Betinha 10/01/2018DinâmicoO advogado Michael Haller, conhecido como Mickey, tem seu escritório no banco traseiro de um Lincoln preto, dirigido esporadicamente pelo ex-traficante Earl Briggs.
Alguns dos personagens dessa história foram apresentados pelo autor no livro “Advogado de porta de cadeia”, o que diz muito sobre Mickey, por defender aqueles muitas vezes considerados a escória da sociedade: traficantes, prostitutas, assassinos. Pensei ser esse um ponto passível de dificuldades para criar empatia com o personagem, mas só no início. É difícil não terminar a leitura querendo ler os quatro primeiros livros da série Mickey Haller, que inclui também os títulos “O veredito de chumbo”, “Reviravolta” e “A quinta testemunha”.
Haller carrega uma culpa imensa, que destroçou seu relacionamento familiar e sua reputação: um cliente livrado por ele de uma acusação de beber e dirigir foi responsável pela morte de duas pessoas. Isso acabou com as suas chances de eleição para o Gabinete da Promotoria do Condado de Los Angeles. Atrapalhou também a carreira de sua ex-mulher. Parece ruim o suficiente? Para completar, sua filha conhecia as pessoas assassinadas pelo ex-cliente de seu pai.
"Comecei a sentir que nós nos merecíamos. Não passávamos de casos perdidos, de derrotados, o tipo de gente que nunca recebe um sorriso dos deuses da culpa."
Deuses da Culpa é um dos apelidos dos jurados, por definirem culpados e inocentes.
Nessa obra, acompanhamos o advogado interagindo com esses deuses durante o julgamento de André La Cosse, acusado de matar a prostituta Giselle Dallinger, de quem era o “cafetão digital”. O caso chega a Mickey porque a prostituta fora sua cliente e o recomendara a La Cosse.
"Fiquei sem reação por um momento. Certa vez tive uma cliente – uma prostituta, também – que me chamava assim. Mas fazia muito tempo que eu não a via. Desde que a enfiara em um avião com dinheiro suficiente para recomeçar a vida e nunca mais voltar.
(...)
Sem sombra de dúvida, o caso era meu."
Mickey começa a desenrolar uma trama que envolve corrupção, drogas, prostituição e assassinato. Ao contrário da doutrina jurídica de presunção de inocência, ninguém é inocente até que o livro termine. Não consegui deixar de desconfiar de cada personagem. Meu livro ficou todo marcado com passagem em que eu pensava “ahaaaaá, achei um cúmplice”. Essa habilidade de envolver o leitor é um dos aspectos que mais mexeu comigo durante a leitura. Michael Connelly conseguiu me prender a cada página com as manobras jurídicas, a investigação e as reviravoltas da história.
"Cisco assobiou. Ele fazia isso sempre que uma peça do quebra-cabeça se encaixava no lugar.
- Não encontraram nenhuma intimação no apartamento dela. Eu examinei o inventário – falou."
Não vou revelar muito sobre a história para não comprometer a leitura e nem revelar suas reviravoltas. Cito apenas uma passagem hilária do livro, quando Mickey menciona que, depois de ter sido feito um filme sobre ele (O poder e a lei, com Matthew McConnaughey), vários advogados adotaram o Lincoln como escritório. Em um trecho, Haller entra acidentalmente em outro carro, percebendo o erro ao não reconhecer o motorista.
Recomendo muito a leitura! A escrita de Michael Connelly lembra o dinamismo de Stieg Larsson e de John Grisham.
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