Taverneiro 12/06/2017Livro divertido e épico, mais com alguns problemas de ritmo O mundo está em guerra. Há muito tempo o império vem tomando cada parte do mundo uma a uma. A Imperatriz Laseen traiu o antigo Imperador e tomou o poder, conduzindo as conquistas do império de cidade em cidade no continente de Genabackis. No início desse livro restam apenas duas cidades livres, Darujhistan e Pale, essa última prestes a entrar em confronto com as forças do império.
Algumas forças se opõem ao domínio da Imperatriz e uma das mais poderosas está ao lado da cidade de Pale na batalha. A Cria da Lua, uma montanha voadora cheia de corvos gigantes, lar da raça do povo de pele escura, os Tiste Andii e do líder deles, o poderoso Anomander Rake.
Logo no início do livro vemos o ataque das forças do império a cidade de Pale, e o duelo cara a cara dos mais poderosos magos a serviço da imperatriz contra Anomander Rake e a Cria da Lua, em um combate destruidor e de proporções titânicas.
Mesmo com a ajuda da Cria da Lua, a cidade de Pale cai. Anomander Rake e a Cria da Lua recuam para Darujhistan. Agora só existe uma cidade no caminho da dominação do Império Malazano e é a trama para a derrubada dela que acompanhamos aqui.
Jardins da Lua é um livro de fantasia épica escrito pelo Steven Erikson e lançado aqui pela Editora Arqueiro.
Esse é o primeiro da série de dez livros O Livro Malazano dos Caídos (The Malazan Book of the Fallen). O universo desses livros foi criado por Steven Erikson e Ian C. Esslemont para uma campanha de RPG. Esslemont também tem uma série de seis livros nesse mesmo mundo e as duas tem histórias complementares. Império Malazan conta a história de como a imperatriz tomou o poder e o primeiro deles, A Noite das Facas, foi publicado pela Cavaleiro Negro Editora.
Pensem no Jardins da Lua como um jogo de xadrez. O confronto entre o Império e Darujhistan é o tabuleiro. E tem muuuuitas peças em movimento…
Sobre a Criação de Mundo…
O mundo criado pelo autor é de magia altíssima! Existe uma força ancestral conhecido como os Labirintos, que são dimensões paralelas que os conjuradores podem acessar para pegar o poder de lá, ou viajar grandes distâncias através deles. Existem vários labirintos e cada um tem suas particularidades. Alguns labirintos tem a essência mais selvagem, outros são melhores para curar feridas e assim por diante.
O nível de poder dos personagens-chave nessa guerra é imenso, e logo no primeiro combate em Pale envolvendo Anomander Rake e os magos da Imperatriz nós vemos que são quase deuses se enfrentando em meio a pessoas comuns. Eu particularmente acho isso incrível. Para você que joga D&D, é basicamente como se fossem personagens épicos lutando em uma guerra. A destruição causada por esses fluxos de força não tem limites.
E os deuses, aaaa os deuses…. Eles têm uma presença muito forte no mundo. Eles interferem diretamente em assuntos mortais, as vezes até mesmo com possessões. São peças muito poderosas e a maior parte das pessoas teme que eles entrem em jogo. Mas não se engane, alguns dos não-deuses aqui (como o próprio Anomander Rake) são fortes o suficiente para comprar briga com os deuses, e isso torna tudo um jogo de discretas influencias e (por enquanto) não de combate direto contra divindades.
Geograficamente falando, esse livro apresenta pouco do mundo de maneira sólida. Temos alguns nomes de outras cidades, algumas raças não humanas aparecem e ficamos sabendo de outras peças no tabuleiro da guerra que estão posicionadas em outras frentes (Como o lendário comandante Caladan Brood). Temos algumas cenas mostrando que esse mundo é imenso e cheio de detalhes que provavelmente serão explorados em sequências (Tipo cenas pós-créditos nos filmes da Marvel), mas nesse livro em específico apenas Darujhistan é bem explorada.
Fica claro que é um mundo muito rico em detalhes e isso provavelmente é um reflexo da criação dele associada ao RPG. Em um livro normal, o wordbuilding tem certo limite: você cria o que precisa para a história. Mas em um livro de RPG isso não tem fim, você pode ir de vila em vila criando lendas e personalidades sem parar e não precisa dar uma resolução para nada porque, afinal, são os jogadores que vão resolver aquilo. Eu senti muito esse ar RPGistico aqui nesse livro. Todos os personagens e locais tem vida e isso foge aos padrões do que estamos acostumados.
Sobre a escrita…
Ela é bem direta. A narrativa em geral é acelerada, o que dá a sensação de que você pegou um trem em movimento (ou foi atropelado por ele, não estou certo qual analogia é melhor XD) e todo o conhecimento têm que ser pego nos pedacinhos que o autor solta e montados para formar a grande história por trás de tudo (tipo o jogo Dark Souls XD). Sobre a gramática, não existe floreio ou embelezamento excessivo das cenas. Algumas cenas de batalha tem uma descrição mais trabalhada, mas de maneira geral é uma escrita simples e satisfatória. Ele também coloca trechos de poemas do mundo no início de cada capitulo e isso é bem bacana. Realmente não tem muito o que comentar sobre a maneira como ele escreve.
A Edição da Arqueiro conta com um esquema de rostos e nomes parte interna da capa. Além disso também tem um belo glossário que ajuda muito se você estiver perdido. ^^
Sobre os personagens…
Bem, então…. Sabe o que eu falei sobre ter muuuuitas peças nesse tabuleiro? Essa foi a característica do livro que mais me incomodou. A narrativa acelerada e pouco explicativa, somada a uma quantidade exorbitante de personagens com arcos próprios deixa esse livro complicado. Eu vou falar um pouquinho sobre ALGUNS dos personagens desse livro.
