Alane.Sthefany 13/03/2022
O Peso do Pássaro Morto - Aline Bei
Por mais curto que esse livro seja, o conteúdo nele é denso e bastante profundo, me emocionei muito nas últimas páginas, por ser uma história de uma mulher, desde os seus 8 anos de idade, até os seus 52.
É bastante melancólico, durante toda a leitura, nós mergulhamos no drama que é a vida dessa mulher, passamos a compreender os seus sentimentos, a ter empatia por ela, ademais, a sentir muita das vezes, o que ela está sentindo e passando, como se fosse na nossa própria pele.
Super Recomendo (Porém, olhem os gatinhos, pode ser uma leitura sensível para alguns)
? Minhas Considerações Finais Sobre o Livro
.
?? Obs: Contém Spoilers ??
.
Tiveram coisas que eu queria muito que a protagonista tivesse contado, principalmente para o filho dela, para quem sabe resgatar (ou começar, já que eles não tinham) a relação mãe e filho.
Entendi o sentimento dela e também do filho, pois de certa forma ele se sentia rejeitado e excluído pela mãe, e que viu na Bete uma figura materna, na qual não tinha em casa, e com a morte da mesma, ele se viu perder o único vislumbre de uma mãe que ele queria ter, e o sentimento de ser amado e aceito, de olhar no fundo dos olhos de alguém e enxergar o orgulho dentro deles (até mesmo por coisas bobas, mas que se tornam significativas aos olhos de quem as vêem - por simplesmente amar a pessoa que as fazem).
E a protagonista, nem preciso falar muito, já que o ponto de vista e a história do livro é sobre a vida da mesma.
Só queria abraçar ela, abraçar o filho dela que em nada teve culpa.
No entanto, infelizmente, a mãe não soube lidar com os próprios sentimentos e traumas, daquela situação tão trágica e infeliz. Não recebeu apoio, muito menos alguém notou, nem nas suas mudanças, no seu humor, nas suas perguntas/dúvidas, nos seus gritos internos, que foram guardados para si, no seu mais profundo ser, todavia, ela foi morrendo aos poucos, marcada pelas suas feridas do passado (que estavam ainda abertas e sangrando), é notório isso, principalmente nessa parte do livro:
"Meu filho
arrumou 1 Estilingue não sei onde.
Da janela do quarto
o Lucas e os amigos
bolaram um plano de matar
passarinhos,
eles gostam de ver brutalmente interrompido
algo delicado que estava em
Movimento.
(...)
Então os meninos desciam
correndo até embaixo do prédio pra caçar
os corpos que nem sempre caíam onde eles calculavam, às vezes
longe, às vezes estranhamente perto já no primeiro degrau,
todos com sangue no meio das penas, sangue pequeno tamanho canário,
uma bolinha
de sangue era tudo o que o pássaro tinha e bastava.
A Bete
ocupada com o almoço pensava que bom o Lucas
fora do quarto pelo menos um pouco.
Depois da colheita
os meninos faziam um grande
Funeral.
Colocavam os pássaros em caixas de bis, completavam os espaços com flores, convidavam pessoas,
não me convidaram.
fiquei sabendo porque 1 mulher no elevador me perguntou se por acaso eu era
a mãe do Lucas,
eu disse que sim franzindo a testa.
ela me contou da matança em tom de ah esses meninos e a mão
na cintura.
Fiquei em silêncio
olhando sem forças pra notícia saída da boca daquela
mulher.
O que eu estava criando,
um monstro?
que enterra
a morte prematura
num evento pra convidados que pensam isso é coisa de
criança?
Isso é tudo, menos coisa de criança.
Isso
é o lugar onde nasce
a dor.
Isso é
tudo o que destrói a possibilidade de um mundo um pouco menos cruel, com os mais fortes abusando dos
mais fracos e o pai do Lucas
dentro dele
e o pai
do Lucas
dentro de
mim.
Perguntei pra Bete se ela sabia.
