Ana 05/08/2023Que tipo de rio você é?Tradução de Ilza das Neves e Heloísa Penteado
Minha história com Ressurreição começa com Anna Kariênina. Na hora de escolher minha primeira edição de Anna, o critério de desempate foi o preço. O box desta editora com três obras era mais barato do que a versão de Anna da concorrência. Assim comprei ele por tabela.
Acompanhando a história de Nekhludov, bem no início, eu tinha certeza que amaria o enredo (Tolstói escreve lindamente), mas odiaria o protagonista. A Maslova, vítima, interesse romântico, vilã e coprotagonista, me despertou compaixão. Ele é uma figura do privilégio, da elite decaída da Rússia da época. Ela é a imagem do povo que sofre para a manutenção dos privilégios dos mais abastados.
Aí entra o fator Tolstói da história. Mais do que um retrato da sociedade, temos uma jornada profunda pela consciência dos personagens. É possível reparar um erro que destruiu a vida do outro? Dentro de uma prisão precária, onde o alcoolismo é o único remédio quando a epidemia de tuberculose é o menor dos males, existe fé?
A ressurreição dos personagens me levou para um caminho muito surpreendente. Não é meu livro favorito, mas é uma obra indispensável. Especialmente para pessoas de fé. Aqui encontramos a religião como ferramenta de manutenção de poder, ganho de lucros e justificação de crimes contra o próximo. Porém, há contornos de uma fé genuína que promove transformação.
Outra vez dizendo, o retrato da Rússia de Tolstói me lembra demais o Brasil de hoje. Talvez porque “os homens são como rios, feitos todos com a mesma água; uns, porém, são largos, outros, estreitos; corre um lentamente, outro, deságua com rapidez — este tem água tépida e cristalina, aquele, toldada e fria.”
Que tipo de rio você é?
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