Giuvanexx 10/12/2023
Despolitizado, despolitizante e antipolítica
Três coisas me interessaram na compra e leitura do livro: 1. o preço; 2. o gênero, romance histórico; 3. o fato de ter sido finalista do prêmio Jabuti (o que é usada na sua divulgação).
Aparentemente, a julgar por esse livro, nem tudo que é indicado pro Prêmio Jabuti é ótimo. O livro não é ruim, mas, entre os méritos, parece ser apenas uma história "mais ou menos" bem contada por alguém que "aparentemente" conhece sobre o campo.
Digo "mais ou menos" por conta do final (últimas trinta páginas, talvez?), onde a resolução da história parece ser pouco crível, em determinados momentos um pastiche de novela mexicana, em especial pelo fato de todos os personagens passarem a explicar tudo desnecessariamente; além disso também é bastante previsível (isso desde cedo).
Menciono o "aparente" (me refiro dessa maneira por não conhecer o bastante para saber julgar a veracidade das informações) conhecimento do autor sobre o campo, de onde surgem diversas comparações, analogias, frases que remetem a conhecimento popular, assim como a própria descrição de cenário - nesse ponto me lembrou Viva o Povo Brasileiro, de João Ubaldo Ribeiro. Apesar disso, a escrita, no entanto, é bastante crua, nada bela, nada poética, pouco inventiva. Um livro "curto e grosso", que incorpora o espírito e parece ser escrito por Tonho Pólvora (personagem do livro).
Quanto aos personagens, me incomoda o fato de todos eles serem bastante unidimensionais, preto e branco, nada cinza: existe o lado bom e o lado mal, além de alguns personagens coadjuvantes que não tem espírito próprio, além do fato de cumprirem a função de coadjuvantes. É um mundo pobre, que se concentra - e, além disso, cita - pouquíssimos personagens; alguns deles são jogados na narrativa de maneira bastante casuística, como é o caso de João Carneiro que ganha destaque convenientemente quando o destino dos vilões já está marcado, e deve substituir esses, corporificando os males da república e da democracia.
Nesse sentido, a crítica é bastante despolitizada, despolitizante e antipolítica. Em alguns momentos o regime dos coronéis é claramente idealizado e defendido, como no trecho a seguir: "a estrutura feudal das fazendas pressupunha essa amizade e lealdade recíproca. Os patrões eram responsáveis e protetores de seus empregados, estes lhe deviam fidelidade e serviço. O futuro ia mudar todo esse relacionamento. Alguém ia dizer que patrões eram apenas exploradores e opressores, empregados eram oprimidos e sofredores. Seria necessária uma luta política e social em que a palavra de ordem seria a dos direitos do operariado e deveres dos patrões. O contrário não seria cogitado, seria um pressuposto jugar-se que os patrões já gozavam de seus direitos e os operários eram escravos de seus deveres" (p.281); ora e os "direitos dos patrões", quer saber o autor? Daqueles, que, antes da república, eram proprietários de escravos!!!
Em vários outros momentos a república é relacionada à corrupção, mas nunca (ou quase nunca?) aos militares, que foi o grupo que assumiu efetivamente o poder com o fim do regime monárquico. Ao longo de todo o livro existe uma distinção moral entre o campo e a cidade, esta última, representada por João Albério, lugar de corrupção, mentira, futilidade, enquanto o campo é lugar da inocência, do trabalho. Uma visão que, imagino, reflita o lugar social do autor, médico e agropecuarista. Visão que se expande em direção à concepção que tem sobre riqueza e pobreza: "pobres de origem e condição de vida são pobres mesmo, sem ilusões ou ambições", ora pobre, você não tem ambição, quem tem é o rico! e continua "ricos, quando ficam pobres, sofre mais que os pobres de verdade - por não aceitarem a pobreza, pela perda de status, pelo orgulho, por mil coisas que vão acontecendo, humilhando e derrotando os que baixam pelos degraus da vida" (p.322), que sofre mesmo é o rico empobrecido, o pobre não.
Repassando tudo isso agora, talvez não ache que o livro seja bom, mas, no máximo, mediano. Desconhecedor do Jabuti, penso - e espero - que esse livro tenha sido indicado por ser livro mineiro.