Queria Estar Lendo 07/06/2018
Resenha: Queria que você me visse
Queria que você me visse, lançado esse ano pela Editora Seguinte - que nos cedeu um exemplar para a resenha - é um romance jovem adulto de Emery Lord que fala sobre luto, tristeza e doenças mentais.
A pequena cidade praieira de Verona Cove torna-se rapidamente o lugar preferido de Vivi, uma garota excêntrica, artística e recém-chegada. Extrovertida, Vivi rapidamente toca a vida de muita gente pela cidade, em especial de Jonah Daniels - o garoto que acabou de perder o pai e precisa lidar com o luto interminável da mãe e a grande família.
Porém, Vivi guarda um segredo sobre os fantasmas dos quais está fugindo, agora que está passando o verão em Verona Cove. Enquanto Vivi muda a vida de Jonah, ela lentamente espirala para dentro da sua própria doença mental, o que pode colocar os dois em perigo.
Não tem muito para falar sobre o livro porque não tem muitos acontecimentos. É um romance que se desenvolve com cenas excêntricas, devido a Vivi, e nos instiga a nos importarmos com os personagens e permanecermos na leitura para desvendar seus mistérios e descobrir o que o futuro aguarda. Ambientado em uma pequena cidade praieira que poderia ser em qualquer lugar no mundo, o livro passa uma sensação de proximidade entre os personagens e o leitor.
"Mesmo as constelações podem nos ver agora: temos dezessete anos e estamos partido e ainda estamos dançando. Nós temos corações atrapalhados e palpitantes, e somos mais fortes do que qualquer um pode imaginar."
Mas isso não quer dizer, necessariamente, que a gente se identifique ou goste deles.
A Vivi tem dois traços muito marcantes das famigeradas manic pixie dream girl: ela é excêntrica e chega como um furacão na vida do Jonah, mudando tudo como se fosse tão simples. Porém, como acompanhamos seu ponto de vista também, nos aprofundamos em seus problemas e na sua vida. Como o problema que ela deixou em Seattle quando partiu com a mãe, uma pintora, para passar o verão em Verona Cove, e o motivo pelo qual ela sempre joga um de seus remédios no mar.
Eu honestamente achei que gostaria muito da Vivi, o que até aconteceu no começo do livro. Adoro personagens excêntricos, adoro a visão de mundo, e a dela tinha alguns traços muito interessantes, especialmente sua paixão por moda e como ela vê isso como arte - pude me identificar bastante com diversos traços no inicio.
Mas não foi exatamente assim por todo o livro. Eu sempre repito que passado trágico não é desculpa para romance abusivo, então preciso dizer que doenças mentais não são desculpas para ser um babaca. E foi basicamente o que eu achei a Vivi da metade do livro em diante. Eu compreendo que durante um surto ela não tem controle de suas ações, porém o comportamento dela já foi terrível muito antes, como a forma como ela trata Elle, uma garota que sempre foi gentil e simpática com ela, só porque sente que um dia Jonah pode se apaixonar com ela.
"Ninguém nunca diz isso sobre as histórias de amor: só porque acaba, não significa que deu errado. Uma torta de cereja não deu errado só porque você comeu tudo. Foi perfeita enquanto durou. E revelar seu verdadeiro eu para outra pessoa, aquilo que você realmente é, e receber o mesmo de volta, é uma bela fatia de vida. Algo que vai me acompanhar por todos os meus "um dia"."
Ou como ela odeia que a mãe não confie nela, porque é uma alma antiga, já viveu muita coisa e sabe se cuidar - exceto que ela claramente não sabe e está mentindo para a mãe, dando todo o direito no mundo para gerar uma desconfiança. Vivi parece ter sido escrita de uma forma que nos faça "perdoar" essas atitudes, mas eu não consegui passar por cima.
Jonah também não foi muito melhor. É fácil entender a dor dele, o luto da família toda. Mas eu não consigo respeitar esses personagens "cara bonzinho que tem o mundo abalado pela manic pixie dream girl". Sem contar que depois da cena da fogueira entre ele e a Vivi, ele morreu pra mim. O ponto positivo do Jonah é a forma como o relacionamento dele com os irmãos é retratado, soou bastante real e foi uma dinâmica bem bacana.
E não quero que me levem a mal, Queria que Você Me Visse é um livro muito bem feito. Ele é construído de uma forma muito concisa e coerente, os personagens são desenvolvidos muito bem, também. A forma como Emery Lord montou suas personalidades, a forma como eles reagem aos acontecimentos da sua vida, são muito bons.
Eu não tenho nem motivo técnico para não gostar do livro. Eu só não gostei dos personagens. Eu fui instigada a ler o livro todo, não tive vontade de desistir, mas me peguei rolando os olhos muitas vezes para os protagonistas. Não gostei de Vivi e nem de Jonah, não queria ser amiga deles se eles existissem, e não estou interessada em saber mais nada sobre eles. E por isso eu tirei 1,5 da nota final.
"Nós sabemos que tem três pequenas palavras marcadas no meu coração: Jonah Esteve Aqui."
Embora eu tenha ficado com a impressão de que Emery tenha tentado justificar algumas atitudes escrotas da Vivi com a doença mental dela, a forma como ela aborda o transtorno da personagem foi bastante realista. A forma como ela vai decaindo gradativamente. Como esse transtorno é parte de quem é a Vivi, mas não defini ela por completo. Como não adianta você pensar "como seriam as coisas se isso nunca tivesse acontecido?", porque honestamente, isso nunca vai ser uma realidade.
No que toca essa parte da discussão, a Emery Lord mostrou que o transtorno de Vivi é uma pequena parte do que faz ela ser quem é, assim como todas as experiências que vivemos são pequenas partes do que nos transforma em quem somos. É normal de pessoas como ela - e que "normal" é algo que nunca é igual para todo mundo.
Além disso, ela também fala de depressão, tristeza e luto, e as diferenças entre essas situações. Embora eu não concorde exatamente com tudo que ela disse, e a forma como ela disse, ainda é importante abordar o tema. Uma tristeza profunda não é, necessariamente, uma depressão, não existe medida para um tempo "cabível" de luto.
"Ela me redescobriu entre todos os destroços, e isso significa que eu sempre vou ser um pouco dela."
Também gostaria de abrir um parenteses para falar da edição brasileira, cuja capa e título estão bastante diferentes da original. Geralmente eu prefiro quando a tradução mantém a capa e o título o mais perto do original possível, mas a Seguinte fez um trabalho muito lindo e delicado tanto com o título quanto com a capa, que traz elementos importantes para a narrativa. E o título se explica dentro do livro (assim como o original) em uma passagem muito bonita. Então deixo aqui o meu "muito bem!" para a editora, que soube identificar traços especiais na história para fazer uma tradução única.
O saldo final é que Queria que Você Me Visse é um bom livro, ele é bem escrito e aborda temas importantes para serem discutidos. E embora eu não tenha gostado dos personagens, outras pessoas podem (e muitas eu sei que o fizeram) gostar deles. Então é realmente o caso de ler e tirar suas próprias conclusões.
site: http://www.queriaestarlendo.com.br/2018/06/resenha-queria-que-voce-me-visse.html