Natália Tomazeli
28/04/2019"Existem muitas formas de estar sozinha. Sei que isso é verdade.""Éramos milagrosas.
Éramos criaturas da praia.
Tínhamos tesouros nos bolsos e uma à outra na pele."
"Se quem éramos no passado tivesse um vislumbre de nós agora, o que achariam?"
Quando eu leio um livro que mexe muito comigo, é sempre difícil de escrever alguma coisa aqui, porque é complexo expressar toda a mistura de sentimentos que ocorreu durante a leitura.
Eu tenho um carinho enorme por livros Young Adult LGBT, me sinto muito acolhida e "no meu mundo", me divirto com as histórias e tudo o mais, porque rola muito mais aquela identificação, tanto que desde que conheci esse subgênero, meio que nunca mais consegui gostar tanto assim dos YA "comuns" e nem ter aquela animação para ler, porque vou ser sincera, perdeu um pouco o encanto rsrsrs
Quando procuro ler esses livros, é para espairecer a cabeça e me sentir mais confortável (principalmente depois que eu saio de leituras pesadas e brutais demais), aquele famoso "não quero pensar muito, só vou ler um livro para distrair".
Desde que eu comecei a me aventurar nesse tipo de livro, meio que nunca tinha lido um que tivesse uma protagonista realmente lésbica, com vivências desse mundo e tudo o mais. E realmente notei que esses casos são minorias no gênero, não que não exista, mas é que comparado com o resto da sigla, parecem estar em menor número. Enfim, né, no fundo eu sei que isso acontece por um reflexo do que já é vivido socialmente pelas mulheres homossexuais, nada novo, infelizmente. E é claro que eu fiquei super feliz com a representação, mas podia ter sido uma história ruim, né? Mas definitivamente aqui não é o caso!
Eu gosto da questão desse livro não girar em torno da orientação sexual da Marin, a protagonista, porque me identifiquei tanto com ela. A história na verdade acontece e ser lésbica é só uma característica dela. Isso tanto deu campo para que a autora (que escreve muito bem, por sinal) desenvolvesse a história sobre outros assuntos, tanto quanto ficou mais condizente com a realidade. Aqui na verdade encontra-se uma história sobre uma garota tentando se curar e restabelecer das dores e sofrimento causados pela depressão. Fora também as várias referências a coisas que eu amo, como Frida Kahlo, por exemplo. Aqui também, a autora fala muito de livros, porque a própria Marin tem uma ligação forte com eles:
"Eu tinha afastado a dor. E a encontrava nos livros. Chorava pela ficção em vez de chorar pela realidade. A verdade era irrestrita, sem enfeites. Não havia linguagem poética nela, nem borboletas amarelas, nem inundações épicas. Não havia uma cidade presa embaixo d'água nem gerações de homens com o mesmo nome, destinados a repetir os mesmos erros. A verdade era ampla o bastante para se afogar nela."
Por mais que a sociedade em geral explane a ideia de que ser integrante do grupo LGBT seja o que define a pessoa por inteiro, na vida real, essa é só mais uma característica das mil que um ser humano pode ter. Essa pessoa não vive isso 24h por dia, assim como os heterossexuais também não. E eu gosto que essa ideia seja levada para frente. Pessoas homossexuais sofrem? Sofrem! Tem questões com isso por muito tempo? Tem! Mas isso é só um espectro da vida, oras. Fora que elas possuem outros problemas e coisas para resolver. E acho que quanto mais for espalhada essa ideia, mais "normal" e menos "clandestino" a homossexualidade se torna.
E pior que eu entendo as pessoas que não gostaram do livro por acharem que tem "pouca representatividade". Só mostra o quanto o mundo literário tá extremamente carente de histórias (boas, de preferência) sobre as mulheres que amam mulheres, coisa que eu particularmente acho que as obras audiovisuais já estão trazendo com mais frequência e ainda por cima com qualidade. Eu consigo tranquilamente pensar aqui em 10 filmes com protagonistas lésbicas... Mas não consigo pensar em 10 livros, por exemplo (acho que nem 5, para falar a verdade). Quis deixar aqui essa minha reflexão e esse meu "protesto" porque eu acho que é necessário quebrar esse teto de vidro e falar sobre isso. Os livros precisam URGENTE chegar nesse público também, e espero que no futuro eu possa estar falando que isso aconteceu finalmente e que é uma realidade sim!
"Não há como trazer nada de volta. A confiança. As risadas fáceis. A sensação de ter saído de casa por pouco tempo. De ter casa para onde voltar.
Éramos inocentes o bastante para achar que nossas vidas eram o que achávamos que eram, que se juntássemos todos os fatos sobre nós eles formariam uma imagem que faria sentido, que se parecia conosco quando olhávamos no espelho, que parecia nossas salas, nossas cozinhas e as pessoas que nos criaram, em vez de revelar todas as coisas que não sabíamos."