Ela disse sinceramente que:
? não.
Chamei o Lucas na sala.
Arranquei seu fone
de ouvido, o escudo que ele usava
sempre quando estava
comigo.
Com a cara besta
típica
da idade, ele me perguntou em tom hipócrita:
? que foi?
eu
dei um tapa
mais duro do que eu esperava
na cara
do menino que não voltou a me olhar nos
olhos,
A Bete
de mão na boca.
[...] às vezes
eu penso que o Lucas nunca esqueceu
aquele tapa,
ficou a marca no rosto dele
por dias e o que já era
longe em nós, ficou ainda mais
inalcançável.
[...]
Essa parte pode ser talvez o (provável) motivo do nome do livro O Peso do Pássaro Morto, mas também o nome, possa estar associado a própria protagonista e o seu "eu" da infância que foi roubado na morte da sua melhor amiga, no bullying da escola, na rejeição de um possível amor, no abuso que sofreu ... ??
[Continuação das minhas considerações ...]
Eu chorei no final, porque estava querendo que o filho soubesse o que estava por trás das atitudes (que era de fato erradas) da sua mãe para com ele, mesmo que fosse através da carta que foi escrita a tantos anos, que apenas tinha morrido anos atrás picotada no lixo que virou reciclado de leite.
E quando ele recebeu a notícia, da morte tão solitária da mãe, em uma casa rodeada pelo mato; magra, com fome; com roupas sujas, toda cagada, por não sentir ânimo de levantar e ir ao banheiro; morrer ao próprio vômito e adormecer, para nunca mais acordar; com a alucinação da vida que foi deixada para trás, onde sonhava de novo com a chegada
pra ver o Vento (seu cachorro) morto, só que dessa vez ele não estava morto,
o portão, não estava aberto, no sonho
o Vento estava em casa esperando e isso a deixou tão feliz que ela não acordou; com o sonho de ter de volta a única companhia que ela tinha, seu companheiro que ela sentiu familiaridade, lembro-me do encontro dos dois:
Num canto perto da loja de conveniência,
um imenso cão preto
ficou me olhando, cheguei a pensar que era um porco.
Ele tinha nos olhos
as chagas do abandono, além de rombos
por todo o corpo, uns mais frescos
que outros.
Apesar disso, era um cão calado na dor que sentia e não
tão
triste para além da dor que tinha.
O frentista mal me olhou
quando eu disse saindo do carro:
? enche o tanque.
Já com o cão
eu fiz um longo
contato visual. Nada em mim parecia o assustar, nem nele.
nem os machucados, a careca, o tamanho de
urso,
eu tinha um lanche
no banco do carro, pra depois.
Enquanto o sujeito me abastecia,
abri o papel alumínio.
Ofereci pro cão
que veio com calma
parecendo um velho
cavalo
à passeio.
(...)
O Cão
contrariando as minhas expectativas,
começou a comer o lanche com jeito de criança que tinha crescido demais.
Senti o focinho me encostando a palma, a língua rápida e fina no movimento de
fome, a cabeça musculosa maior que a minha, o canino
uma lança que não me encostou.
Ele comeu com pressa, não aquela pressa de quem não sabe desfrutar das
minibelezas e sim a de quem sente
a dor mais
urgente e ao acaso encontrou
uma cura possível."
" (...) deitou (o cão) esparramado
do meu lado
com cara de quem sabia alguma coisa importante
mas
não conseguia me contar porque
a coisa
não era do tipo das que cabem em palavras."
[...]
E chorei pelo fato do filho ir visitá-la depois de tantos anos, em um cemitério, para ver a mãe que não estava lá, era pedra com data
de nascimento e morte,
além da frase "a cura
não existe" (de sua última redação quando criança, ao expressa seus sentimentos ao se dá conta do significado da morte - da sua melhor amiga , Carla) escrita como epitáfio que
cobria o buraco
guardador de
caixão.
