Jorge 27/09/2009
Traição
"Must we not ourselves become gods?’
Nietzsche
Na Divina Comédia, Dante puniu com grande rigor os traidores, enterrados num lago congelado no último círculo do inferno. Contudo, apenas três deles tiveram a punição mais severa de todas: a duvidosa honra de ser mastigados eternamente pelo próprio Lúcifer. São eles Judas, Brutus e Cassius - os dois últimos em razão do seu envolvimento no assassinato de Júlio César. O General Ítalo Tarnapo, protagonista de "Dante: o Guardião da Morte", certamente aprovaria a punição sugerida pelo poeta, pois ele próprio abomina a traição e, em especial, os traidores de César e do Império.
De fato, a lealdade talvez seja a principal virtude desse general romano – lealdade não só aos seus princípios e crenças mas também àqueles que lhe são próximos. Ítalo jamais trairia César, seu líder, ou Isabel, sua amante, ou Licínio, seu pupilo. Talvez por isso tenha tido tanta dificuldade em perceber a teia de artimanhas que ia sendo lentamente tecida em torno dele. O leitor percebe a ameaça desde o início, mas não consegue entender claramente seus limites, nem identificar, em definitivo, os conspiradores. O mesmo acontece com Ítalo. Há apenas suspeitas e a certeza de que o futuro do Império e a vida do general estão em risco.
Pensei que ao ler "Dante: O Guardião da Morte" encontraria um típico livro sobre vampiros. Não foi esse o caso. O autor foge do lugar-comum e vai apresentando uma história onde o sobrenatural é menos importante do que o humano, onde personalidades complexas interagem, na busca de objetivos obscuros. Mortalidade e imortalidade combinam-se com perfeição na história desenvolvida por Eric Novello. E quando Ítalo torna-se quase um deus e adota o nome de Dante, despejando toda sua fúria contra os traidores do Império, não pude evitar de pensar que sua nova alcunha era até mais adequada que a antiga. Os deuses nunca foram tão humanos.