Math 25/02/2012
Um belo ensaio sobre a Angústia
O livro é composto por três contos, são eles: Alma de criança, Klein e Wagner e O Ultimo verão de Kligsor.
Gosto sempre de começar uma resenha puxando por um contexto histórico cuja obra se enquadra, pois dá ferramentas hermenêuticas para o leitor. Então, Hermann Hesse viveu entre 1877 e 1962 e, sendo alemão, quais foram os grandes acontecimentos presenciados por ele? Exatamente, as duas grandes guerras. Sabemos que qualquer intelectual tem a sensibilidade aguçada para os casos humanos, e, esses eventos não são pra qualquer cristão. E realmente não foi para Hesse também, que ao eclodir a Primeira Guerra Mundial, teve um surto emocional, quando teve seus primeiros contatos com a Psicanálise. O autor nasceu numa família tradicional da Alemanha, criado por pais missionários protestantes, logo, crescendo sobre regras rigorosamente impostas, chegando a cursar seminário, porém, ao questionar a religião fora execrado da família, “fugindo” para a Suíça. Em viagens à Índia (através de missões para pregar junto aos pais o cristianismo neste país) ele pôde conhecer a cultura espiritual do oriente. Esses são os fatos básicos que influenciam as obras do autor, mais pode ser encontrado em livros com caráter autobiográficos como “Minha Fé”.
Alma de criança:
O conto é narrado pelo personagem principal, uma criança cujos pais são bastante repressivos e impõem regras duras aos filhos. A criança mostra os pais bastante preocupados com a educação dos filhos, e usam isso de justificativa para uma “prisão”. A própria criança se mostra bastante obediente perante as leis, porém, é reprimido quando vai criticá-las. Então, ao perceber que seus pais não notavam o filho perfeito, que não fugia das normas, e ao descobrir sua própria personalidade, a criança decide fazer algo errado pra saber quais seriam as reações alheias. Do início ao fim do livro podemos ter uma base complexa acerca dos costumes que iniciaram o século XX, uma sociedade metódica e rígida. É gostoso notar como Hesse põe na criança um teor de autoconhecimento que faz tirar conclusões maduras, no entanto imperceptíveis a tantos adultos contemporâneos, fazendo uma crítica ao desprezo da fase infantil (pode ser observado também em Demian). É muito perceptível o jovem Hesse nessa narrativa.
Klein e Walter:
O conto começa com uma atmosfera densa onde o narrador está contando a história de Friedrich Klein. A história é contada como se tivéssemos lendo-a a partir da metade, o que deixa o texto um pouco complicado, pois, ele já trás consigo algum fardo pesado, um crime ocorrido recentemente, fazendo com que a narrativa seja melancólica. Este romance tem muito em comum com o famosíssimo clássico “Crime e Castigo”, onde é mostrado a cada momento o sentimento e pensamento do personagem que está em constante confusão quanto aos seus atos.
Klein, o personagem principal, foi um típico cidadão respeitável (tal qual o capitão Clubin, do clássico “Trabalhadores do Mar”), que pagava suas contas em dia e mantinha uma bela família, e decidiu abandonar tudo que tinha devido às suas angustias provocadas pelos mais variados motivos, mas um motivo ganha mais destaque que os demais: ele tinha acabado de descobrir o seu próprio eu, a sua personalidade, levando-o a perceber que sempre foi aquilo que os outros quiseram dele, pois por mais cidadão que fosse não era ele; sempre tinha que se sacrificar sempre pelos outros e “nunca aprovara a intenção secreta de seu coração e nunca a reconhecera sequer”. Após o reconhecimento de suas particularidades, o protagonista é uma pessoa altamente confusa, passando por profundo estado de depressão à profundo estado de alegria.
A todo o momento Klein é atormentado pela história de Walter, um assassino cujo protagonista está com ele na cabeça constantemente, assolado pela confusão, por vezes concordando com ele e entendendo perfeitamente seu crime, por ora lhe culpando e condenando com toda sua força. Walter é tão influente em Klein que muitas vezes pode ser confundido com uma personalidade sua, ou revelando ser seu possível alter ego.
