vigorosamente nosso sistema nervoso para uma sensibilidade sempre mais apurada. Falta-nos compreender que tudo, desde o fenômeno químico até o fenômeno social, não é mais do que vida regida por um princípio espiritual. Mas, para chegarmos a este entendimento é necessário possuir ânimo puro e um laço de simpatia (AFETO) que nos uma com tudo quanto foi criado.
Finalmente o último texto de Fernando Rocha, de uma redenção implícita: “Afeto sem o filtro da linguagem” que parece apontar para outras direções (por vias transversas e largamente poéticas). Ali o autor toca em certos mistérios de nossa existência (ver a correlação que faz entre as palavras afeto e feto). Ele as exprime à luz dos sentidos de sua cosmovisão. Volve o olhar para outras concepções relacionando-as ao que uma máquina não nos poderá dar jamais. E, por este olhar, se avizinha de mais profundas concepções de vida.
Aspirações frementes irrompem da alma humana atualmente, e este pensamento nos faz recordar que, em algum lugar deste texto, nos perguntamos se existe uma lei, imperceptível para nós, mais potente que furacões, vulcões e terremotos, que atua inexorável, a tudo movimentando e a tudo animando? Esta lei, queiramos ou não, existe como grande aspiração de nossas almas e se chama Deus! Mas isso é somente uma inferência do alucinado do resenhista, perdoem-me.
Aplausos ao Fernando Rocha. Fez-nos pensar em todas essas coisas com seu livro fininho ( e de capa tão simples e tão bela). Já é um começo e tanto para todos nós.
Novembro de 2016.

Livro: Afetos – contos, de Fernando Rocha. Editora Penalux, Guaratinguetá-SP, 2016, 102p.
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