O túmulo de Lênin

O túmulo de Lênin David Remnick




Resenhas - O Túmulo de Lênin


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Camila Faria 03/11/2020

David Remnick é um nome de peso no jornalismo americano, especialmente (e merecidamente) reconhecido pelo seu trabalho como editor do The New Yorker desde 1998. Em meados nos anos 80 Remnick teve a oportunidade de estar onde qualquer jornalista político adoraria estar: no olho do furação da Perestroika, como correspondente do jornal Washington Post na Rússia entre 1985 e 1991. O livro, vencedor do prêmio Pulitzer, é um mosaico com centenas de reportagens feitas na época e reúne as entrevistas e conversas do jornalista com figuras diversas, de pessoas comuns aos mais altos membros (e ex membros) do Partido Comunista. Um retrato impressionante do colapso da União Soviética, o livro esmiúça o conturbado (e lento) processo de abertura política e de transparência no governo, que permitiu o (ocasional) acesso a documentos secretos e a, consequentemente revelação das muitas violências do partido como instrumento de luta e de permanência do poder. Eu já estava familiarizada com o estilo irônico (e meio debochado) do Remnick e acredito que esse tom mais leve tenha sido um dos motivos do sucesso do livro ~ mas confesso que, depois de um tempo, estava achando um pouco desnecessário o certo orgulho infantil que o autor demonstra das suas investidas, fazendo chacota de figurões decadentes. Não precisava, o trabalho de pesquisa e exposição das informações reveladas no decorrer da história são incríveis por si só.

site: http://naomemandeflores.com/os-quatro-ultimos-livros-27/
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Tiago 14/07/2017

FOI-SE O MARTELO!
Em um primeiro momento me parece ser bastante contraditória a posição do Partido Comunista Soviético em se auto proclamar como um produto do marxismo e ao mesmo tempo ser profundamente ideológico. Isto porque o próprio Karl Marx tinha um conceito bastante negativo quanto às ideologias. Ele as considerava como um mecanismo de coerção social que dificultava a percepção do que ele chamava de alienação.
Marx considerava como ideologia o conjunto de idéias e normas que condicionavam o comportamento dos indivíduos aos interesses da classe dominante. No sistema soviético supostamente não existiam classes, mas apenas uma: a do proletariado. Uma única classe com uma ideologia tornava o cidadão soviético alheio a todos os aspectos de sua vida. Era a forte ideologia do partido comunista que impedia que essa condição alienada torna-se obvia.
O que num primeiro momento me pareceu contraditório posteriormente se tornou bastante lógico: o responsável pela transfiguração da essência negativa do conceito marxista de ideologia para algo positivo foi o próprio Vladimir Lenin que criou a idéia de uma ideologia proletária oposta a opressiva ideologia burguesa. Na teoria um antagonismo, na pratica apenas mais do mesmo.
Relançado pela Companhia das Letras, em função do centenário da revolução russa, a obra “O tumulo de Lenin”, do jornalista norte americano David Remnick, é um mergulho político nos momentos finais do regime soviético. Corrupção, inflação, burocracia partidária, produtividade insuficiente, diferenças culturais e étnicas, escassez generalizada e altos gastos com industria bélica na manutenção da linha de frente da guerra fria fizeram o gigante vermelho desmoronar.
Não é uma obra que se detém em informações, ou seja, ela presume que seu leitor tenha certo conhecimento dos fatos apresentados. O quadro histórico é apresentado sem muitos esclarecimentos, o que é muito bom tendo em vista o que o texto de propõe a ser. O autor constrói uma espécie de crônica sobre o que ele viu em diversas cidades da União Soviética no período de 1985 a 1991.
O livro é recheado de entrevistas que oscilam do cidadão comum ao mundialmente conhecido físico Andrei Sakarov. É por meio dessas entrevistas que Remnick resgata alguns lampejos da trágica historia russa do século XX. Esse é sem duvida um dos grandes méritos da obra pois a forma como o autor transita entre o passado é o presente é construída por meio de uma narrativa artificiosa e agradável.
O tema central é basicamente a política de Mikhail Gorbatchev que promoveu a desfragmentação da União Soviética e a sua posterior transição de um regime socialista para um democrático. A narrativa se articula em torno da Perestróika e tenta mostrar a polaridade política entre os que defendiam a necessidade de reformas e a linha dura do partido comunista.
Alguns capítulos possuem nomes de obras clássicas da literatura como “Gente Pobre” de Dostoievski e “Ilusões Perdidas” de Balzac. Outros fazem uma espécie de paralelo entre o que existia na literatura e o que podia ser visto na União Soviética, como é o caso do impressionante capitulo “A revolução subterrânea” no qual a realidade dos mineiros da cidade siberiana de Mezhdurechensk é comparada a dos mineiros da fantástica obra de Emile Zola: “Germinal”.
O “Tumulo de Lenin” é uma obra excelente, e eu diria que é mais um grande acerto da Companhia das Letras. Grande em todos os sentidos, pois a obra possui 670 paginas de texto (excluindo as paginas com notas e referencias). O projeto gráfico é bem simples e com poucas fotos.
Não é uma obra que agradaria a todo tipo de leitor, pois apesar de ser um texto bem fácil ele possui uma boa dose de política, sobretudo nas ultimas paginas quando o foco passa para a tentativa de golpe de Estado dos conservadores e o ataque ao prédio do Parlamento Russo. Mas para quem se interessa pelo tema chega a ser muito satisfatório ler sobre ícones como Boris Yeltsin e Gorbatchev em meio ao turbilhão político que marcou o final do século XX e sobre o qual se ergueu o século seguinte que já nasceu em meio a incertezas e cercado por todo tipo de violência. Grande livro, ótima narrativa e um excelente resgate histórico.

