belaffig 29/06/2021"Every story needs its villain. And its hero. And its monster."Certo, vamos lá. Isso vai ser complicado.
Definitivamente o livro com o qual eu tinha maiores expectativas - afinal, era a parte derradeira da trilogia, e tinha uma reputação gigante a manter e um final a construir - as primeiras quatrocentas páginas de "Obsidio" me deixaram estupefata. Inicialmente, lendo a sinopse, fiquei surpresa de encontrar mais dois novos protagonistas sendo introduzidos, e fiquei preocupada me perguntando se não seria demais, se a história não ficaria "estufada" com informações demais tentando lidar com o desenvolvimento de novos indivíduos dentro da história e, ao mesmo tempo, com seu desfecho. Novamente, meus receios foram rechaçados. Asha e Rhys foram muito bem apresentados e utilizados; e foi muito bom conhecê-los.
E seguindo para o ponto mais forte do livro, o que me deixou tão surpresa e orgulhosa de Kaufman e Kristoff: não, o livro não ficou inchado de informações, ou confuso, com esses personagens ou com a história apresentada por eles. Muito pelo contrário, a escrita e a apresentação da trama aqui atinge um patamar impressionante. Foi magnífico ver, desde o início, como as páginas foram tão bem utilizadas, como as palavras eram as mesmas mas a construção pelos autores evoluiu desde os dois últimos livros, pegando tudo de melhor deles e criando uma história madura, tensa, com cara e peso de desfecho. E melhor: a história entre os dois pontos principais foi contada de modo entrelaçado, em uma linha do tempo bem feita, não exatamente linear, que te faz trabalhar para colocar as coisas em ordem e ler tudo atentamente, e de modo encantador com o cuidado dos seus criadores.
E como dito anteriormente, o livro tem cara de desfecho. As páginas eram tão pesadas que eu nem consegui maratonar, sendo esse o livro que mais demorei para ler dos três. Foi incrível o quão bem abordaram as complexidades e atrocidades da guerra, questionando todos os dilemas éticos levantados durante a trilogia, percebendo como nem tudo é “preto no branco”, como uma das personagens diz, como “todo mundo está certo, e todo mundo está errado”, como diz um outro; como tudo é muito mais complicado, sutil e cruel do que isso e como você sente o peso das escolhas e não-escolhas em cada página. E a cadência das páginas foi perfeita, diferentemente das duas outras tramas que explodem tão cedo em acontecimentos, essa leva seu tempo para construir seu clímax para as páginas finais.
E então as páginas finais chegaram. O momento da batalha final. Percebi, certo dia, o quanto estava enrolando para chegar a isso, porque simplesmente não queria chegar ao fim; porque tudo iria terminar, sim, mas também pela expectativa criada. Eu estava esperando muito desse momento e quando ele chegou... bem, ele nem chegou, essa é a questão.
É difícil explicar bem o que eu senti sem antes explicar algo crucial que eu percebi ao chegar perto do fim do livro, então vou tentar. É paradoxal, mas aquela estratégia de contar a história nos levando ao futuro no início e fim de cada livro funcionou perfeitamente bem para "Illuminae" e até que bem para "Gemina", mas estava destinado a minar qualquer chance de emoção real que o final de "Obsidio" poderia ter.
[esse parágrafo contém alguns spoilers raivosos, rs] Porque veja, esses livros são tão bons pois fazem a gente pensar, eles te “criam” para não cair em armadilhas fáceis, para criar estratégias em sua cabeça e ler as coisas atentamente, então chegar no final do livro que eu esperava ter a melhor construção (e que estava me dando isso até então), esperando um embate final cruel, duro e avassalador, e receber o “fake death trope" DE NOVO foi frustrante (sério, usar em "Illuminae" uma vez, tudo bem; usar em "Gemina" mais uma vez eu deixo passar, mas usar aqui uma terceira?!, sinceramente...), não ter nenhuma "major character death" foi frustrante (longe de mim reclamar de ter os meus sete queridos personagens vivos no final mas isso é simplesmente irreal) e aquela informação bombástica da Frobisher ser mãe do Ezra nem ser utilizada direito (um diálogo no final entre os dois de o quê, cinco linhas, sério?)... Enfim, o que quero dizer é que essa técnica de contar o futuro vence rápido, porque ir juntando dois com dois, percebendo quem está vivo no final e como isso vai acabar perde parte da mágica de simplesmente não saber. E aí parece que o livro parou de tentar te surpreender e simplesmente começou a te subestimar perto do fim. O que honestamente me parece uma ofensa para uma obra tão bem feita assim. [fim dos spoilers]
E acaba que a grande guerra que eu estava esperando foi só uma batalha cujo desfecho já era possível prever porque o fim de tudo já estava estampado há tempos. O embate acaba rápido, de modo previsível para quem aprendeu uma lição ou duas com os livros anteriores (e que achava que, como dito antes, os autores também tinham aprendido e crescido com), e o desfecho que é desfecho mesmo, que é contado para a gente desde o começo, a gente já sabe como termina. "Obsidio" construiu uma atmosfera pavorosamente absurda e real e acabou que a execução final foi... morna. O clímax nunca chegou. Porque não tinha outra forma de ser. O livro caiu em uma armadilha criada por si próprio. Na realidade, a trilogia desde seu começo foi marcada para não terminar em grandes ações, e eu só percebi isso tarde demais - o que foi bom, porque me emocionei e surpreendi mais com os livros; mas também ruim, por que como me sentir com um livro que começou tão bom mas desperdiçou o maior potencial da trilogia com uma armadilha que não sei se foi proposital ou não, me deixando na espera de uma finalização grandiosa, emocionante e arrebatadora?
Escrevi muito, talvez tenha divagado um pouco, mas esse livro me deu muito o que pensar, por eu estar esperando demais, e por essas serem histórias serem tão inovadoras e únicas. Infelizmente, a trilogia tomou um rumo em decadência. Com notas estelares ainda - e apesar de eu ter falado tanto sobre a conclusão um pouco decepcionante desse livro, não consigo dar menos que 4 para ele -, e com um lugar especial no meu coração, mas ainda assim. Não significa que não seja uma das melhores sagas e mais criativamente criadas que eu tenha conhecido, mas o gostinho amargo que o potencial perdido que Obsidio deixou não vai sair da minha boca tão cedo. "Illuminae" continua sendo meu favorito de todos, e percebi meu carinho por "Gemina" surpreendentemente crescendo, mas "Obsidio", que por um momento achei que pegaria o primeiro lugar no meu coração, termina em último. No mais, vou sentir saudade desses personagens que ficaram comigo por tanto tempo e dessa história que, de uma forma ou de outra, me marcou. Não vou conhecer outra assim tão cedo!