Se o passado não tivesse asas

Se o passado não tivesse asas Pepetela




Resenhas - Se O Passado Não Tivesse Asas


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Bru 28/01/2023

"Porque para sobreviver é preciso enfrentar nossas fragilidades e maiores contradicoes"

A maneira com que Pepetela intercala o passado e presente é genial.

Himba e Kassule, dois irmãos unidos pelo destino duro da guerra e fome, foram lutadores e enfrentaram as mais diversas dificuldades, morando na rua e depois em um abrigo.
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Val Alves 09/12/2021

É preciso lutar com as armas que se tem
Himba e Kassule já entraram para a lista dos meus personagens favoritos! (e nesse quesito eu tive sorte esse ano, pois eles foram vários). Ambos são crianças que se conheceram durante a guerra civil em Angola nos anos 90 e que acabaram indo morar nas ruas de Luanda após perderem todos familiares nesses conflitos.

Na rua sofrem violência, passam fome e sentem o medo a cada esquina. Um vínculo forte se desenvolve entre eles e se torna um indestrutível laço fraterno.  

Concomitantemente, nos é contada a história de Sofia, uma jovem muito talentosa que vai trabalhar em um restaurante e que rapidamente ganha a confiança da proprietária ao mostrar-se habilidosa lhe ajudando a aumentar os lucros da casa. O cenário aqui é bem mais animador. Entretanto, esse é outro período: o pós-guerra, onde não há mais o risco de ser obrigado a viver na rua -e tentar ao menos para chegar à vida adulta - após perder todos parentes num conflito armado. Mas isso não significa que não existam riscos...

Himba e Sofia são corajosas e enfrentam, todos os dias, os perigos e desafios aos quais são sujeitas. Muito cedo elas descobrem que cada um se defende com as armas que possui.

                                   ***

A saga de Himba, Kassule e das outras crianças que conhece na rua, em vários momentos, me fez lembrar dos meninos negligenciados de Os Capitães da Areia, o que deixou a experiência da leitura ainda mais interessante. Espero poder, em breve, ler outros livros de Pepetela. E ele também deve receber o título de favorito.
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Marcelo 22/09/2021

Herois existem, de fato?
Ao final do ano de 1975, Angola finalmente alcançou sua independência de Portugal. Apesar disso, logo em seguida o país iniciou uma intensa guerra civil entre dois grupos internos com propostas muito divergentes para conduzir sua política interna. O conflito entre o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) e a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) se estendeu de 1975 até o ano de 2002, quando finalmente houve um acordo de paz firmado entre os movimentos. Em linhas gerais, foi um conflito sangrento e que assombrou de forma trágica o país que já vinha fragilizado depois de tantos anos de domínio colonial.

Pepetela teve sua vida moldada por essa guerra civil de Angola pós-independência, tendo vivido no epicentro do conflito durante anos. Assombrado por tudo que viu antes, durante e depois dos eventos, sua obra quase que completa perpassa por temas transversais à guerra civil. Importante pesquisar algumas informações básicas do conflito para compreender melhor este “Se o passado não tivesse asas”. Por mais que o autor faça algumas concessões históricas para situar o leitor no ambiente da trama, isso não é feito em tom palestrante e monocórdico; a intenção aqui é outra.

O livro é narrado a partir de duas perspectivas distintas que, a partir de um determinado momento, irão se cruzar.

A primeira se passa em 1995, nos anos próximos ao fim do conflito, e dá conta da história de Himba, uma garota de 11 anos que é forçada a se separar dos pais em uma emboscada envolvendo uma mina terreste e, com isso, precisa morar nas ruas de Luanda, sobrevivendo de restos de comida de restaurantes e da ajuda de outros jovens que por ali perambulam. Tão logo começa sua vida mundana, Himba se depara com um universo de violência, escassez, mentiras, traição, assédio e muita dor.

A segunda acompanha Sofia no ano de 2012, muitos anos após o acordo de paz da guerra civil e narra sua rotina tentando ascender sua carreira trabalhando em um restaurante da qual se torna sócia. Quando um grupo de jovens ricos filhos de pessoas influentes de Luanda começa a frequentar o estabelecimento, Sofia enxerga a possibilidade que precisava para sua vida encontrar um conforto maior.

“Se o passado não tivesse asas” é uma obra de contrastes. Toda a narrativa é construída a partir do espelhamento das realidades das duas personagens principais. A partir disso, o autor consegue explorar as alterações que Luanda sofreu durante e após o término da guerra civil angolana. Seja descrevendo as mudanças políticas, religiosas, estruturais ou sociais, a cidade passou por um reerguimento que, apesar de bem vindo, deixou muitas sequelas em seus habitantes.

Em uma espécie de “antropologia da cidade”, Pepetela investiga as raízes das tensões urbanas e rurais de Angola para tentar questionar se, de fato, houveram “avanços” no país e, se sim, a que custo. O espaço, aliás, é um elemento muito bem construído no romance. A cidade respira, quase como que dialogando com o leitor. Se considerarmos que há, aqui, um narrador participativo, que constantemente intervém na história, essa hipótese não parece tão absurda.