AUTOR
TIAGO R. CARVALHO


site: http://cafe-musain.blogspot.com.br/2017/07/foi-se-o-martelo.html
Lili 17/07/2017minha estante
Você tem indicações de leituras complementares (pq vc disse que o texto não se detém em informações e presume um certo conhecimento por parte do leitor)?


Albert 21/07/2017minha estante
Liliane, embora eu ainda não tenha lido O Túmulo de Lênin, caso tenha interesse no contexto político do regime do Comunismo em escala global, recomendo a extraordinária obra Ascensão e Queda do Comunismo do Archie Brown. Já partindo da perspectiva dos crimes do regime, indico outra obra extraordinária: O Livro Negro do Comunismo. Este último possui uma leitura mais densa comparada ao primeiro. Ambos são necessários para compreender o regime em diferentes contextos.


Tiago 29/07/2017minha estante
Ola Lili.
Olha depende do período soviético em questão. Para se ter um excelente resumo do regime soviético desde a revolução russa até a Perestróica indico a obra do brasileiro Daniel Arão reis filho: (As revoluções russas e o socialismo soviético)
Sobre Lênin indico a biografia escrita por Robert Service (Lenin a biografia definitiva). A famosa obra de John Red (Dez dias que abalaram o mundo) é uma ótima crônica sobre a revolução russa, mas é um texto para ser lido após já ter um conhecimento básico sobre o tema.
Sobre Stalin tem os dois volumes de sua biografia (Stalin triunfo e tragédia) escrita por Dmitri Volkogonov que também é autor de (Os sete chefes do império soviético).Trata-se de uma obra que constrói a biografia de todos os lideres do período soviético. Apesar de parecer resumida o texto é na verdade bastante abrangente.
Um livro que gosto bastante é (Um Stalin desconhecido) do Zhores Medvedev (que o David Rimback cita bastante no Tumulo de Lenin). Trata-se de uma obra que aborda certos temas sobre Stalin como sua relação com a lingüística russa, o projeto atômico, sua saúde e o que foi feito dos livros de sua biblioteca particular após sua morte. Mas nenhuma biografia de Stalin escrita ate hoje supera os extraordinários (O joven Stalin) e (Stalin a corte do czar vermelho) de Simon Sebag Montefiore.
Sobre a vida privada na união soviética no período stalinista indico (Sussurros) do Orlando Figes (Excelente e enorme), (Beria o lugar-tenente de Stalin) e (Quem matou Kirov?) ambos da Amy Knigth. As obras de Svetlana também são ótimas: (Vozes de Tchernobil) e (A guerra não tem rosto de mulher).
Estes são livros de não ficção, mas algumas obras de ficção também são ótimas para se compreender o período, pois são construídas a partir de acontecimentos reais. Mikhail Bulgakov e Vassili Grossman têm excelentes obras sobre o período. O romance (Criança 44) de Tom Rob Smith é excelente também. Vou deixar os links com resenhas sobre essas obras ficcionais que citei caso tenta interesse.

