Lids 13/10/2017Minha Irmã Rosa - Justine LarbalestierEm uma releitura de um livro clássico, Justine entrega a obra-prima definitiva de sua carreira como escritora *-*-*
Desde seu primeiro livro lançado no Brasil (Magia ou Loucura), a autora vem flertando com a ideia do que é a insanidade, a realidade e a imaginação. Em Confesso Que Menti, nossa narradora nada confiável, sendo uma mentirosa compulsiva, nos oferece várias versões da realidade, de forma que no final ainda não sabemos se a última versão é a verdadeira ou se existe alguma coisa que é verdadeira na história.
Dando continuidade a todas as reflexões sobre realidade, mentira e psicologia, Justine aprofunda todos esses temas e discussões em Minha Irmã Rosa, obra que lhe rendeu indicação à maior premiação de romance policial, terror e suspense, o Edgar Awards *-*-*
Minha Irmã Rosa é um livro sobre um garoto que nasceu na Austrália e viveu 10 anos de sua vida nesse país, porém durante os últimos 5 ou 6 anos vem se mudando constantemente de continente até que seus pais decidem que seu próximo destino seria os Estados Unidos. O problema é que Che, nosso protagonista, passou a maior parte desse tempo vigiando e protegendo o mundo de sua irmã Rosa, que ele suspeita que tenha Transtorno de Personalidade Antissocial, vulgarmente chamado de psicopatia.
O livro reflete sobre todas as questões humanas a respeito da mentira, que é uma das características de um psicopata. Para uma pessoa ser considerada “psicopata”, ela deve se encaixar em não apenas um critério, mas uma lista de comportamentos descritos pelo DSM-V (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), e explorados brevemente no livro. Mas a reflexão do livro sobre mentira é interessante, porque traz a reflexão de como é difícil ensinar para uma criança porque é errado mentir quando é um comportamento tão comum na sociedade.
Obviamente, é que os comportamentos não podem ser vistos apenas na sua forma, também deve ser considerada a gravidade e a frequência da mentira. No entanto, imagina ter que explicar isso para uma criança de 10 anos que tem dificuldade de se colocar no lugar do outro (ou seja, não empática) e de abstração de conceitos (de entender sarcasmo).
A todo o momento, Che tenta ensinar sua irmã por meio de regras a como ser mais humana, como sentir mais como as outras pessoas, como ser “normal” e é fácil o leitor sentir como é um drama intenso, um dilema e uma responsabilidade muito grande em cima de um adolescente de 17 anos.
Toda a relação abusiva e tóxica que Che vive com Rosa, e com sua família, com pais que são também egoístas e que vivem em seu próprio mundo, frequentemente ausentes e negligentes às necessidades dos filhos. Che também está tentando se libertar do controle excessivo e regras sem sentido ditadas por esses pais ausentes e sem a mínima noção de quem são seus filhos.
O livro teve como principal objetivo recontar a história clássica de William March, “Menina Má”, de 1954, utilizando todas as pesquisas mais modernas sobre psicopatia. Esse esforço é facilmente percebível por todos os fatos sobre as estruturas cerebrais envolvidas no transtorno, sobre a influência do ambiente e da genética no comportamento, e sobre todos os critérios diagnósticos e sintomas explicados no livro.
Outro destaque positivo é o relacionamento de Che com seus amigos na Austrália, e sua nova amiga Sojourner. Na verdade, especialmente com a Sojourner, porque ela é super religiosa e tem essa regra de não namorar pessoas que não são da sua religião, enquanto Che, que tá super a fim dela, é ateu. Então tem várias discussões sobre acreditar ou não em Deus, sobre o que isso realmente poderia dizer sobre uma pessoa. Além de que esses dois têm uma cena inacreditável para um YA *-*-*
Enfim, tanto temas bons, tantas quebras de paradigma, tantas reflexões maravilhosas sobre a vida em sociedade, sobre certo e errado, sobre religião e, principalmente, sobre psicopatologia. É um livro extremamente bem embasado cientificamente. A Justine fez um trabalho de pesquisa incansável, leu vários artigos e livros científicos para escrever esse livro da forma mais fidedigna possível do que se sabe na ciência atual *-*-*
É interessante para todas as pessoas que se interessam pelo tema de psicopatia e para todas as pessoas que querem entender o que nos faz humanos, o que faz com que a gente se preocupe com as outras pessoas. É fascinante e contado de uma forma indescritível, assustadora ao mesmo tempo que encantadora *-*-*
Recomendo para quem gostou de Precisamos Falar Sobre Kevin (Lionel Shriver), Confesso Que Menti (Justine Larbalestier) e Menina Má (William March).
site:
https://cacadorasdespoiler.wordpress.com/2017/10/13/minha-irma-rosa-justine-larbalestier/