Tamy.Queiroz 21/03/2018 Às vezes a vida real parece um filme. Às vezes o que aconteceu de verdade parece um roteiro cinematográfico de tão improvável. Foi o que aconteceu com os pais de Peter Gárdós. A história deles parece irreal, saída direto de uma daquelas películas em que as pessoas ainda escrevem cartas e se apaixonam à primeira vista. Tinha tudo para ser uma daqueles romances emocionantes tipo “Diário de uma paixão”, mas alguns detalhes deixaram muito a desejar.
Miklós é um jovem judeu que mal sobreviveu ao holocausto. Ainda convalescendo e com a notícia de que tem pouco tempo de vida, ele decide que quer se casar. Consegue o endereço de 117 sobreviventes judias e escreve cartas para elas, na esperança de encontrar uma esposa. Dentre as moças que respondem, está Lili, que está se recuperando num hospital com algumas amigas. As correspondências entre os jovens se tornam frequentes e eles logo percebem que sentem algo especial um pelo outro.
O aspecto mais interessante da narrativa, para mim, foram os sentimentos dos protagonistas. Não apenas o que sentem um pelo outro mas como se sentem como judeus após o fim da guerra. Como eles sofrem pelos amigos que não sobreviveram, como alguns se voltam contra a própria religião, como sonham com um futuro apesar de saber que não podem esquecer os horrores que viveram.
Mas este não é um livro sobre a guerra. As atrocidades da guerra são mencionadas de leve, mas nunca ofuscam a narrativa do romance. O foco aqui são duas pessoas que se apaixonam em circunstâncias incomuns.
Apesar da premissa interessante, parece que o livro não deslancha em momento algum. Os protagonistas têm pouco ou nenhum carisma, de forma que você não se importa com o que acontece com eles porque eles não são interessantes. O Miklós (meu deus, que criatura maçante) é um jovem pretensioso e até um pouco arrogante, que resolve que quer casar de qualquer jeito, apesar do prognóstico péssimo e como se casar fosse a única coisa relevante que uma pessoa pudesse fazer na vida. Dá um pouco de nervoso ver como ele esconde a própria doença, ignorando que a mulher que se apaixonar por ele pode não estar disposta a cuidar de um doente terminal. E a Lili, coitada, é uma songa monga desinteressante e sem nada de relevante pra dizer. Esses dois bem que se merecem.
Aí você pensa, “ah, mas os coadjuvantes devem ser bons, pra salvar a história”. Queria eu. Os amigos do casal se resumem a um cafajeste sem salvação, uma traíra (que não tem um motivo razoável pra fazer o que fez) e uma mocinha tão sem sal quanto a Lili. Além disso, o autor faz questão de ridicularizar as únicas duas moças gordas que aparecem na história, fazendo delas motivo de chacota entre os outros personagens. Tudo bem que a história se passa no século passado, mas ela foi escrita no ano passado e chamar uma pessoa gorda de “grotesca” é abusar um pouco da sua liberdade criativa.
No meio de tanta arrogância, tanto do autor quanto dos personagens, o livro perde uma ótima oportunidade de ser um romance edificante e lindo, se tornando só uma historinha chata sobre dois jovens imprudentes. Nenhum detalhe parece ter sido acrescentado pelo autor, como se ele não tivesse criado nada na história, só transcrito algumas cartas. No final, parece que o único detalhe interessante da trajetória do casal foi ter se conhecido por correspondência, o resto é história comum e sem graça como a de qualquer outro casal por aí.
Esse livro podia ter sido tanta coisa, podia ter sido tão lindo… Mas é só um livro que você torce pra acabar logo.
Obs.: Apesar de o livro ser de 2016, o filme é de 2015 (vai entender) e foi dirigido pelo próprio Péter Gárdos.
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disponível em detudoumpouquinho.com