valentine 07/09/2022Completamente descabeçado"Me diga quem eu sou" é o último livro da minha maratona de leituras sobre a doença maníaco-depressiva, pra que eu mesma possa falar da minha experiência com a doença de forma responsável, didática e empática.
Helena é obviamente uma Bipolar Tipo I, em que os surtos de mania predominam e, com eles, sintomas psicóticos graves que a colocam em perigo. Isso faz dela uma narradora não confiável, que me fez erguer as sobrancelhas pra inúmeras situações que apareceram, desenrolaram e se resolveram como num passe de mágica. Não vamos confundir prolixidade e palavras complexas com boa escrita: tudo isso perde o encanto com uma narrativa confusa, apressada e superficial dos surtos maníacos. Numa hora ela está à beira de um evento traumático e na outra é salva de súbito por algo invisível, inexplicado.
O único ativismo sobre saúde mental que Helena apresenta está na luta contra o sistema manicomial, onde discorre sobre a forma como foi tratada, jogada aos escanteios, muitas vezes amarrada e humilhada por quem deveria estar lhe oferecendo um processo de cura. Ela fala sobre a esperança de um tratamento digno e que a "loucura", como chama, não deveria ser fator de humilhação e desprezo, mas mesmo assim não hesita em retratar as mulheres internadas com ela da mesma forma desrespeitosa: diz que são um bando de insanas, nojentas, asquerosas e que enlouquecia de ouvir "apenas ganidos femininos", ansiando pelo momento em que as portas se abriam para homens e mulheres conviverem juntos em um pátio.
Ser bipolar não classifica alguém para escrever um livro sobre bipolaridade. É preciso arcar com muita responsabilidade para informar e, com sorte, lidar com o estigma que a doença carrega, o que pede de si clareza sobre o que aconteceu, e com isso muito, muito estudo. Isso não ocorre no livro de forma alguma. A impressão que eu tenho é de ter estado em um grupo de apoio sem supervisão em que alguém descarregou toda a sua história e nos aconselhou da forma que achou melhor, sem levar em consideração qualquer gatilho ou caminho mal ladrilhado ao qual pudesse estar nos levando. Andrew Solomon já havia nos dito que pessoas com transtornos mentais podem confortar uns aos outros, mas são péssimos conselheiros para lidar com a situação. Por favor, se informem sobre sua condição, procurem profissionais em quem confiem e livros escritos, sim, por pessoas com doenças mentais, porém com maestria no assunto.