Tamirez | @resenhandosonhos 12/08/2016Exorcismo - Thomas B. AllenEm 1971, William Peter Blatty lançou O Exorcista e viu seu romance se tornar um grande sucesso, ganhando um filme logo na sequência. O livro que seria baseado em uma situação real conta a história de uma menina que foi possuída e depois exorcizada por um padre católico. Duas décadas depois Thomas B. Allen lança Exorcismo, a história real que inspirou a obra de Blatty, levando em consideração os diários a pouco tempo descobertos, e que retratam mais detalhadamente a jornada do membro da igreja responsável pelo ritual.
“Um exorcista tem que tocar o mal, respira-lo, se concentrar nele. Um padre se vê como um ser vivo trabalhando ao lado de Deus. Para agir contra o diabo, um exorcista penetra nas sombras profundas e tateantes do mal. Quando ele aparece, os demônios focam o mal nele.”
Segundo o que é contado por Allen, em 1949 um menino de 13/14 anos, Robert Mannhein (nome fictício), começou a apresentar um comportamento estranho, tendo traços de sua personalidade mudados drasticamente, além de eventos inexplicáveis acontecendo na casa da família. Objetos desapareciam e se moviam, luzes piscavam e o menino apresentava lesões no corpo, além de atitudes estranhas sempre que era posto para dormir. Tudo isso começa a se manifestar algum tempo depois da morte da tia de Robert, que gostava de brincar com tabuas ouija e ensinava o garoto. A família, que era dividida entre luteranos e católicos procura primeiro um cuidado médico e não encontra explicações plausíveis para o que está acontecendo, buscando então no âmbito religioso ajuda para combater o mal que caiu sobre a família.
É quando eles vão para outra cidade, algumas semanas depois a pedido do garoto, para ficar na casa de outra tia, que ele entrará em contato pela primeira vez com o padre Baudern, e um estudo mais aprofundado e religioso sobre o que está acontecendo começa. Se atentando para os “sintomas” do que seria uma possessão, o padre acaba por acreditar realmente que há algo de errado com o menino e pede autorização para realizar um exorcismo. É ai que começa a rotina em que, noite após noite, Baudern visita a casa da família para realizar a cerimônia.
ORDEM CRONOLÓGICA DOS FATOS
1949 – O padre William S. Baudern realiza exorcismo em um garoto
1968 – William Peter Blatty escreve ao padre pedindo informações sobre o que aconteceu, mas recebe negativa em resposta. Os diários ainda era privados e o padre não tinha permissão da igreja para falar sobre o assunto.
1971- Blatty lança O Exorcista, uma novelização da história vivida em 1949, baseada nos poucos relatos que conseguiu e nas notícias que saíram na imprensa.
1973 – O filme O Exorcista é lançado e bomba nos cinemas
1993 – Thomas B. Allen lança Exorcismo, contando a história real por trás do que aconteceu, incluindo o diário do padre na íntegra.
MINHA OPINIÃO
A primeira coisa que se pensa a olhar pra um livro desses, seja pela capa, edição ou título é que será uma história que causará medo. Mas não se engane, o tom que autor usa para conduzir a narrativa é quase jornalístico, como se estivéssemos lendo um documentário. Somente as primeiras cenas causam algum desconforto no leitor e mesmo assim não servem para o livro ser considerado amedrontador. Portanto, se você não gosta de livros de terror porque sente medo, acho que Exorcismo pode ser uma boa pedida pra você começar a tentar driblar essa situação.
Tirando isso da frente, acho que o tópico seguinte é a credulidade do relato. Pra mim algumas coisas soaram bastante falsas e isso não ajudou com que eu tomasse isso como uma história real. O primeiro fator é que o menino passa uns quatro meses possuído e, só manifesta os problemas a noite, sendo de dia um menino completamente normal e os pais o tratando como se nada estivesse acontecendo.