Para exemplificar como essas contraposições são exploradas, basta notar que Himba é uma criança que, inicialmente amedrontada, inexperiente e insegura, em razão do susto a que foi submetida, aprende a lidar com as situações do cotidiano de forma brusca. Enquanto isso, Sofia é uma mulher de personalidade forte e que, apesar de tudo, jamais cede a ninguém. A partir da bagagem que forja a identidade das duas mulheres, Pepetela conta a história do país e do seu povo.

Se há alguma ressalva a ser feita ao livro, seria às excessivas pausas que o autor dispõe na trama principal para narrar o passado completo de diversos personagens secundários que surgem na história. Não julgo que isso seja errado ou disperso, mas as repetidas vezes que isso acontece impõem quebras de ritmo muito evidentes, já que nem todos essas descrições paralelas são tão interessantes, apesar de ajudarem a dar força às discussões principais do livro.

Com um final lindo, emocionante e surpreendente, “Se o passado não tivesse asas” justifica seu lindo título com uma força arrebatadora.

Força esta que, forjada na pele de suas personagens principais, ainda pode parecer frágil em algum momento aos olhos da história de Angola. Herois existem, de fato?
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mayaraliye 28/01/2021

Pepetela e sua escrita extremamente sensível
"Porque para sobreviver, é preciso enfrentar nossas fragilidades e maiores contradições".
Pepetela conseguiu me surpreender mais uma vez com sua escrita, reunindo nela a sua crítica ao cenário pós-guerra angolano marcado pelas desigualdades sociais, elementos da cultura angolana e sua sensibilidade capaz de nos transportar para os corpos das protagonistas, e fazer-nos sentir parte do sofrimento vivenciado por elas, ambas sobreviventes do contexto da guerra civil. A partir da perspectiva de duas protagonistas que vivenciam períodos diferentes da guerra - uma delas é uma criança de 13 anos que perde sua família no contexto da guerra e tem que sobreviver sozinha nas ruas de Luanda; a outra, uma adulta que se torna sócia de um restaurante que passa a ganhar status social pelas pessoas que as frequentam, da alta burguesia angolana, no contexto do pós guerra - é possível ter um panorama maior do cenário angolano, já introduzido pelo autor em "Mayombe" (e acredito que em "A geração da utopia", mas eu não consegui ler esse livro ainda). Assim, a partir da voz que o autor dá a essas personagens, fictícias porém representando vivências de pessoas reais, é possível perceber a maneira como ambas são sobreviventes do tempo em que vivem, e, assim como o nome ("Se o passado não tivesse asas"), são incapazes de fugirem totalmente das amarras do passado, pois o passado marca o corpo e é impossível de apagá-lo, somente cabendo, pois, tentar ressignificá-lo, e continuar a viver apesar das marcas que ele deixou. Ainda que tenha sido um livro pesado de ler, a escrita do autor traz uma certa delicadeza na forma como narra os acontecimentos, misturados às suas reflexões pessoais, sem, contudo, romantizar o intenso sofrimento das protagonistas. Enfim, a leitura desse livro me foi tão marcante quanto a de "Mayombe" (até então o meu livro favorito do autor e da vida), e me instiga a querer buscar outras leituras do autor, cuja escrita sempre me toca de uma forma singular. O Pepetela é incrível, e seus livros sempre me transformam de alguma forma.
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Eddy Souza 28/04/2020

Renomado escritor angolano, Pepetela surpreende o leitor com essa história tão dramática e ao mesmo tempo bela. Com uma narração em dois tempos (1995 e 2013), o livro conta a vida e as dificuldades/conquistas de duas personagens: Himba, menina refugiada da guerra no Planalto Central e que, ao perder os pais, vive nas ruas de Luanda, ao lado de seu amigo Kassule; e Sofia, uma jovem mulher que luta para conquistar um lugar ao sol, crescer na vida e ganhar, através do trabalho, aquilo que a vida lhe negou, sempre acompanhada de seu irmão Diego. Mas, mais que duas histórias sobre duas mulheres (uma adolescente e uma adulta), o livro é uma análise crítica da sociedade angolana, de suas políticas e da guerra. É um livro emocionante, surpreendente e que deixa o leitor ansioso pelo desfecho e para compreender a ligação entre Himba e Sofia.
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jessyhehe 19/10/2019

:)
Literatura Angolana, o livro simplesmente é profundo, triste, reflexivo e muito bem escrito.
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Adriana Pereira Silva 19/10/2019

