spoiler visualizarLetícia Rentz 08/01/2022
História cativante e personagem terrível
Como uma boa admiradora de histórias de viagem no tempo, posso dizer que esse é um livro excelente. Sobre a história em si, é muito cativante e te prende desde o inicio, a leitura é fluída e intrigante. Apenas alguns pontos ficaram mal amarrados para mim. De inicio, o livro deu a entender que o personagem ia para diferentes épocas toda vez que saia do apartamento. O que fez com que a narrativa acontecesse na mesma época, então? Também, o fato dele ter dito no início que não era do tipo que tentaria rever seu eu mais novo e, ao final, ficava no parque observando a criança que já fora jogar bola. Acho que deveria ter alguma ênfase no momento em que decidiu que valeria a pena rever seu passado. E, o que garantia que nenhuma das pessoas que moravam no apartamento não iriam coincidir no tempo? E se voltasse, por exemplo, para antes de um dos moradores se suicidar? Para onde foram os outros moradores? O senhor que vendeu o apartamento para ele, era o "eu" dele mais velho?
Quanto à aspectos positivos, o livro criou uma boa tensão, daquelas que você lê e lê porque quer logo saber o que vai acontecer, quer logo aquela cena impactadora. E, ainda, me arrancou risadas, principalmente quando ele descobriu que Ana era casada (foi como se ele tivesse caído do pedestal que se colocou). Apesar de ficção, o autor tentou manter aspectos bem realistas na obra, o que me fez gostar mais ainda, como sua reflexão sobre não conseguir vender coisas do futuro para o passado, porque não se encaixaria na época (essa provavelmente seria a primeira coisa que eu tentaria fazer, sendo pouco racional).
Das minhas anotações, o que mais tem são críticas ao personagem principal. Ele não evolui, nem quando começa a amar. Ele permanece sendo um cara hétero, possivelmente branco, padrão, egocêntrico, preconceituoso (ele teve comentários gordofóbicos, racistas e machistas na obra) e inconsequente. Não sei se era a intenção do autor construir um personagem assim, mas confesso que, tirando algumas falas e atitudes, essa personalidade contribuiu para prender-me à leitura. O cara se sentia tanto em um pedestal, que se chamou de "senhor do tempo" e " centro do mundo" (não pensou nem por um segundo que talvez o centro fosse o apartamento e não ele?) e foi incapaz de se por em seu lugar, de "proletariado", quando falou com o chefe dele de maneira completamente arrogante, sem medo de perder o emprego. E se ele voltasse do nada e não tivesse mais emprego?
Por fim, não sei se isso é um ponto negativo ou positivo, porque penso que na mesma situação, eu não seria 100% racional como o personagem seria se notasse que ele estava quase refazendo exatamente os mesmos passos que não deveria refazer, como ao ir à ópera. A sua confiança excessiva em si mesmo e em acreditar que tudo era sobre ele, fez com que ele fosse ao teatro e sobrasse para o seu eu do futuro salvá-lo. Ele nem pensou, por um segundo sequer, que talvez a Icaraí fosse ser uma empresa grande por causa do investimento dele?. E, não sei se esses são pontos negativos ou positivos, porque além do motivo que eu já citei, tornou a história "mais real", sabe? Um personagem que sabe de tudo grita FICÇÃO. Sobre a cena final, chocante e inesperada. Eu simplesmente amei.