Queria Estar Lendo 21/05/2017
Resenha: Em Águas Sombrias
O Grupo Editorial Record enviou de cortesia um exemplar de Em Águas Sombrias para o blog. Entre grandes revelações e reviravoltas chocantes, esse entra para o hall de livros que mais me prendeu na cadeira e me deixou sedenta por respostas - e também terrivelmente assombrada por elas.
Uma mulher aparece morta no rio que atravessa Beckford, uma cidadezinha no interior da Inglaterra. Os mistérios ao redor da sua morte vão além do esperado e envolvem diversos moradores daquele lugar. Há quem diga que ela se matou, há quem diga que foi assassinada; as respostas envolvem seu passado conturbado. Esse rio já levou a vida de muitas mulheres ao longo dos anos, desde a época da caça às bruxas, e sua história é o palco principal da investigação dessa horrenda morte.
"Ela acordou no meio da noite, foi até o rio e nunca mais voltou."
Ainda não tinha tido contato com a narrativa da Paula Hawkins até então. Tinha curiosidade para ler A Garota no Trem, mas Em Águas Sombrias foi minha primeira aventura no universo de suspense que a autora cria tão bem, em uma narrativa que conquistou milhões de pessoas ao redor do mundo. Esse livro é chocante e perturbador do início ao fim.
"De início, o luto era reconhecido, respeitado, acatado. Mas, depois de um tempo, começava a interferir - nas conversas, no riso, na vida normal."
Muitas mulheres já morreram no rio da cidade. As histórias mais antigas falam sobre assassinatos, as mais recentes, sobre suicídio. A verdade é que ninguém nunca soube de fato o que levou aquelas mulheres até as águas sombrias; elas subiam ao penhasco e caíam, simplesmente. Quando o corpo de Nel Abbott aparece nas margens, no entanto, as histórias começam a se conectar, e o que era simples e perturbador se torna uma trama bem orquestrada, cada detalhe se conectando em uma rede de respostas.
"Há quem diga que essas mulheres deixaram algo de si na água."
As primeiras páginas foram confusas porque havia personagens demais - mas, quando você começa a reconhecer seus trejeitos, seus detalhes, as coisas peculiares em cada parte de sua narrativa, aí entende a necessidade de tantos olhares sobre uma história só.
Jules é irmã de Nel; ela retorna à cidadezinha ao saber da morte. Perturbada pelo passado e pela sensação de que Nel deixou muito em aberto antes de ir, principalmente pelos fatos que levaram as duas irmãs a se distanciarem, Jules acaba se deixando levar pelo medo e pelo mistério e pela certeza de que o passado responderá o presente.
Sean é um dos detetives responsáveis pela investigação da morte de Nel. Ele também esteve presente quando Katie se jogou do penhasco, deixando que o rio a levasse. Ela era uma doce garota prodígio, e, a princípio, nada tinha a ver com Nel Abbott. Pelo menos não até pequenos e sombrios segredos começarem a ser revelados, levando a uma intrincada trilha de respostas que ninguém, nem mesmo a família de Katie, gostaria de descobrir.
Lena era melhor amiga de Katie, filha de Nel. Uma esquisita aos olhos dos moradores da cidade, tal como a mãe. Desconectada, rebelde sem causa. Uma menina assustada com segredos demais pesando em suas costas. Uma adolescente furiosa com a injustiça e o pouco caso, com as mentiras que as pessoas inventam para se safar das coisas horríveis que fazem.
Louise é a mãe de Katie. Ela e a família estão em luto por tempo demais, o peso do suicídio da filha sobre seus corações. Louise não aceita o que foi dito; ela não vê Katie como a vítima que todos pintaram, não vê Katie com o desequilíbrio emocional que disseram existir. Sua filha era perfeita e algo aconteceu com ela. Alguém a empurrou do penhasco.
"A gente acha que a dor vai ser menor, a humilhação, mais branca, se ninguém mais puder enxergar."
Patrick é o pai de Sean. Um homem marcado por uma terrível perda em seu passado; a esposa também foi levada pelo rio. Outra vítima das águas sombrias que rodeiam aquela cidade. Patrick é um homem triste, esquecido. Seu coração está com o filho e com a nora, Helen, que cuida e faz companhia a ele.
Nickie é uma velha louca; ela ouve o rio, as vozes dentro dele. Ouve as tragédias que aconteceram, vê o que ninguém mais vê. Verdades que conta e ninguém acredita.
Erin é outra detetive cuidando do caso de Nel. A única pessoa sem qualquer envolvimento com a cidade ou com as perdas anteriores; a mente sensata em meio a tantos emocionais descontrolados.
Paula Hawkins trabalha principalmente em cima desses personagens. Ela apresenta suas histórias com calma, interligando as tragédias, conectando seus passados, justificando o presente de cada um. Com maestria, a autora conduz o suspense do início ao fim, prendendo a atenção do leitor a respeito do que é crime e do que é suicídio; o que faz um monstro e o que faz uma vítima.
O final é de explodir a cabeça. Os últimos capítulos mexem bastante com o seu emocional, mas a última página, o grand finale. Aquela última linha foi de deixar meu queixo no chão por longos minutos, e eu ainda fico perturbada só de lembrar!
Esse livro é um pesadelo sobre a vida de diferentes mulheres e como foram afetadas pelos olhares, pela pressão, pelo terror dos julgamentos das pessoas à sua volta. Desde aquelas afogadas por bruxaria até aquelas que confrontaram o pior da humanidade, em seus dias atuais, e encontraram as respostas finais para todo aquele sofrimento em águas sombrias - independente das que foram empurradas e das que se jogaram por livre e espontânea vontade.