Mônica Alves 18/03/2020
Simplesmente não convence
O livro conta a história de Jazz, uma jornalista com certa experiência que escreve sobre teorias da conspiração. Ela precisa de um tema para um artigo e seu amigo Saulo, que é um padre, sugere que escreva sobre a Terra plana.
Claro que ele não larga o tema de primeira. Ele a convida para conversar, mostra um mapa azimutal e daí a Jazz SURTA, sem mais nem menos. Fica sem ar, xinga o coitado do padre, grita, bate na mesa e tudo mais. Ela é uma jornalista que investiga teorias conspiratórias diversas, desde Illuminati até extraterrestres e vacinas com chips, mas ela NUNCA ouviu falar em Terra plana, um assunto em voga. Além disso, NUNCA olhou a logo da ONU, que é um mapa azimutal, nem teve aula de geografia - eu pelo menos estudei diversos modelos de mapas na escola, inclusive azimutal, e sim, era escola pública. Sem falar que, se ela estava acostumada a esse tipo de pesquisa, ela deveria estar mais acostumada a esse tipo de coisa e não ficar completamente abalada de primeira, né? Já começa sem convencer.
Ok, ignorei isso e segui lendo. Achei que seria uma ficção com início, meio e fim, e adoro uma ficção que trabalha com ciência e religião ao mesmo tempo. Bom, até a metade do livro é sempre um diálogo entre ela e o padre, que sempre resulta na Jazz voltando para casa surtadíssima e procurando informações em sites muito confiáveis - vídeos aleatórios do YouTube, como ela mesma afirma. Poderia ser legal, mas o diálogo poderia muito mais ser um monólogo, porque a Jazz só serve para fazer o padre falar. Ela não tem muito a acrescentar a história, ela só questiona, daí o padre dá uma explicação muitas vezes capenga e ela se convence. Se o livro narrasse uma palestra dada pelo padre e pessoas aleatórias da plateia questionassem acho que daria na mesma. A impressão que dá é que é um livro para ensinar a teoria da Terra plana para adolescentes através de uma personagem com a qual eles podem se identificar (Jazz), e não um livro de ficção e aventura (como está classificado na Amazon).
Depois disso aparecem mais alguns personagens e um romance acontece. Até que foi bonitinho, mas o par dela também não é muito convincente como personagem. O final é legal, teve todo aquele clima de suspense, tanto que eu gostaria que tivesse mais disso no decorrer do livro.
Pontos positivos: a leitura é rápida e bem-humorada. Se você, como eu, quer entender como os terraplanistas pensam sem se demorar muito, o livro pode ser bom. Várias coisas eu desconhecia, e em alguns momentos pesquisei as respostas para alguns dos questionamentos do padre e aprendi um pouco mais sobre física. Algumas coisas realmente são estranhas e poderiam ser mais exploradas no livro, porque realmente parece conspiração. Outras são muito forçadas, tipo "se a lua cheia aparece ao mesmo tempo no Brasil e no Japão, CERTAMENTE a Terra é plana!", quando no meu entendimento isso só seria possível na Terra redonda, ou geóide - inclusive, ser geóide também foi um ponto levantado contra um personagem que não acreditava em Terra plana, não entendi por quê. Só para confirmar, pesquisei e vi que não era só achismo meu, não tem nada de inesperado na lua cheia aparecer ao mesmo tempo no Japão e no Brasil.
Então, em resumo, não convence. Não recomendaria para ninguém salvo quem está curioso sobre a teoria terraplanista. Eu tentei ler sem me ater muito a realidade, mas mesmo assim não convenceu.