spoiler visualizarDanielCisneiros 24/11/2022
Frustração
Achei a leitura bem frustrante.
1. A narrativa é bem superficial e traz vários clichês equivocados sobre as transgeneridades. Já na capa lemos "como é ser um menino preso em um corpo de menina?", pergunta que traz como pressuposto a ideia de que existem corpos "de menino" e "de menina", reforçando o binarismo de gênero e a cisgeneridade compulsória.
2. A subjetividade de Justin é resumida a sua transexualidade. Nesse sentido, o personagem é reduzido à sua diferença (em relação à cisgeneridade). Se, por um lado, isso aproxima a HQ de um conto (vide seu tamanho diminuto - li tem 15 minutos), por outro lado, frustra quem espera personagens mais complexos e nuançados, especialmente personagens trans.
3. Particularmente, o traço do quadrinho não me atraiu nem um pouco. Mas não sou nenhum entendedor de HQs e, por isso, posso estar sendo muito injusto. De qualquer modo, os quadros basicamente se resumem a ilustrar a história, e mesmo quando a autora ousa contar algo pelas próprias imagens (vide os quadros nos quais Justin se "afoga" em seu choque), rapidamente ela insere explicações desnecessárias que empobrecem a HQ ("fiquei vários dias afogada na maior depressão"), como se as imagens não fossem suficientes, e fosse necessário palavras para explicá-las. Ou seja, parece que a autora não confia no poder das próprias imagens, e as usa como meras ilustrações dos textos.
4. As páginas não são numeradas, o que me dá muita agonia, kkk.
Apesar de todos os pesares, acho super importantes termos cada vez mais narrativas (boas ou não tão boas) discutindo e popularizando a questão das transgeneridades (especialmente a transmasculinidade), e acho que essa HQ pode ser uma boa porta de entrada para a temática, sensibilizando sobre o tema e abrindo caminho para obras mais complexas. Se trabalhado em sala de aula, a obra deve necessariamente ser problematizada, especialmente por impor às pessoas trans a necessidade de seguir padrões de corporeidade cissexuais.