Imperatriz Laseen, Soberana do Império Malazano, traiu o antigo imperador e tomou o poder. Têm vários problemas com rebeliões e traidores, mas ainda assim continua conquistando territórios.
Conselheira Lorn, figura de confiança da Imperatriz. É enviada para Darujhistan para averiguar os Queimadores de Pontes ou qualquer outro movimento suspeito, mas sua missão principal é trazer uma peça antiga e extremamente poderosa para o tabuleiro, que pode tirar até o próprio Anomander Rake do jogo.
Sargento Whiskeyjack, Sargento dos Queimadores de Pontes, uma tropa Lendária que serviu ao antigo Imperador, mas que após o golpe está sendo lentamente descartada pela Imperatriz que teme qualquer um que fosse muito leal ao imperador. Whiskeyjack em especial era um comandante lendário com muito prestigio na época do Imperador, mas agora teme levar uma facada nas costas de qualquer um que não seja um dos Queimadores de Pontes.
Tattersail, uma das feiticeiras que compõem do Segundo exército. Logo no inicio participa da batalha cara a cara com a Cria da Lua e vê, horrorizada, o massacre acontecendo. Acaba se envolvendo na trama dos Queimadores de Ponte e o medo deles de estarem sendo descartados.
Hairlock, Também do segundo exército junto com Tattersail e acaba sendo mortalmente ferido na luta em Pale. É “salvo” pelos Queimadores de Pontes que transferem sua alma para um boneco e controlam ele momentaneamente.
Ben Ligeiro, Queimador de pontes, mago muito poderoso. Ele que transfere a essência de Hairlock para um boneco e tenta usá-lo, mas acaba tendo problemas para controlar o antigo.
Piedade, uma das mais novas recrutas dos Queimadores de Pontes, muito jovem, mais ainda assim uma assassina assustadoramente eficiente, quase como se houvesse algo mais por trás da sua habilidade…
Ganoes Stabro Paran, nobre de nascimento que abandonou sua vida na corte para se tornar um oficial do Império Malazano. Acaba conquistando a confiança da Imperatriz e é enviado para comandar os Queimadores de Pontes, e eliminar uma certa integrante que suspeitam estar sendo usada por um deus.
Dujek Umbraço, Alto Punho dos exércitos Malazanos. Serviu fielmente o Imperador e por isso a Imperatriz teme uma traição dele. Logo ela toma medidas para diminuir a influência do Alto Punho, o que acaba deixando ele insatisfeito e mais tentado a trair a Imperatriz.
Tayschrenn, Alto Mago da Imperatriz, lutou contra a Cria da Lua e se aproveitou para no meio da batalha resolver algumas divergências com alguns outros magos.
Kruppe, um morador de Darujhistan, tem um certo poder nos seus sonhos de entrar em contato com entidades antigas.
Crokus Jovemão, um jovem ladrão que praticamente caiu de paraquedas nas tramas do livro. Ele encontra logo no início uma moeda com o poder dos deuses da sorte e acaba tendo influencia em várias situações sem nem perceber a gravidade do que está acontecendo. Seu arco pessoal mesmo é uma paixonite por uma nobre local.
Rallick Nom, um membro da Sociedade de Assassinos de Darujhistan. Têm uma vingança pessoal a realizar com um dos conselheiros da cidade.
Baruk, um Alto Alquimista e um dos que tramam nas sombras para defender Darujhistan do Império.
Percebeu que muitos deles têm pelo menos uma organização relacionada no seu resuminho? Pois é, podem chamar Steven Erikson de muita coisa, menos de preguiçoso ao criar mundos. E esses são só alguns dos personagens. XD
“Mas me diz, ele faz esse montão de gente aí e fica tudo bagunçado né? Só pode! ” Não exatamente. Todas as tramas parecem jogadas e desconexas até que se encontram. O desenvolvimento pessoal de cada um é beeeeem diferente do que você está acostumado a ver em qualquer livro e, embora não chegue a ser um desastre total, fica muito raso na maioria dos casos. Eles são carismáticos, mas praticamente nenhum chega a mudar de verdade nessas 600 páginas.
Lembrando também que esse é só o primeiro de DEZ livros né. Muita coisa pode rolar ainda.
Sobra a Maior Inspiração desse Livro…
Quando um autor não consegue deixar a sua obra apreciável para novos leitores eu acho isso um defeito. Apesar disso eu curti bastante esse livro! Ele é muuuito inspirado pela Companhia Negra, tanto na narrativa que dá a sensação de que você pegou o bonde andando quanto nos personagens épicos lutando em meio a humanos “normais”. Os próprios Queimadores de Pontes têm um clima total da Companhia Negra, e eu acabei curtindo aqui todas as características que eu gostei no livro de Glen Cook, como vocês podem ver na resenha dele aqui.
Enfim…
Jardins da Lua é um livro muito divertido, intrincado, com ótimas tramas e personagens carismáticos, mas esses mesmos personagens não são bem explorados. O estilo acelerado é bem prazeroso para alguns (incluindo eu) mas é questão de gosto. Se o leitor não é acostumado com fantasia épica eu não recomendo começar por esse livro. Mas se você já está habituado com mundos fantásticos e curte entrar em um novo mundo eu recomendo que você se deixe levar pela leitura e tenha paciência, pois esse é um excelente livro de fantasia (mais que) épica!
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https://tavernablog.com/2017/06/05/dica-da-taverna-jardins-da-lua-e-como-escrever-sem-se-importar/