MarcosQz 10/04/2024
Em Carolina tudo tem cor
Carolina Maria de Jesus escreveu um diário real sobre a vida na favela. Conhecida como língua de fogo por dizer o que pensava, deu nome à todos que conhecia, nomes, atos e fatos.
Mãe de três filhos, catava reciclagem para se sustentar, era educada com os outros, respeitava as crianças e tentava manter sua calma interior, não queria problema. Odiava a favela e o povo da favela, um povo inculto.
Estudou até o segundo ano primário, mas sabia boas palavras, não escrevia de forma tão correta, o que fica claro no livro, mas era a forma real, era a realidade de sua história e se fazia entender. Carolina vai narrando seus dias num misto de sabedoria e inocência, agradece pelos brancos que se tornaram mais cultos e agora ajudam os pretos, mas não nega a culpa dos brancos, seu preconceito, sua ganância, suas mentiras. A escravatura atual é a fome. Amaldiçoa a favela e a fome.
Carolina escrevia e lia, acreditava que os livros eram a melhor invenção do mundo. Não estava errada. E sentia fome, a fome é uma constante em sua vida e na de seus filhos, e olha para as outras crianças e jovens pensando em como seriam diferentes se tivessem alimento e casa de verdade, mas ali, a favela é simplesmente o quarto de despejo para onde é jogada a gente que não serve, que não presta. "Eles não gostam da favela, mas precisam dela".
Tudo para ela tinha cor, a fome, o desespero, a dor, a pobreza. Sua pele e seu local de moradia possuíam a mesma cor.
Quarto de Despejo é um livro bem dolorido de ser, é uma história real do Brasil que existe ainda hoje. Ainda existem por ai centenas de quartos de despejo, centenas de Carolinas. O Brasil não mudou quase nada e os diários de Carolina deixam isso claro.
Mas Carolina era uma mulher sábia e decidida, Carolina era uma mulher que acima de tudo acreditava nela mesma.
Para entender Carolina é preciso ler Carolina.