Livros da Julie 03/11/2019As grandes jornadas da vida e as intermináveis buscas do coração.-----
"O destino, seja o que for, habita as montanhas lá em cima."
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"Mas, a essa altura, eu definitivamente já havia aprendido a fazer as perguntas dos adultos, aquelas que indagamos uma coisa para saber outra."
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"Em minha mãe, no entanto, eu via os frutos de uma longa vida dedicada às relações, cuidando delas como se fossem as flores de sua sacada. Eu me perguntava se era possível aprender um talento como aquele ou se alguém nascia assim e pronto. Se eu ainda tinha tempo de aprender."
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"Começava a entender o que acontece quando alguém vai embora: os outros continuam a viver sem ele."
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"(...) sentia remorso por não ter estado ali. Parecia que eu havia perdido as coisas mais importantes enquanto me mantinha ocupado com outras tão fúteis que nem lembrava o que eram."
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"Não lembrava bem por que tinha me afastado da montanha, nem o que amara nela quando já não a amava mais; mas ao subi-la todas as manhãs sozinho era como se lentamente fizéssemos as pazes."
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"E como resolveríamos o problema da família, sabotadora de qualquer comunidade, inimiga pior que a propriedade e o poder?"
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"(...) pensei que todas as montanhas, de algum modo, se parecem, embora não houvesse nada ali que me trouxesse alguma lembrança minha ou de alguém que eu gostasse, e aí estava a diferença. O modo como um lugar guardava sua história. Como você conseguia revê-la toda vez que voltava. Só podia existir uma montanha assim na vida, e, comparadas àquela, todas as outras não passavam de cumes menores, até quando se tratava do Himalaia."
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"A gente deve fazer o que a vida nos ensinou a fazer. Quando se é muito jovem, talvez seja possível decidir mudar de caminho. Mas, a certa altura, a gente tem que parar e dizer: bem, sou capaz de fazer isso, isto não."
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Acostumados com a vida nas montanhas, os pais de Pietro saem de Milão sempre que podem e escapam para algum vilarejo próximo, determinados a sentirem novamente o ar puro do campo e terem o prazer de desbravar novas encostas e alcançar picos cada vez maiores.
Assim, ainda criança, Pietro é apresentado ao vasto e solitário mundo montanhês, quando seus pais se decidem por ter um refúgio fixo e alugam uma casa em Grana, norte da Itália, para passar as férias de verão. Lá, ele conhece Bruno, com quem logo trava uma amizade marcada pela exploração dos arredores e por aventuras nas ruínas que permeiam toda a região do Monte Rosa.
A vida na montanha, o convívio com Bruno e a complexa personalidade do seu pai deixam fortes impressões em Pietro durante sua infância. Sua vida adulta se torna uma jornada de compreensão das atitudes e sentimentos do pai e de retomada da antiga amizade, além de uma eterna busca pela possibilidade de reviver a felicidade simples daqueles verões no Monte Rosa.
A história acontece nas montanhas e na mente do protagonista. Há pouquíssimos diálogos, o que só reforça a importância do silêncio em sua vida. O essencial ficava nas entrelinhas, no que não era dito, seja por falta de coragem ou de timing.
As Oito Montanhas fala de possibilidades que não se concretizam, de remorsos infundados e da visão da infância, incompleta, parcial e enviesada permeando todas as decisões, os relacionamentos e as vivências no futuro.
O livro é sobre a passagem inexorável do tempo, sobre o amor familiar e o desgaste desse amor. Quando finalmente nos damos conta do que de fato importa, do que sempre foi a verdade, não há mais tempo para reparar os danos ou corrigir os erros.
A descrição das montanhas carrega uma perfeição que nos faz querer ter de imediato a sensação de estar lá, de experimentar os mesmos passos dados por Pietro, seu pai, sua mãe e Bruno. Mas também carrega a melancolia e o júbilo, a aridez e o entusiasmo, a culpa e o afago que as personagens carregam ao longo dos dias e dos anos, como uma mochila pesada às costas, da qual, por simples costume ou sem saber que era possível viver sem o fardo, não souberam se livrar.
É um livro extremamente belo e triste, mas acalenta o coração saber que a tristeza pode ser encontrada em qualquer lugar, seja aqui ou em montanhas de mais de 2 mil metros, sob um céu estrelado.
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