Essas últimas palavras acabaram comigo:
"Parecia mentira que a sua Mãe pra sempre
não estava mais
viva.
Quando um homem chegou
de buquê.
Disse bom dia,
o lucas respondeu
? bom dia.
E ficou com vontade de perguntar
quem era"
[...]
Sei que acabou com um final em aberto, mas no fundo, quero muito que esse homem seja o Pedro, pai do Lucas, e que ao saber da morte da protagonista (depois de viver uma vida cheia de arrependimento e remorso), foi ao cemitério em busca da sua redenção, e para pedir perdão pela vida que ele tirou, dos sonhos que ele roubou, de uma pobre jovem, e que o Lucas pergunte quem ele era, por está intrigado de sua mãe receber uma visita tão inesperada, de um homem, ainda mais com flores, e que ele conte ao Lucas, toda a história, como se quisesse jogar tudo para fora, aquilo que ele tanto guardou para si, dentro dele, ao mesmo tempo, que com o passar dos anos, só o corroeu, o destruiu pouco a pouco, entretanto, que enfim queria se libertar, desse peso que carregou sobre os ombros, o peso da culpa, do seus erros, do seu crime.
E que ao ouvir, o filho enfim, compreendesse sua mãe, e a admirasse por não ter desistido dele, por ter dado a oportunidade dele ter uma vida, mesmo diante de tudo o que ela passou, e tentou revelar ao filho.
"Eu nunca
vou conseguir contar, no fundo
não devo querer.
Ainda assim,
nada
justifica a minha ausência, se decidi ter o filho, então
eu devia ter vivido a minha decisão plenamente ao invés de ficar procurando os
restos
do Pedro
nos olhos do Lucas, restos da noite que eu não fui comer pizza e que eu devia
tanto
ter ido comer
a Pizza, restos do sonho de ser aeromoça
puxar mala
pelos aeroportos
e servir café pra quem voa comigo, servir um lanche, viajar o mundo, conhecer
hotéis, fazer uma lista das ruas mais bonitas e depois mudar
a lista inteira
usar
todo dia a mesma roupa, explicar como não morrer caso aconteça do avião
cair ou seja: ter fé
e calma, não deu
pra ser
nada
além de uma secretária mediana, também não fui mãe.
A Bete foi, por
anos. depois a Vida.
Agora acho que a Joana era mãe (Joana - esposa do Lucas, que estava esperando um filho dele). E acho também que o Lucas não precisa mais de
mãe nenhuma,
nem eu do filho que
não matei.
Pensei por nove meses vou matar, mas
não matei."
E por fim, o Lucas perdoasse a sua mãe e pedisse ao mesmo tempo perdão ??
Trechos Preferidos ?????
Eu não gostava de basquete e tive que jogar pra não tirar
zero. me acostumei a ser a última escolhida pelos times porque eu não era boa e
achava justo. começaram também a me dizer:
? você
não é bonita.
E pra Ana diziam:
? você é
bonita.
Teve uma vez que eu fiquei no espelho
olhando a minha cara e a ana na pia do lado, olhando a dela.
Eram caras muito parecidas
dois olhos no mesmo lugar, cabelo na cabeça, dentes.
[A inocência dela quando criança ???]
.
Carta era um ótimo jeito de dizer que se
amava alguém porque às vezes falando a pessoa não entende nada ou escuta
pouco pensando em
outras coisas.
? escrever é mais forte.
[Pena que a carta escrita pelo remetente, que deveria tanto ser lida, não chegou nas mãos do destinatário - tanto a carta escrita para a amiga da protagonista, quanto a carta escrita para o seu filho]
.
Vou conversar com seu pai pra gente casar. Eu não tenho dinheiro como ele
gostaria mas tenho um peito
que dentro só cabe
teu nome
e medo nenhum quando penso em você.
Se tudo der errado te proponho uma fuga
e muito amor
pro resto da vida.
[Eu amei o velho Luís ???]
.
