Maria - Blog Pétalas de Liberdade 01/04/2019Resenha para o blog Pétalas de Liberdade"O ressurgir dos eternos titãs" é um livro de fantasia, cuja história se passa numa região composta por duas porções maiores de terra, chamadas de Os Gêmeos Indomáveis, e algumas ilhas. Esse território foi criado pelos deuses, e, além dos humanos, os Titãs (filhos de deuses) também foram habitá-lo. Mas, muito tempo atrás, houve conflitos entre os deuses, os titãs e os humanos por poder, e, como punição, muitos titãs foram enclausurados, aprisionados dentro de corpos humanos.
"Há muitos séculos atrás, aqueles mágicos continentes tinham sido habitados por titãs. Seres que apesar de viverem sob um corpo humano, adoptavam muitas vezes suas verdadeiras formas. Dragões, Salamandras, Fénix, Serpentes, Lobos, Corvos, Piranhas e muitos outros, todos eles de tamanhos colossais e características e qualidades sobrenaturais. Criaturas que, quando enfurecidas, destruíam tudo à sua passagem." (página 73)
As 100 primeiras páginas do livro são uma introdução, descrevendo o clima e a cultura de cada parte dos Gêmeos Indomáveis e das ilhas, com seus muitos reinos e impérios (inclusive temos povos que vivem no subterrâneo).
Nos próximos 9 capítulos e no epílogo, a história principal se desenvolve. Na família Von Rimer, onde foram enclausurados titãs dragões, Vládimïr e Helena tiveram gêmeos: Maximiliano e Yágoh. Havia uma profecia que dizia que um dos dois seria um demônio (nada a ver com Diabo), enquanto o outro carregaria o sangue dragão. Não bastasse a aparência exótica de Maximiliano, com seus olhos estranhos, quando ele era um garoto, devorou a irmã mais nova, uma bebê. O pai tentou matá-lo naquele dia, matar o demônio, mas acabou mandando-o para lugar onde foi condenado a trabalhos forçados. Maximiliano só saiu de lá muito tempo depois, ao ter uma filha, e foi morar nas terras geladas do norte com o avô, Bóris, que rompeu relações com o filho Vládimïr.
"Mal a porta do cómodo da filha se fechou num estrondo, Maximiliano abriu os braços e deslizou as pontas dos seu dedos maltratados pelas pareces daqueles corredores sombrios. À medida que caminhava, ia sentindo as texturas daquela velha pedra, ia se deliciando com a frieza daquele esqueleto que se fundia nas entranhas da enorme montanha. Mas então, os seus dedos de carne deram lugar a longas e afiadas garras negras que, em vez de apreciarem aquele material milenar, começaram a rasgá-lo como se fosse papel." (página 148)
Maximiliano passou a ser conhecido como Demônio do Norte, e sua fama de cruel foi se espalhando pelos outros reinos. Mas nem tudo o que se dizia sobre ele era verdade. Maximiliano tinha um amigo, Daereque Salamandra, o sumo imperador que controlava boa parte dos Gêmeos, e que, sempre que podia, tentava prejudicar Vládimïr com a intenção de vingar Maximiliano.
Conheceremos também os irmãos Gabriela e Christyen Mönttbráncc. Eles eram príncipes nas Ilhas Sálvicas, mas fugiram do tio que queria casar com a própria sobrinha. Foram viver nas terras geladas de forma muito simples, passando diversas necessidades, mas ao menos estavam vivos.
"Gabriela perdeu o olhar no vazio e abstraiu-se da realidade, deixou-se embalar pelos sons da natureza. E no silêncio e solidão da sua mente, perguntou-se se quando ela ou Christyen morressem, o vento pararia de soprar e a neve mudaria a sua forma de cair. Perguntou-se se a vida deles faria alguma diferença naquele mundo tão grande que às vezes parecia querer esmagar tudo e todos." (página 161)
O fato é que os Gêmeos Indomáveis e as Ilhas eram um território cheio de conflitos, que com a rivalidade entre os Von Rimer, as interferências de Daereque, e a presença dos príncipes desertores que ainda eram caçados pelas Ilhas Sálvicas, uma guerra ia estourar, destruindo alianças antigas e criando novas e inesperadas.
Quando recebi "O ressurgir dos eternos titãs" da R. C. Vicente, não sabia bem o que esperar da história. Ele é um livro grande, com 600 páginas e uma diagramação que não desperdiça papel. Foi minha leitura durante todo o mês de fevereiro (um mês atribulado onde tive pouco tempo pra ler, e por isso demorei tanto, mas se estivesse num ritmo normal de leitura, acredito que teria lido o livro nuns dez dias). Nas primeiras 100 páginas, achei interessante todo o universo que a autora criou, mas foi só quando a história começou de fato, é que a leitura fluiu mais. Como a autora é portuguesa, o livro está em português de Portugal, o que não atrapalha a leitura, já que a maioria dos livros de fantasia tem mesmo uma linguagem com palavras diferentes.