(Vida e Destino) Vassili Grossman:
http://cafe-musain.blogspot.com.br/2016/12/vida-e-destino.html
(A estrada) Vassili Grossman:
http://cafe-musain.blogspot.com.br/2016/08/a-estrada.html
(O mestre e margarida) Mikhail Bulgakov
http://cafe-musain.blogspot.com.br/2016/05/o-mestre-e-margarida.html
(Criança 44)
http://cafe-musain.blogspot.com.br/2013/05/crianca-44-e-o-discurso-secreto.html

OBS: tive que colocar os títulos das obras entre parenteses porque o site reconhecia "aspas" como pontos de interrogação.


Addson.Luis 08/08/2017minha estante
Comprei este livro, mas quero terminar um sobre Stalin (A Maldição de Stalin) para começá-lo. Meu interesse pela polítia russa do século XX, e sua história, deu-se depois da leitura de "Morte de um dissidente", de Alex Goldfarb e Marina Litvinenko. Ele narra a morte de Sacha Litvinenko, o famoso "espião" russo supostamente envenenado pelo governo russo (Putin). Para explicar a morte (o suposto desejo de Putin de matá-lo) do russo, o autor fala sobre a política e seus interesses, a ascensão de Putin, os esquemas de privatização, a onda de morte perpetrada contra civis russos (atentados), entre outros problemas.

Só posso dizer que logo após ler sua resenha, aumentou meu desejo de começar a ler o livro logo!


Tiago 09/08/2017minha estante
Addson.Luis para você que gostou do livro "Morte de um dissidente" indico o livro "O laboratório dos venenos - a industria do assassinato politico na Russia de Lenin a Putin" do autor Arkady Vaksberg. Ótimo livro!


Addson.Luis 11/08/2017minha estante
Obrigado, Tiago!




CarlosLopeSh 27/02/2018

A abolição da escravatura socialista soviética
Concluí a sua leitura e bati palmas, de pé! :)
Esse excelente clássico do jornalismo tem como epicentro a era Gorbatchóv (1985-1991), porém as sete décadas do Socialismo na União Soviética, desde a sua implantação pelo Partido Comunista até a sua derrocada, são abordadas pelo autor de uma forma reveladora.

A obra é apresentada através da narrativa muito bem elaborada dos fatos históricos expostos a partir de entrevistas e do testemunho do autor e é dividida em 5 partes. Ela inicia inserindo o leitor na Perestroika, onde a necessidade de resgatar a história real provoca um ziguezague constante entre passado e presente, estabelecendo os devidos vínculos causa-efeito. Ela vai mostrando, na segunda parte, toda a realidade da União Soviética socialista, a igualdade do povo na pobreza e a casta privilegiada dos comandantes do Partido (para derrubar uma casta do poder, o Socialismo implanta uma ainda mais forte e mais agressiva, obviamente!). O leitor vai caminhando na terceira parte pelos dias revolucionários, não só os que levaram o Partido ao poder, mas os que o levaram também à sua derrocada! A quarta parte trata de um tema resumido em uma palavrinha muito usada atualmente pela Esquerda no Brasil: o golpe! Entretanto, trata-se de um golpe de verdade, um golpe de Estado, conduzido pelos linhas-duras do partido vermelho que não queriam largar o osso! Engraçado é ver os Socialistas sendo chamados de direita-extremista e reacionária, enquanto os adeptos à democracia e à abertura ao Capitalismo, de revolucionários (será que o Leandro Karnal chamaria os Socialistas como sendo de uma direita delirante? hehehe). Um golpe que durou 3 dias e que, mesmo com o uso de um aparato de guerra, fora um fracasso pela combinação de confusão, estupidez, embriaguez, falta de convicção, erro de cálculo e acaso (a bendita chuva!). Finalmente, chegamos na última parte para conhecermos o fiasco de um capitalismo primitivo (que arruinou a economia das repúblicas agora independentes, causador de uma nova forma de corrupção e máfia e motivador da diáspora de 25 milhões de russos para o estrangeiro), implantado de forma desastrosa num país onde o Socialismo estava inscrito a ferro e fogo na cultura do povo;

