Resenhas - O Destino da África

AleixoItalo 13/06/2022

Minha paixão com relação à história (e o mesmo com a biologia) é o movimento. Toda nossa jornada nesse mundo nada mais é que a movimentação das populações, saindo e entrando em rotas de colisão, numa gigantesca partida de xadrez geopolítico. Esse movimento fica explícito nos bons livros de história, o excelente 'O Coração do Mundo', de Peter Frankopan, mostra como essas movimentações levaram em sua esteira, produtos, ideologias e religiões, construindo a Eurásia que temos hoje. Aqui vemos o mesmo processo no continente onde tudo começou, a África!

Em ‘O Destino da África’, de Martin Meredith, o leitor começa sua viagem no mítico Egito antigo e vai destrinchando (como um bom aventureiro) Nilo acima, o desenvolvimento do continente até os dias atuais. A África parece ser muito mais intrincada e complexa do que a Eurásia (Jared Diamond tem lá seus palpites do porquê) e o que vemos são diversas histórias bem distantes umas das outras. Iremos explorar o Norte, o Sul, suas grandes bacias hidrográficas, florestas e desertos em roteiros bem diferentes uns dos outros a medida que a movimentação humana fica a mercê a variação ambiental.

O livro é uma síntese da África, com seus desertos, florestas, savanas, rios colossais, animais ciclópicos, toda uma miríade de culturas e etnias diversas, aventureiros, exploradores, seus heróis e seus déspotas, espremidos nas suas centenas de páginas. Vemos diversas histórias narrando a transformação de cada canto do continente: como os povos nativos foram invadidos por religiões (Cristianismo e Islamismo) e por exércitos estrangeiros, de como as estruturas comerciais eram baseadas em matéria prima e no tráfico de escravos, e por fim finaliza nos movimentos de libertação, que concederam a África uma frouxa liberdade e alguns banhos de sangue adicionais. Na história da humanidade não existem mocinhos e bandidos e isso fica explícito em ‘O Destino da África’, uma vez que todos os seus males, entre eles escravidão e genocídio, foram perpetrados tanto por invasores quanto por líderes nativos, tendo a Europa uma maior parcela de culpa, por destruir fronteiras ancestrais e forçar agentes antagônicos a compartilhar laços artificiais.

É um livro essencial sobre a história do continente, mas vale reforçar que não temos um livro exclusivo sobre os povos africanos, mas sim sobre a colonização. Certa vez eu li um livro curtinho (‘História da África, de José Rivair Macedo) onde se tinha uma ideia de reinos que surgiram e se perderam na África e suas transformações, enquanto na obra de Meredith eles não são mais que coadjuvantes. Esse viés não é de todo proposital e sim uma provável consequência da ausência da língua escrita entre seus povos nativos, dessa forma quase toda a história do continente foi escrita a partir da chegada dos estrangeiros e por estudiosos estrangeiros.

O livro é uma longa e triste viagem por uma das regiões mais fascinantes do planeta Terra e voltando ao primeiro parágrafo me permito aqui uma divagação: é interessante observar que, enquanto a Rota da Seda permitia um intercâmbio cultural multidirecional, na África nós vemos muito mais um movimento opressor de fora para dentro, onde os colonizadores foram implacáveis em botar as mãos nas riquezas do continente, e concentrado em regiões específicas do continente, efeito que Jared Diamond explica bem em outro clássico sobre as eternas andanças do homem...

Lucas Leite 14/04/2021

Bom, mas ainda muito amplo
É compreensível o desafio de condensar toda a história do continente africano em apenas um livro, e por isso deve-se reconhecer os méritos. Ainda assim, cabe apontar para uma escolha não justificada pela ênfase em alguns países ou regiões, notadamente os colonizados pelo Reino Unido. Esta questão mais o fato de ser uma interpretação claramente liberal da história tiram alguns pontos do texto.