O que a Carla estaria fazendo se ainda estivesse viva?
Talvez
fosse uma atriz
com aquelas imitações maravilhosas que ela fazia de Borboleta, estaria na capa
de uma revista, provavelmente teríamos perdido o contato também.
"Tenho amigos que não morreram, mas é como se eles tivessem morrido, ninguém se fala apesar de ser possível."
Até com meus pais eu falo cada vez menos
e nada dói no meu corpo a ponto de chamar de
saudade,
com as pessoas vivas eu me sinto mais à vontade pra esquecer.
.
O que nasceu apenas como promessa de dar almoço pro menino,
acabou virando o dia todo com ele, que
cresceu
menos no meu
braço e mais no dela (Bete).
As despesas da casa, contas de telefone, de água e de
luz me davam oi antes do meu filho me dar.
.
O dia todo pela frente, a vida é tão longa com suas horas enormes,
no cemitério uma paz
de noite incurável,
aconteça o que que acontecer um morto está morto. Não há urgência que o faça
levantar ou ser triste
tampouco alegre, é o nada absoluto que
me soa como belo.
.
As pessoas
sabem meu nome, me chamam,
então eu existo ao mesmo tempo que sou
invisível na multidão.
.
Ser avó
me deixava com uma sensação ainda maior,
ainda pior
de que a morte
estava
cada vez mais
perto, pra todo mundo,
perto,
até para os recém-nascidos, ninguém está ficando mais novo.
.
O moleque não era nem nascido e já tinha gente pensando
na sua
profissão.
O trabalho é
por tantas vezes
a maior tristeza da vida de uma pessoa e é só nisso
que certos pais pensam, no filho
crescendo e sendo alguém sendo que esse ser alguém envolve tudo menos Ser.
.
Primeiro
morreu meu pai.
Os homens morrem
10 anos antes das mulheres eu li numa revista de ciência.
Dormindo
meu pai não acordou.
Minha mãe sim e logo que abriu o olho sentiu o gelo de defunto na cama,
chamou a ambulância,
chamou a mim, chamou deus mas meu pai não voltou.
No enterro as pessoas beijavam o rosto da minha mãe sentada
na cadeira ao lado
do caixão acumulando
pêsames.
Foram tantos que
4 meses depois, minha mãe morreu também, os médicos disseram que foi do coração e
foi mesmo
muita tristeza
ficar tão sozinha.
? casais juntos há muitos anos não conseguem seguir vivendo quando a morte os
separa, ? o padre disse
fazendo o sinal da cruz no caixão da minha mãe
que foi enterrada ao lado do meu pai e muitos santos no cemitério
cuidando de tudo.
De vez em quando eu vou até eles
e levo uma flor, mas sinto que estou indo no lugar errado
sinto que os mortos não estão ali e as pessoas insistem que sim.
Eu entendo,
todo mundo se sente confuso com essa história de parar de existir.
.
Sorriso eu não sabia mais em que lugar que ele ficava no corpo.
Não dei beijo
no Vento
antes dele morrer.
Dei depois mas depois não adianta. Também de manhã antes de ir pra feira
eu não
disse nada de
tchau, ele estava dormindo tão
doce
não quis acordar e o tempo
não volta.
.
O corpo dela foi encontrado por culpa dos vizinhos
que estavam reclamando do cheiro fortíssimo da casa 462,
a polícia foi verificar.
quando recebeu a notícia da morte no
escritório, o Chefe ficou visivelmente abalado
pensava que o sumiço dela
tinha a ver com
desistir
daquele trabalho antigo
pra quem sabe tentar ser aeromoça como uma vez ela tinha dito que
queria
da vida Nunca,
da vida não tinha passado pela cabeça dele, que chorou
compulsivamente, as pessoas no escritório acharam um
exagero.
"De resto
a cidade seguiu seu curso,
nem parecia
que alguém tinha morrido, até porque todos os dias alguém morre sem ninguém saber."
???