A R. C. Vicente tem vinte e poucos anos, é mais nova que eu, talvez alguns leitores se surpreendam com a história grandiosa que encontrarão em "O ressurgir dos eternos titãs". Tem muitas cenas de conflito, mortes cruéis e muito sangue. Mas também há um romance importante na trama (uns dez por cento do livro deve ser de romance). A R. C. Vicente acertou na construção desse relacionamento. Temos inúmeras histórias de romances onde o personagem masculino é poderoso,tem um lado sombrio e dominador, e acaba oprimindo a mocinha, não é o que acontece em "O ressurgir dos eternos titãs"! O trecho abaixo exemplifica bem isso:
"- Naquele momento, transformaste os meus piores defeitos em virtudes, mesmo não querendo. E dali em diante segui os pedaços de luz nas tuas sombras (...) Mas, mas do que isso, não houve um único instante em que me sentisse como um verme debaixo dos teus pés. E é difícil não sentir isso. Até o meu irmão, por muito que ele me amasse e eu o amasse, às vezes, fazia-me sentir dessa maneira, com todas as suas reprimendas e exigências. Cobrando-me a compostura e o recato que ele mesmo não tinha - continuou, incapaz de desviar o olhar do dele. Amando-o em cada palavra proferida. - Nunca me senti tão livre como me sinto ao teu lado... nem tão presa como quando estás longe." (página 440)
Acho que é impossível ver a premissa de "O ressurgir dos eternos titãs" sem lembrar um pouquinho de A Guerra dos Tronos da série As Crônicas de Gelo e Fogo (da qual só li o primeiro livro), nas duas tramas há dragões, conflitos entre famílias e reinos e muito sangue. Mas a condução das histórias totalmente diferente: além de toda a questão dos titãs, a R. C. Vicente não mata personagens importantes do nada. E gostei muito mais de "O ressurgir dos eternos titãs" do que de "A Guerra dos Tronos", nos personagens, no enredo, na descrição dos cenários e das batalhas...
A autora faz com que a gente conheça os personagens, entenda o lado deles, seu ponto de vista. A maioria dos personagens mostra o seu lado bom em algum momento (ou seu lado mau), menos o tio da Gabriela, esse não tinha nada que salvasse. E aí a gente vê como os objetivos de cada um entram em conflito com os objetivos dos outros. Acho que o Vládimïr Von Rimer (o que tentou matar o filho demônio que devorou a irmãzinha) é um dos personagens que tem mais facetas. Mas ao longo da história, a autora também surpreende a gente, ao mostrar a verdadeira face de alguns personagens. Por exemplo, nunca ia imaginar a explicação por trás das diferenças entre o Maximiliano e Yágoh!
Outra coisa que gostei muito, foi da diversidade que há na trama. A gente tem personagens de todos os tons de pele, e nenhum povo é inferior ou pior por causa da aparência. Há muitas personagens femininas fortes, muitas guerreiras que não deixam de ser mulheres por guerrear, temos muitas líderes, e dava um orgulho enorme ler sobre essas personagens. Uma que gostei especialmente foi a Rainha Ceifeira, a dona Dona Theodósia Stelisbuz , ela é maravilhosa!
O final fecha um ciclo, resolve a questão principal, mas me deixou curiosíssima para o próximo volume, pois algumas revelações foram feitas ao longo da trama, e eu não me conformo com uma coisa que aconteceu, mas uma outra profecia me faz acreditar que um determinado personagem ainda vai ter um final feliz.
Apesar da falta de orelhas na capa, eu gostei da edição da Chiado. A capa traz a imagem de um dragão, e a cor combina totalmente com uma cena da história. As páginas são amareladas. Se tem erros de revisão, eu não percebi. A diagramação tem letras, margens e espaçamento, além de detalhes no início de cada capítulo, um mapa, o brasão e a árvore genealógica das famílias principais.
Enfim, "O ressurgir dos eternos titãs" foi um livro que me surpreendeu e que gostei e recomendo muito, mas reforço que ele tem algumas cenas pesadas e é um livro grande. A história é interessante, daquelas que prende a gente, fechamos o livro mas continuamos pensando nos personagens, que foram muito bem construídos, com o seu lado bom e mau. Por mais que eu fale, talvez não consiga transmitir todo o meu encantamento com esse obra maravilhosa... Leiam, esse livro merece ser conhecido por mais pessoas.
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