Em sua fuga, ele vai para outra cidade com documentos falsificados, encontra uma mulher, que devido ao seu estado de espírito abalado julga-a preconceituosamente de forma perversa e forte (como faz nosso amigo Caulfield, em “O Apanhador no Campo de Centeio”), no entanto percebe que “todas as indignações, todas as raivas e todas as condenações eram um erro e uma infantilidade”. Aqui é revelado uma personalidade altiv, que rumina seus pensamentos. É importante essa passagem por que denota o valor que Hesse dá a o ato de desconfiar do que aparentemente é. O autor aproveita também para fazer uma crítica, aqui, à cultura do rótulo, onde necessitamos de um rótulo que caiba a nossa razão, precisamos rotular as coisas para que elas não fujam do nosso controle, sendo toda palavra uma forma de rótulo, de LIMITE.
“Klein e Walter” nos mostra um ser humano em meio às suas angústias, o foco é claramente a angústia do homem provocada pelo choque entre o individual e o coletivo-egoísta, que não aceita o indivíduo particular. Sendo assim, o autor constrói com maestria os sentimentos das personagens, fazendo o leitor sentir na pele as emoções por trás das letras, e revelando, depois de tanta confusão sentimental, um surpreendente fim. Esse conto é bastante denso e tenso, para lê-lo é bom estar em um estado de espírito bastante equilibrado, ameno.
O Último Verão de Klingsor:
O conto inicia-se com o anúncio da morte de Klingsor, um pintor que passou o resto de sua vida recatado numa região vizinha a sua cidade. Suas cartas revelam seu desejo pelo fim, dando hipóteses diversas ao caso de sua morte, principalmente o de suicídio. Depois de advertido, o leitor começa a viajar no verão descrito com maestria pelo autor, onde mostra um Klingsor bon vivant, aproveitador, pintando seus quadros e gozando da vida, vivendo a alegria e esquecendo, na maioria das vezes, a tristeza. Então ele reconhece, depois de reflexivas lembranças, que a vida não é apenas felicidades, fazendo-o ter diversas reações.
Até que Klingsor encontra um velho amigo pintor também, Louis, que gosta de aproveitar a vida sem ressentimentos. Louis o chama para um almoço “luxuoso”, ou no mínimo reconfortante, depois um encontro outro velho amigo de ambos, Luigi, com qual, no encontro Klingsor tem um diálogo sobre a arte (pintura, especificamente) demonstrando uma idéia combatente à mimese e defendendo o lado mais transcendental, espiritual da arte.
Louis, despreocupado com a vida sempre está sumindo e vindo, enquanto Klingsor fica em casa pintando seus quadros e escrevendo cartas aos seus íntimos quando tinha seus constantes ataques de ansiedade e melancolia; tais cartas são o resultado de sua impulsividade, por não conseguir ficar calado por tanto tempo sobre seus sentimentos. Para tais ele nunca contava com Louis (apesar de insistir e sofrer conseqüências pesadas), por isso preferia lidar com Luigi.
Então, Klingsor sai mais uma vez de seu casulo (é importante notar o destaque que o autor da às suas saídas), e encontrar-se com mais amigos artistas, com os quais tem diálogos que revelam ser de uma pessoa angustiada (aqui pode haver uma ambigüidade, outros diriam sossegado) que pensa o fim como próximo, e por isso aproveita cada instante da vida. Os amigos seguem em uma viagem onde acontecerão vários casos curiosos, inclusive um delírio provocado possivelmente pelo excesso de bebida alcoólica, narrado com riqueza de detalhes.
O conto se estende por mais encontros com amigos, focando sempre o mesmo assunto, o FIM, onde Klingsor revela certo desapego pela matéria. Então ele decide escrever mais uma carta ao seu amigo Luigi, que nos dará possíveis pistas sobre sua morte. Da carta ao desespero, denuncia-se um fim bastante intrigante.
http://quaseisto.blogspot.com/2012/02/resenha-o-ultimo-verao-de-klingsor.html