O autor, David Remnick, é um jornalista americano. O cara se garante, minha gente! Demonstra ser um entrevistador persuasivo e cativante que consegue extrair informações de pessoas que viveram a história em todas as fases do Socialismo soviético. Além desse feeling jornalístico, ele tem uma habilidade excepcional como escritor: produz uma estrutura textual bem elaborada, com a seriedade de um historiador mas também com o uso de um humor inteligente, combinado com uma ironia perspicaz!

Muito interessante é que a obra de George Orwell, 1984, é citada muitas vezes, já que ela acaba por tornar-se uma espécie de chave de leitura para a realidade histórica do socialismo soviético: o ministério do amor (KGB e a espionagem), o controle da História (através dos livros e da escola com partido), os falsos números de prosperidade, as crianças espiãs que entregavam seus pais, a novilíngua, o culto ao grande irmão Stálin (os comunistas tinham o seu canto vermelho com a foto de Stálin para ser adorada, roubando o lugar de Deus). Cara? tudo isso do livro do Orwell realmente aconteceu e é apresentado de uma forma documental! Minha Nossa Senhora... Foram mais de 50 milhões de pessoas assassinadas e outros milhões de pessoas escravizadas!

"Aviolência como um instrumento da luta de classes foi o ponto comum entre Lênin e Stálin; o romantismo revolucionário do primeiro, levou ao genocídio promovido pelo segundo;" (pág. 382)

Bem, o Mortimer Adler, no seu excelente livro Como Ler Livros, tem razão: um livro de História aproxima-se mais do estilo ficção que do estilo científico, haja vista tratar-se da narrativa de uma ou mais tramas, com personagens diversos. O leitor deve deixar que a trama aflore as suas emoções; deve tornar-se íntimo dos personagens e do contexto.

Sério? Gostei demais de O Túmulo de Lênin! Deparei-me com uma porção de emoções: bom humor, em muitas das narrativas que mais parecem crônicas; espanto e terror, diante das atrocidades cometidas pelo Partido Comunista em nome do poder e da mentira da igualdade de classes; suspense, ansiedade e triunfo em muitas tramas narradas, sobretudo quando da resistência ao golpe de Estado! Além de tudo isso, as surpresas e o prazer em adquirir novos conhecimentos, reduzindo drasticamente a minha ignorância da história, referente a esse contexto.

Concluí a leitura com uma convicção ainda maior de que a dependência ao Estado, assim como a ilusão de venerar políticos de estimação são espécies de escravidão. Observando o mundo real, os exemplo do passado, não as utopias teóricas, fica claro que devo buscar sempre a minha liberdade individual, não deixando que os grupos dos quais eu me encaixo roubem a minha capacidade de raciocínio crítico: é bom e necessário ser um dissidente em certas ocasiões!

Carlos Lopes
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Mateus.Frota 11/04/2023

Um recado ao stalinismo.
É um fato que apesar de sua excelente narrativa, Remnick não compreendeu completamente o processo que estava vivenciando. A sua ideologia liberal não o permite ir até o fim dos processos.

Mas nada disso impede que o leitor observe por atrás de sua ideologia, que no prefácio e no final da leitura, aparece: nenhuma Rússia "moderna" ou capitalista surgiu deste processo. Mas um país em frangalhos.

Gorbatchóv, pintado como um revisionista pelos stalinistas, aparece aqui como realmente é: um aparatchik do partido, tal como Stalin foi. Lenin e Trotsky são difamados como monstros violentos por Remnick. Mas o que o autor estadounidense faz com os seus legados, não chega nem perto do que Stalin fez..

É uma excelente leitura. Obrigatória para.. sim, os interessados no leninismo e no marxismo. Principalmente para que entendam que Stalin e seu legado, tais como Brejnev, nada tem a ver com isto.
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