Carol 24/06/2021Impressões da CarolLivro: Khadji-Murát {1912}
Autor: Liev Tolstói {Rússia, 1828-1910}
Tradução: Boris Schnaiderman
Editora: 34
264p.
Em "Khadji-Murát", Tolstói, assim como fez em 'Guerra e Paz', se vale de lugares, fatos e pessoas reais para construir um romance, no qual os limites entre ficção e história são borrados.
Numa das passagens mais bonitas do romance, o narrador - algo como um eu-lírico de Tolstói - compara a flor da bardana, que amassada por uma roda, resiste e se ergue, no afã de vida, à natureza humana e, assim, recorda-se de "uma velha história caucasiana", que presenciou em parte e completou com sua imaginação.
Essa história é a de Khadji-Murát, um naib, espécie de líder tribal e representante militar do separatismo caucasiano no território checheno.
O leitor acompanha Murát no período em que ele corta relações com o imã Chamil, líder muçulmano à frente da Resistência Chechena contra o Império Russo, na Guerra da Cáucaso. Com a família cativa na cidade de Vedeno, fortaleza de Chamil, Murát e alguns guerreiros, leais a ele, aliam-se aos russos em busca de apoio para libertá-la.
Como sabemos Tolstói era um pacifista, crítico ferrenho da guerra e, em "Khadji-Murát", ele denuncia a violência, a dominação de um vasto território habitado por povos e etnias tão díspares entre si, tendo apenas a religião muçulmana a uni-los. Denúncia certeira ao pensarmos que, até hoje, a Chechênia luta por se separar da Rússia, gerando conflitos extremamente violentos e sangrentos.
É magnético ver a maneira pela qual Tolstói constrói a figura de Khadji-Murát, como um nobre, mais culto e justo até mesmo que os russos. Tolstói era um grande leitor de Jean Jacques Rousseau, não tem como não fazer a conexão de Murát e o bom selvagem, anárquico, ligado à terra, resistente.
"Khadji-Murát" é uma novela belíssima, lida para o Clube do Livro Russo, do @litrussa. ?Indico demais e termino com as palavras de Boris Schnaiderman no ensaio maravilhoso que serve de posfácio desta edição: "Multiforme e riquíssima, fascinante sempre, a obra de Tolstói continua a afirmar que uma vida humana é insuficiente para apreciá-la em toda sua profundidade." p.186