É difícil questionar esse tipo de coisa, assim como as muitas decisões estranhas que a família toma (como se mudar de cidade porque a entidade pediu), porque são tempos diferentes. Estamos falando dos anos 40 e de um enorme conflito religioso, já que temos uma família dividida entre as próprias crenças.
“A família de protestantes e católicos se reuniu para decidir o que fazer em seguida. Entre os parentes havia também aqueles que seguiam o espiritualismo de tia Harriet e aqueles que acreditavam em parapsicologia. Eles insistiam que outras alternativas além do exorcismo fossem experimentadas.”
Mesmo assim, todo o contexto de demora, dos múltiplos exorcismos até a história se resolver, da forma como a família trata aquilo de forma corriqueira e até da falta de “personalidade” desse demônio, não me convenceu. Mas, somado a isso temos o fator de repetição. A história se repete em idas e vindas e explicações complementares. Tudo podendo ser evitado, por exemplo, se você ler diretamente o diário na íntegra contido no fim do livro.
Parece que o autor precisava encher páginas para ter um livro e acabou colocando coisas desnecessárias e tendo situações muito repetitivas, o que cansa e entedia o leitor. Pra mim, algo que solucionaria isso seria o livro ser apresentando como um diário comentado, ao invés de termos Allen reescrevendo tudo o que já é mostrado no diário. Podíamos ter o diário e na sequencia as anotações ou conclusões do autor sobre o que tinha sido contado ali, com complementos exploratórios aos textos mais diretos do padre.
É claro que não teríamos o antes e talvez o começo da história, mas nada que não pudesse ser resolvido com um prefácio ou uma pequena introdução.
“Um jornal noticiou que quando o garoto esteve na cidade não identificada do Meio-Oeste, três exorcismos foram realizados, um por um pastor luterano, outro por um padre episcopal e um terceiro por um padre católico romando. (Não há registros de um exorcismo episcopal e não existe ritual luterano de exorcismo.)”
Exorcismo foi a leitura do mês de junho do Vórtice Fantástico POA e posso dizer que rendeu várias discussões. As vertentes religiosas, a forma como os médicos e psicólogos lidaram com a situação, a postura da família, dos padres e, claro, dos padres que se envolveram no processo.
Não há bem como comparar as duas obras. Allen escreve um relato documental com o anexo de informações, enquanto Blatty transformou os fragmentos de sua investigação em um romance, trocando inclusive o sexo do personagem principal para causar mais empatia com o público. Como eu ainda não li O Exorcista, não posso traçar muito mais paralelos aqui, mas pelo filme dá pra notar que “a possuída” do livro e filme sofreu muito mais do que o garoto em termos de mudanças corporais ou até mesmo de personalidade. Acho que a forma como o livro é escrito, mais seu conteúdo em geral, não colaborou para que eu tivesse uma experiência plena e satisfatória.
É inegável dizer, porém, que a edição desse livro não está muito bonita. Há todo um cuidado com todos os detalhes, como já é um padrão da editora Darkside. A tábua ouija que está na folha de guarda tem tudo a ver com a história e ajuda a dar aquele toque mais sombrio pro livro. E, quem compra o livro lacrado ainda leva o marcador em forma de ponteiro, para poder ter suas próprias experiências de conversa com o outro lado (se assim desejar).
O livro é sim interessante e cheio de referências e novas informações sobre como o ritual funciona ou como a igreja se posicionava na época, mas peca em ser repetitivo e seco demais, não aproximando o leitor da trama e, portanto, não causando o devido amedrontamento que deveria vir junto com a história. Me parece que acreditamos em coisas que nos causam pavor ou medo, e isso tira nosso foco do que é crível ou palpável, deixando o leitor e até o espectador mais imerso, evitando tanto questionamento. Acho que é certo dizer que o medo serve como uma fator de credibilidade, mas infelizmente ele não está presente aqui. Mesmo assim, para quem é fã de terror ou curte estudar e saber mais sobre esses rituais ou questões de possessão, que são sempre assuntos delicados,devido a falta de registros reais sobre os acontecimentos, vai encontrar em Exorcismo um acréscimo valioso à sua estante.
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