Ressignificar nossa história
O escritor angolano Artur Carlos Maurício Pestana dos Santos, conhecido pelo pseudônimo de Pepetela, reflete, em suas obras, sobre a história contemporânea de Angola, e os problemas que a sociedade angolana enfrenta. Suas narrativas neste livro se somam à experiência pessoal do escritor, ex-guerrilheiro do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA).
?Se o passado não tivesse asas? faz um mergulho nas últimas duas décadas de história do país africano Angola (durante a guerra civil e no pós-guerra) e reflete sobre a fragilidade do ser humano e suas mais aterradoras contradições, mostradas através da desigualdade social e violência vividas pelos personagens. Portanto, faz um mergulho nas últimas duas décadas de história do país e, sobretudo, faz o leitor refletir sobre a fragilidade do ser humano e suas mais aterradoras contradições.
Em ?Se o passado não tivesse asas), Pepetela descreve a história de Himba desde seus 13 anos, mostrando sua trajetória, marcada pela solidão e tragédias por se tornar uma menina de rua. E também Sofia, que tenta melhorar de vida em sua vida adulta em tempos de crescimento econômico, mas ainda marcados pela desigualdade social e pela violência.
O autor fez um trabalho primoroso, mostrando todas as angústias, privações e aflições da pequena Himba e seu meio. Nele, onde era uma menina de rua, encontrou amigos eternos, inimigos, pessoas que lhe deixam traumas nunca mais curados e outras que lhe determinam seu futuro em vários aspectos. Além disso, a narrativa das aflições, angústias e esperanças ou falta delas de Sofia diante de seu trabalho e em meio à vida, lutando para melhorar de vida num restaurante que administra e torna-se sócia.
Uma leitura fluida, com tristezas constantes e alegrias raras que nos faz refletir sobre nosso passado, nossa história e os reflexos advindos de tudo isso. Nele estão guardados motivos de sermos o que somos. Guardamos no subconsciente aquilo que passamos, pessoas, coisas ditas e vividas, que influenciam totalmente nossa vida do presente, nossas atitudes e pensamentos em relação a tudo.
Com esta linda obra percebi o quanto temos que nos atentar para o que nos tornamos atualmente, e ressignificar nossa história, muitas vezes.
Em nosso passado estão escondidos muitos segredos dentro de nós, com alegrias e tristezas, angústias, traumas. Devemos entender cada momento passado, cada diálogo, cada pedacinho do que nos deixou marcas, analisar e vermos como nos comportamentos atualmente, fazendo novas conexões do necessário para nos fazer pessoas melhores, não deixando ?crenças limitantes? nos moldarem, nos dominarem. Assim, tornamo-nos pessoas melhores diante do próximo e de nós mesmos.
Também foi rica a reflexão sobre o valor da Gratidão, palavra pequena e atual, mas de imenso significado dentro de nós mesmos, quando somos capazes de entender a grandeza que pode ter dentro de nós.
Gratidão é tudo nesta vida pois, com esse sentimento, damos valor ao próximo, àqueles que estão ao nosso redor, àqueles que vão surgindo em nossa vida e transformando o que somos, ajudando-nos em momentos cruciais, podendo mesmo dar uma virada de 360 graus em nossa vida.
No entanto, temos que nos ater, refletir sempre, para que não deixemos a Gratidão de lado e não sejamos capazes de perceber cada pessoa, cada gesto, cada atitude, cada palavra, cada vida que nos completou, que nos mudou, que nos transformou, que nos livrou, que nos fez pessoas melhores com vidas melhores. E muitas vezes não somos capazes de perceber, e ainda por cima criticamos e vemos o lado negativo de tudo, e não tudo o que nos trouxe e transformou positivamente.
E finalmente, como não devemos nos guardar dentro de nós mesmos, sendo egoístas e nos esquecendo do próximo. Fazer pelo próximo, muitas vezes é determinante e pode mudar um destino e uma vida. As vezes um gesto é capaz de mudar uma vida toda de uma pessoa, é capaz de incentivar, elevar, dar carinho, amor, condições às mais diversas para modificar, transformar.
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Shaqit 06/12/2017

Anjo da memória
Em suas teses sobre a História, Walter Benjamin nos traz a imagem do chamado Anjo da História, capitaneado por uma pintura de Klee. Essa figura, segundo Benjamin, repousaria no que é, afinal, nossa narrativa: escombros. Angola parece dialogar com outro anjo, o do passado. E, como todo anjo, tem asas. E, igual o de Benjamin, repousa sobre escombros.

Pepetela nesse seu mais recente romance nos traz a história de duas personagens, a menina de rua Himba e a jovem empresária Sofia, os reflexos da história da própria nação. Himba vive nas ruas de Luanda dos anos 1990, quando a guerra civil está em uma escalada absurda, guerra que levou sua família e a jogou nessa situação. Trajetória que se repete entre quase todos os personagens desse núcleo.

Sofia vive na Luanda de 2012, dez anos depois do mais recente armistício. Comanda um restaurante frequentado por aquela outra Angola: a dos herdeiros estupidamente ricos que vivem na cidade mais cara do mundo e um dos paises2mais desiguais. Sua vida reflete a rápida transformação de um país ex-socialista em uma república que se vende a todos.

Não é segredo que as literaturas dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOPs) devm muito à literatura brasileira, sobretudo ao romance social de 30. Pepetela aqui dialoga com o clássico Capitães da Areia e com sua própria obra, sobretudo o romance Predadores. Não alcança nenhum, é pena. O voo do anjo do passado e da memória não foi tão alto quanto poderia.
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